Governo tentou acordo e obstrução, mas textos sobre decisões monocráticas e liminares passaram com folga. Propostas seguem para comissões
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta quarta-feira (9) um pacote “anti-STF”. Pela manhã, foi aprovada a PEC que limita decisões individuais de ministros da Corte. Foram 39 votos favoráveis e 18 contrários à iniciativa. Pela tarde, o grupo deu aval ao texto que dá poder ao Congresso para derrubar decisões do Supremo que “extrapolem os limites constitucionais”. Foram 38 votos a favor e 12 contrários.
Ambos os textos, defendidos pela bancada bolsonarista, precisam ainda passar por comissões especiais e, se aprovados nestes colegiados, seguem para o plenário da Câmara, onde precisam ter o aval em dois turnos de 308 deputados. O texto das decisões monocráticas já foi aprovado pelo Senado. Já a proposta que dá poderes revisores ao parlamento sobre a Corte precisa passar pela Casa Revisora ainda.
Os parlamentares discutem ainda nesta tarde uma proposta que cria novas hipóteses de “crime de responsabilidade para ministros do STF. O avanço das pautas “anti-STF” ganhou força na Câmara após o bom resultado eleitoral da direita no pleito municipal e deu impulso às pautas defendidas por aliados de Bolsonaro. A base do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi contra a aprovação dos textos na CCJ.
O colegiado é presidido pela deputada bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC). Desde o primeiro semestre, ela tem dado prioridade a pautas que miram no STF, mas as condições políticas para pautar esses temas só foram criadas com o avanço do processo de sucessão de Arthur Lira (PP-AL) no comando da Casa. O PL, cuja bancada é a maior da Câmara, com 99 deputados, usa o tema para barganhar e apoiar um candidato comprometido em fevereiro de 2025. O resultado eleitoral deste ano também fortalece essas pretensões.
A primeira versão do texto aprovado nesta tarde, que pode cassar decisões do STF, foi apresentada no ano passado em meio a um descontentamento da direita com o Supremo. Isso ocorreu com decisões sobre o marco temporal de terras indígenas, a descriminalização do uso da maconha e do aborto até 12 semanas de gestação.
“Nas decisões do Supremo Tribunal Federal, no exercício da jurisdição constitucional em caráter concreto ou abstrato, se o Congresso Nacional considerar que a decisão exorbita do adequado exercício da função jurisdicional e inova o ordenamento jurídico como norma geral e abstrata, poderá sustar os seus efeitos pelo voto de dois terços dos membros de cada uma de suas Casas Legislativas, pelo prazo de dois anos, prorrogável uma única vez por período”, diz o texto.
Parlamentares da base do governo, presentes à comissão, foram contra a proposta. “Trata-se de uma matéria absolutamente inconstitucional e viola, de maneira flagrante, cláusula pétrea da nossa Constituição. Nós estamos debatendo um tema que, com o mesmo objetivo de outros, tem a intenção de frear as decisões tomadas pelo STF. O que se pretende aqui é invalidar aquilo que o STF decide. Isso fere o art. 60, § 4º, da Constituição Federal, que trata da separação dos Poderes”, disse o deputado Helder Salomão (PT-ES).
“Essa é uma PEC para calar o Supremo porque suas decisões não os agradam”, disse a deputada Erika Kokay (PT-DF) da base do governo. Na oposição, foram várias as manifestações de defesa do texto. “Tem deputado aqui que não quer mexer com os 11 imperadores do Brasil”, afirmou a deputada Bia Kicis (PL-DF).
O autor da proposta é o deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR) e a esse texto foi juntado um de teor similar do deputado Domingos Sávio (PL-MG). O texto aprovado é um relatório do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP). “O art. 49 da Constituição Federal, quando trata das prerrogativas do Congresso, é claro ao dizer que dentre elas está defender e resguardar para que os outros Poderes não se sobreponham às prerrogativas do Congresso. Hoje, se nós não tivermos esse comando constitucional, alguém decide, de maneira, flagrantemente inconstitucional, inclusive, com um voto divergente de um Ministro dizendo”, afirmou Sávio na comissão.
Senado
A PEC foi aprovada no Senado em novembro do ano passado por 52 votos favoráveis e 18 contrários. A proposta é uma demanda antiga de parlamentares bolsonaristas, que tem mirado o STF e querem limitar o poder de alcance do Judiciário. Na ocasião, o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (PT-ES), lamentou a aprovação e declarou que espera que a Câmara barre a iniciativa.
“Eu fico triste com essa decisão, fico triste com esse encaminhamento que se dá, mas eu tenho esperança de que a Câmara dos Deputados em aqui passando essa PEC, a Câmara efetivamente se debruce sobre esse tema com mais serenidade, com mais equilíbrio”, disse.
(Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados)