Nova presidenta da UNE pressiona por leis de maior acesso e permanência nas universidades

Manuella Mirella defende foco na reconstrução nacional e na redução das desigualdades com mais oportunidades para que o jovem pobre possa entrar e se manter no ensino superior

 

Thiago Vilarins – Recém-eleita presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE) no último mês de julho, com uma das votações mais expressivas da história da entidade, com mais de 74% dos votos, a pernambucana de Olinda Manuella Mirella, 26, tem como prioridade aprofundar políticas que possam garantir o acesso e a permanência dos estudantes mais pobres na universidade. Para tanto, ela tem sido presença constante no Congresso Nacional, no intuito de fazer pressão pela aprovação de uma lei nacional de assistência estudantil e do projeto de lei 5384/20, que atualiza e torna permanente política de reserva de vagas para estudantes egressos de escolas públicas nos vestibulares de universidades e institutos federais.

“A gente tem que garantir o acesso e a permanência estudantil. Então, precisamos renovar a lei de cotas e aprovar a lei de nacional de assistência estudantil. E pressionar também para que a universidade esteja no centro do debate do que existe no mundo hoje. Então, o nosso projeto é garantir que o estudante entre e permaneça na universidade e que ele consiga fazer com que o nosso país chegue no patamar de referencia científica, tecnológica e energética, que é isso que o Brasil precisa: de jovens debatendo e reconstruindo esse país”, disse Manuella ao Opinião em Pauta.

Manuella estuda atualmente Engenharia Ambiental na FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas Educacionais), em São Paulo, área na qual quer se especializar no futuro. No entanto, ela já é formada em Química pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), na qual teve ingresso por meio de cotas. “Quando eu falo como as cotas e a assistência estudantil mudam vidas, é porque elas mudaram a minha”. No centro de ensino, ela teve acesso a uma bolsa de assistência estudantil e conseguiu alojamento na Casa do Estudante.  “Ninguém estuda com fome. Ninguém vai para a universidade a pé. Quando entrei na graduação eu pegava três ônibus para ir e três para voltar. Dentro da assistência a gente quer passe livre, alimentação no restaurante universitário e que o estudante tenha condições de permanecer, concluir e dar um retorno a sociedade.”

A reunião recorde de correntes estudantis em torno do nome de Manuella Mirella seguiu o mesmo modelo da campanha presidencial que elegeu Luís Inácio Lula da Silva para um terceiro mandato: união de forças para a reconstrução nacional e redução das desigualdades. “Nos últimos anos a gente passou por um governo que não ouviu os estudantes. Muito pelo contrário, colocou as universidades como seu principal inimigo. O que acontece, agora, é que, mesmo depois da eleição, essa galera insiste em atacar a democracia. Então, essa união da UNE dá essa resposta: ‘olha, aqui do nosso lado, a gente defende a democracia, um projeto político de país que tem a democracia como base, para varrer a extrema-direita do Brasil e os bolsonaristas, aqueles que não respeitam a democracia’. Então, eu acredito que tudo se fechou nesse formato em defesa desse projeto de país que coloca a democracia e a educação como centro e a reconstrução do Brasil”, disse.

Em entrevista exclusiva à reportagem do Opinião em Pauta, além de destacar as metas e desafios desta sua gestão e de como deverá ser a relação do movimento estudantil com o governo federal, ela também analisou o processo eleitoral que culminou com a sua vitória e ainda rebateu as críticas dos grupos opositores. Manuella também reforçou como será a mobilização nacional da próxima sexta-feira (11), Dia do Estudante, sob o lema “Estudante na rua para reconstrução da educação”, em que a UNE se juntará a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES) e a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) para reivindicar pautas atuais como o corte de verbas para a Educação no valor de R$ 333 milhões e pela revogação do Novo Ensino Médio, cuja proposta do governo foi apresentada na última segunda-feira (7).

“Se antes nós nem éramos recebidos pelo governo ou éramos recebidos com bomba, com piadinha e com deboche… hoje nós somos recebidos, sentamos numa mesa, mas colocamos a nossa opinião. Isso aqui é a diferença, a democracia é isso. E nós, com um movimento estudantil, na sua historia, ocuparemos as ruas do Brasil para colocar a nossa opinião e pressionar o governo para que a gente consiga aprovar e garantir nossos direitos”, concluiu.

 

Manuella Mirella comemora a vitória no Congresso da UNE (Conune) no último dia 16 de julho. Nova presidenta foi eleita com 74,27% dos votos. (Foto: @uiseepitacio)

 

Confira a entrevista realizada na noite de quarta-feira (9) no salão verde da Câmara dos Deputados:

 

Na sua avaliação, ao que se deve essa vitória tão representativa como nova presidente da UNE, com mais de 76% dos votos válidos?

Acho que a UNE consegue dá respostas à conjuntura que o Brasil vive. Os estudantes brasileiros entenderam que só a partir da unidade, agora, nós iremos poder reconstruir esse país. Então, acredito que o congresso da UNE foi um pouco disso, esse extrato dos estudantes de colocarem no centro do debate o que nos une, que é defesa do orçamento da universidade, que é a defesa da assistência estudantil, do emprego, da juventude poder sonhar em estar na universidade. Então, foi esse projeto político que nos move, de construir um Brasil melhor. Eu acredito que as chapas foram voltadas em cima desses projetos e, a nossa, tinha essa qualidade, esse objetivo fundamental. Inclusive, com a nossa campanha: ‘Estudantes na rua e unidade para reconstruir o Brasil da esperança’.

 

Quando você fala em união de forças para reconstruir o país, você repete o lema da campanha que elegeu o presidente Lula. Assim como na eleição presidencial, a sua chapa também recebeu uma adesão jamais vista em outros pleitos eleitorais. Esse momento de transição no governo federal ajuda a justificar essa união dos movimentos estudantis em torno do seu nome?

Sim, inclusive, nos últimos anos a gente passou por um governo que não ouviu os estudantes. Muito pelo contrário, colocou as universidades, os estudantes, o movimento estudantil como seu principal inimigo. A extrema-direita, os bolsonaristas sempre nos atacando. O que acontece, agora é que, mesmo depois da eleição, essa galera insiste em atacar a democracia. Então, essa união, a UNE dá essa resposta e fala: ‘olha, aqui do nosso lado, a gente defende a democracia, aqui a gente defende um projeto político de país que tem a democracia como base, para varrer a extrema-direita do Brasil e os bolsonaristas, aqueles que não respeitam a democracia’. Então, eu acredito que tudo se fechou nesse formato em defesa desse projeto de país que coloca a democracia e a educação como centro e a reconstrução do Brasil.

 

As legendas partidárias de esquerda, que hoje estão à frente do governo federal, tem grande influência dentro das correntes que compõem a executiva da UNE. Inclusive, durante o congresso que definiu a sua eleição teve ampla participação de ministros do governo federal, inclusive, do ministro da Educação, Camilo Santana, e do próprio presidente Lula. Como será a cobrança ao governo federal com essas alianças partidárias e proximidade tão grande com o poder executivo?

Primeiro, que a UNE é comandada pelos estudantes e para os estudantes. Claro, que a organização é de um coletivo de partidos e de estudantes, ela existe. Nós não somos o pessoal que criminaliza a organização desses estudantes. Mas, nós entendemos que a UNE é independente. O que nós defendemos é um projeto de país que coloca a educação como centro, que dê oportunidade do pobre entrar na universidade, que seja esse quadro técnico que vai dar opinião sobre espaços estratégicos do nosso País. Então, acreditamos que a UNE consegue, na base, passar e apresentar um projeto de universidade, porque nós vivemos a universidade diariamente e temos o Congresso Nacional, com os seus partidos, onde a gente apresenta as nossas propostas. Inclusive, a gente tem um propósito para o próximo período, que é aprovar uma Lei Nacional de Assistência Estudantil e aprovar a renovação da Lei de Cotas, o aperfeiçoamento dessa lei de cotas. Tudo isso a gente apresenta para o Congresso Nacional e a gente faz pressão e é votado. Então, existe isso. A nossa cobrança é em defesa do direito dos estudantes. A gente vai garantir isso.

 

Você já começou a adiantar as propostas, mas gostaria que você detalhasse as prioridades da sua gestão?

Primeiro, a nossa prioridade é fazer um diagnóstico da universidade. Muitos jovens largaram o ensino superior porque não têm condições de se manter. Então, o nosso diagnóstico é: ‘como é que combate a evasão?’ Então, a gente tem que garantir a permanência estudantil e o acesso. Então, renovar a lei de cotas e garantir a permanência, com a aprovação da lei de nacional de assistência estudantil.  Quando eu falo como as cotas e a assistência estudantil mudam vidas, é porque elas mudaram a minha. Eu sou um exemplo. E também colocar a universidade no centro do debate do que existe no mundo hoje, que é debater, por exemplo, a política climática, debater o aquecimento global, efeito estufa… E onde é que a gente vai desenvolver tecnologia para combater isso? E onde é que a gente vai desenvolver ciência no nosso país? Onde é que a gente vai debater economia sustentável, desenvolvimento sustentável, hidrogênio verde, descarbonização? Na universidade! Então, o nosso projeto é garantir o estudante entre e permaneça na universidade e que ele consiga fazer com que o nosso país chegue no patamar de referencia científica, tecnológica e energética, que é isso que o Brasil precisa: de jovens debatendo e construindo esse país que a gente defende.

 

É uma nova gestão, mas você recebeu a presidência de uma colega, a Bruna Brelaz, da mesma corrente que a sua, a União da Juventude Socialista (UJS). Inclusive, como vocês duas ressaltam, foi a primeira vez, na história da UNE, que uma mulher negra passou a presidência para outra. Mas grupos opositores de vocês, que estavam na secretaria geral da última  gestão, acusaram a executiva da Une de falta de transparência e de isolar quem não aliado das reuniões decisórias. Como você avalia essas críticas e existe alguma intenção de unir forças também com este grupo?

Isso mostra o quanto a UNE é plural e democrática. A UNE tem na sua base pessoas de diversas opiniões. Mas o que nós defendemos é a democracia, e democracia se faz com maioria. Nós nos debruçamos sobre pautas importantíssimas. Todos juntos. Nós debatemos sobre como nós iremos nos posicionar em relação a qualquer situação. Uma coisa é certa: ‘o nosso compromisso é com os estudantes brasileiros, com a educação, com a universidade’. O nosso compromisso é esse e é o que a UNE está fazendo. Então,  a UNE não é de grupo A ou de grupo B, é dos estudantes. Por isso, por exemplo, que nós iremos às ruas no dia 11 em defesa do Orçamento da Educação contra os cortes de R$ 333 milhões que houve agora na educação e pela revogação do novo ensino médio. Porque, olha só, se antes nós nem éramos recebidos pelo governo ou éramos recebidos com bomba, com piadinha e deboche… hoje, nós somos recebidos, sentamos numa mesa, mas colocamos a nossa opinião. Isso aqui é a diferença, a democracia é isso. E nós, com um movimento estudantil, na sua historia, ocuparemos as ruas do Brasil para colocar a nossa opinião e pressionar o governo para que a gente consiga aprovar e garantir nossos direitos.

 

O movimento estudantil vai às ruas nesta sexta-feira reivindicar, mais uma vez, a revogação do Novo Ensino Médio. Justamente, no inicio desta semana que o MEC apresentou as propostas de mudança. O que você achou do projeto do governo?

A União Brasileira de Estudantes Secundaristas, a UBES, estão acompanhando mais de perto. Essa é a entidade responsável pelo novo ensino médio. Mas, nós da UNE, entendemos que todo mundo para chegar na universidade tem que passar pela escola. Então, nós estamos debatendo junto com a UBES, vamos às ruas no na sexta-feira para garantir e pressionar pela revogação do novo ensino médio, mas também lutando por uma proposta de ensino médio que consiga contemplar a realidade dos estudantes. Eu acho que é isso que nos une. Então, a gente está acompanhando e iremos às ruas, como sempre, para defender os direitos dos estudantes brasileiros.

(FOTO: Yuri Salvador/UNE)

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