Se aprovada (e provavelmente vai), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST) deve gerar bastante disputa ideológica na Câmara dos Deputados pelos próximos meses.
Isso porque a comissão, que deve somar 27 membros titulares e outros 27 suplentes, será composta apenas por deputados federais, cuja bancada é, em sua maioria, favorável ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
Apenas o Partido Liberal (PL), sigla do ex-mandatário, elegeu 99 das 513 cadeiras da Casa na última eleição.
Relator
Deputado federal e ex-ministro do Meio Ambiente no governo de Jair Bolsonaro, Ricardo Salles (PL-SP) é o nome favorito à presidência da CPI do MST.
À imprensa, Salles afirmou que a CPI convocará os líderes de todos os estados para depor e, depois, que “irá fazer o caminho do dinheiro”, a fim de identificar os “financiadores” do movimento.
Salles defende ainda a discussão sobre a regularização fundiária do País, para tratar questões como terras indígenas, unidades de conservação, assentamento do Incra, entre outros.
Polêmicas
Ligado aos ruralistas, Salles, no entanto, tem um longo histórico de polêmicas que deveriam ser considerados antes da definição do seu nome como relator da CPI do MST.
Em 2018, enquanto candidato à Câmara, o ex-ministro pregava “tolerância zero contra o MST”, além de fazer alusões a armas de fogo e munições em um dos panfletos de campanha.
Este ano, o agora parlamentar afirmou que o MST “se disfarça de ONG para encher o bolso de dinheiro”, e que o objetivo de uma comissão seria investigar supostas ações terroristas dos trabalhadores, a quem descreve como bandidos e picaretas.
Conflito de interesses?
Sócio de um empresário do agronegócio, Ricardo Salles negou ao Globo que ser presidente da CPI traria conflito de interesses, pois ele se compromete a técnica enquanto relator.
“Eu sou um dos que mais conhece o assunto na Casa e me comprometi com o presidente Arthur Lira e demais líderes a fazermos um trabalho sóbrio, respeitoso e técnico. Não haverá pirotecnia”, disse.
Alternativa
Quem também pode assumir a presidência da comissão é Luciano Zucco (Republicanos-RS), investigado pela Polícia Civil por incentivar atos antidemocráticos de bolsonaristas.
O parlamentar postou no Instagram uma foto de um ato antidemocrático em frente ao Comando Militar do Sul.
O documento da Polícia Civil foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Tiro no pé
Nesta terça-feira (2), o grupo de advogados, juristas e defensores públicos Prerrogativas informou que os trabalhadores convocados para depor na CPI terão assessoria jurídica.
Coordenador do grupo, o advogado Marco Aurélio de Carvalho está confiante com os resultados da CPI, pois acredita que a visibilidade e as discussões em torno do trabalho do MST serão uma oportunidade de desmistificar a ideia sobre o movimento dos trabalhadores e ainda de dar visibilidade às ações do MST.
“Não tenho dúvidas de que essa CPI será um tiro no pé da oposição. O MST mostrará ao país a importância da reforma agrária e da função social da propriedade. O MST tem a nossa solidariedade, a nossa admiração, o nosso respeito e o nosso irrestrito apoio”, disse Carvalho ao jornal Folha de São Paulo.
João Paulo Rodrigues, da direção nacional do MST, disse em entrevista ao Brasil de Fato que a CPI não tem um fato pré-determinado.
“O MST não tem convênio com o governo em nenhum estado. O movimento já demonstrou que é uma organização que produz alimentos saudáveis e por isso queremos essa reunião com o Lira para fazer um bom debate sobre o assunto”, continuou Rodrigues. (Foto MST)