Ex-ministro do primeiro governo Lula teve mandato cassado pela Câmara em 2005; sessão do Senado celebrou a democracia brasileira
Ex-ministro da Casa Civil no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ex-deputado federal, José Dirceu participou de solenidade no Congresso Nacional nesta terça-feira (2) em celebração à democracia brasileira. A data relembra o dia 2 de abril de 1964, quando o Congresso Nacional declarou vago o cargo de presidente do Brasil, até então ocupado por João Goulart, o Jango, deposto pela ditadura.
O evento marcou o retorno de Dirceu ao Congresso Nacional depois de quase 19 anos da cassação do mandato do petista pela Câmara dos Deputados durante o escândalo do Mensalão, em 2005. Ao abrir o discurso, Dirceu relembrou o período de afastamento e disse que quase recusou o convite para a sessão.
“Quase não aceitei [o convite], porque desde o dia da madrugada de 1º de dezembro [de 2005], quando a Câmara dos Deputados cassou meu mandato, que o povo de São Paulo tinha me dado pela terceira vez, eu nunca mais voltei ao Congresso Nacional. Mas acredito que João Goulart merecia e merece a minha presença hoje aqui”, disse Zé Dirceu.
José Dirceu foi convidado pelo senador Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP) para participar de uma sessão solene no Senado, pela democracia. Além do ex-ministro de Lula, outras personalidades também discursam no evento, como a viúva do ex-presidente João Goulart, Maria Thereza Goulart e o presidente-executivo do Instituto João Goulart, João Vicente Goulart.
“Destaco e agradeço a presença, nesta mesa, deste companheiro, que agradeço a Deus a possibilidade de, na minha formação política, ter sido um dos formadores dos melhores momentos do Partido dos Trabalhadores. Meu querido José Dirceu de Oliveira e Silva, ex-deputado federal, militante político da resistência à ditadura entre os anos de 1960 e 1970. Zé é uma honra, para nós, ter você conosco”, destacou Randolfe no início do evento.
Durante a fala, Dirceu afirmou que João Goulart foi deposto por defender a classe trabalhadora e que a democracia no Brasil corre risco pela falta de “uma revolução social”. “A democracia está em risco porque não se fizeram as reformas estruturais, porque não há uma democracia social. Quando uma democracia social deixa de existir, a democracia institucional, política, corre risco. Para consolidar a democracia brasileira, nosso papel é fazer uma revolução social no Brasil, desconcentrar a renda, riqueza e propriedade”, defendeu.
O ex-ministro criticou a falta de mudanças estruturais nas Forças Armadas desde a redemocratização do país e cobrou o esclarecimento dos crimes cometidos pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar. “Nosso povo resiste, luta. E se temos democracia é por isso. Esse é o nosso papel e por isso relembramos 1964. Por isso é um compromisso irrenunciável o esclarecimento dos mortos e desaparecidos, a luta pela verdade do que aconteceu”, disse Dirceu.
“Não basta a desmilitarização e a volta aos quartéis. Isso aconteceu em 1988. O comprometimento das Forças Armadas com o governo Bolsonaro e o 8 de janeiro está aí”, disse. “É preciso ir à questão principal, que é a educação nas escolas militares, o sistema de promoções e a prevalência do poder civil sobre o militar. Se quisermos que não voltemos a 8 de janeiro ou 31 de março, o Congresso Nacional tem que fazer um debate das Forças Armadas”, completou.
José Dirceu vem se reaproximando das articulações políticas desde a eleição do presidente Lula, em 2022, fazendo contato com parlamentares e ministros de governo. Em março deste ano, Dirceu reuniu grande parte da nata da política brasileira em sua festa de 78 anos. Entre os presentes, estavam o vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), ministros de Estado (Fernando Haddad, da Fazenda, Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais, Nísia Trindade, ministra da Saúde e mais sete deles), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), líderes no Congresso e dezenas de parlamentares e advogados.
Sua articulação, contudo, não se limita a aliados do governo. Ele ainda mantém diálogo frequente, por exemplo, com Valdemar Costa Neto, presidente do PL, principal partido de oposição a Lula. Hoje em lados opostos, Dirceu e Valdemar dividiram cela no complexo da Papuda, em Brasília, após serem condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2012, no esquema de compra de apoio parlamentar. Dirceu ficou 1 ano e 9 meses preso em Curitiba (PR), como consequência das investigações da Lava Jato. Ele está impedido de disputar as eleições até esse ano, mas há especulações sobre ele voltar às urnas em 2026.
(Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)