Michelle Bolsonaro ataca, de novo, cota para mulheres na política

A ex-primeira dama Michelle Bolsonaro atacou, mais uma vez, a política de cota para mulheres na política. Ela fez a declaração   neste sábado (13) durante evento do PL Mulher, do qual é presidenta, em Macapá (AP). Em seu discurso, disse que as vagas femininas devem ser “conquistadas” a partir do mérito do protagonismo.

“Não queremos mulheres por cotas, mas por protagonismo. Queremos mulheres que tenham propósito e uma causa para lutar”, declarou.

Em maio de 2023, Michelle fez uma afirmação semelhante. Naquela ocasião, durante um evento do PL Mulher na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), ela afirmou que queria “erradicar a cota dos 30%” para mulheres na política.

Mas ao perceber o tamanho do estrago, ela gravou um vídeo “retificando” sua declaração e se dizendo a favor da regra que visa aumentar a participação feminina na política.

“Retificando: eu sou a favor da cota, sim! Nós queremos mulheres na política pelo seu potencial, pelo seu protagonismo. Nós não queremos apenas cumprir uma cota de 30%, nós acreditamos no potencial de cada mulher que entra na política brasileira”, disse Michelle, no vídeo divulgado à época.

 

Cotas femininas na política

O sistema de cotas para mulheres na política foi adotado em 1995 para eleições municipais no Brasil. A Lei 9.100/1995 regulamentou que para cargo de vereador, ao menos 20% das candidaturas deveriam ser preenchidas por mulheres.

Em 1997, a Lei 9504 indicou a reserva de 30% das vagas para candidatas femininas nas eleições gerais.

Esse tipo de declaração da ex-primeira dama é um enorme desserviço para a luta por equidade de gênero na política e soma-se a ataques à busca por representatividade feminina na política, como a da Proposta Emenda à Constituição (PEC 9/2023) que está parada na Câmara aguardando a criação de uma comissão especial.

O texto quer livrar os partidos de punição por qualquer irregularidade nas prestações de contas referentes ao uso dos fundos partidário e eleitoral até a promulgação do texto – inclusive pelo descumprimento da distribuição da cota mínima de recursos para candidaturas de negros e mulheres nas eleições de 2022 para trás.

 

Como funciona em outros países

Esse modelo discutido no Congresso brasileiro não é comum em outros países. De acordo com dados do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional), que reúne informações sobre 131 países, grande parte dos parlamentos correspondentes à Câmara dos Deputados promove cotas para candidaturas femininas, formato atualmente em vigor no Brasil, ao invés de reservar vagas para mulheres.

O IDEA Internacional diz que apenas 28 países adotam um número mínimo de cadeiras reservadas para mulheres, enquanto 69 países fixam cotas femininas nas listas de candidatos. Outras 31 nações não contam com cotas.

O percentual de cadeiras reservadas a mulheres pode ficar abaixo da representação atual da Câmara, que é de 18% com 91 deputadas entre os 513 parlamentares, e da proporção de vereadoras eleitas em 2020, que foi de 16%. Alguns defendem que se a mudança for aprovada, terá um efeito em cascata ao longo dos anos.

De acordo com uma nota técnica da Fórum Fluminense Mais Mulheres na Política, que reúne instituições voltadas para o debate de gênero no estado do Rio, a reserva de 15% teria impacto tímido nas três esferas – federal, estadual e municipal – e poderia até gerar redução de quadros, se fosse aplicada nas eleições de 2018 e 2020.

 

Mais de um século de luta

A conquista do voto feminino, primeiro passo para a presença de mulheres na política no Brasil, foi concretizada em 24 de fevereiro de 1932. Foi resultado de um longo processo de resistência que tem como expoentes grandes nomes do movimento sufragista como Nísia Floresta e Bertha Lutz.

Esse direito fundamental demorou muito para ser conquistado e com esse tempo, muitas mulheres precisaram lutar até que ele se tornasse realidade. Essa luta remonta à  época do Império, quando já havia mulheres reivindicando o direito de votar e participar do jogo eleitoral. Eram vozes isoladas no pedido por direitos que quase não foram ouvidas e levadas a sério.

Na Primeira República, a luta pelo sufrágio feminino enfrentava um grande obstáculo: a legitimidade constitucional do pedido. As mulheres, imbuídas de esperança e determinação, já buscavam seus direitos através da letra da lei, contestando interpretações restritivas e reivindicando reconhecimento, já que a exclusão era naturalizada pelos constituintes.

A partir da primeira década de 1900 nasce o movimento sufragista no Brasil e as vozes de luta pelo voto feminino passaram a ressoar com mais força e começaram a incomodar os que estavam no poder exigindo seus direitos.

Em pleno século XXI, o caminho para as mulheres participarem da política segue sendo desafiador. Apesar dos avanços, vozes femininas como a de Michelle Bolsonaro ecoam contra o próprio gênero.

O cenário político no Brasil segue tentando impedir a presença feminina. Nesses ambientes predominantemente masculinos, seguimos sendo vistas como invasoras e recebendo tratamento diferente do dado aos homens. Mas na hora de votar, somos mais de metade do contingente eleitoral. (Foto: Flickr PL)

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