Uma mentira para defender o direito de mentir.

Glauco Alexander Lima  (São Paulo) – Alguém, em sã consciência, pode crer que existe alguma motivação nobre nesse movimento chamado bolsonarismo, quando diz que combate o Projeto de Lei 2630 para defender  a liberdade de expressão ou do direito de opinião?

Só alguém muito ingênuo ou extremante desonesto pode dizer que acredita numa argumentação dessa.

O bolsonarismo não está interessado no debate de ideias, não quer saber de defender pensamentos como a economia de mercado, a livre concorrência, a redução da máquina do estado ou clássicas visões de direita.

Bolsonarismo não é Roberto Campos, Delfim Neto, Ludwig von Mises ou Friedrich Hayek.

Está mais para Damares, a boiada de Ricardo Salles e as trevas de Malafaias, com seus boatos perversos e suas diabólicas teorias da conspiração.

O bolsonarismo se abraça numa causa nobre, inquestionável, inegociável, para defender o seu direito de mentir, difamar, distorcer e criar apatia e desencanto.

Quer a internet sem regras, sem regulamentações, sem limites claros, como terra de ninguém, para poder jogar o único jogo que sabe jogar: a mentira descarada. E sabe jogar muito bem nesse campo enlameado.

Para o chamado bolsonarismo raiz, a mentira, a chamada fake news, não é um deslize ou um recurso ocasional do embate eleitoral.

A mentira sempre foi usada em todos os campos da vida humana,  mas para os conhecidos gabinetes do ódio bolsonarista, é assumidamente uma tática para o enfrentamento político.

É  um movimento que quer criar uma descrença em boa parte da população, um desencanto, uma apatia,  em temas como a eficiência das vacinas, usando para isso a disseminação sistemática das maiores aberrações e absurdos.

O bolsonarismo é um avanço em marcha a ré.

É o não-pensar.  E se sente vaidoso em ser assim.

Uma vanguarda do atraso.

Tem um pé na modernidade, ao usar recursos digitais, automação, tecnologias de ponta e o outro pé na idade média, trabalhando para negar avanços e conquistas em campos como o ambiental, direito de mulheres, pretos, indígenas, cultura, educação  e avanços da ciência.

Isso tudo é organizado, tem experimentos e profissionais que coordenam esse movimento.

Gente como Steve Bannon, considerado o principal ideólogo do governo de Donald Trump, que trabalha em poderosas narrativas a partir de simplificações binárias do conflito político e social, purificando os grupos que encarnariam “as pessoas de bem” e legitimando a satanização dos demais.

Uma vez que o conflito político não se refere somente ao controle de recursos materiais, mas envolve cada vez mais de modo constitutivo disputas pelo significado cultural, procura-se mostrar como a ideologia codificada, amplificada de modo poderoso e distorcido nas performances políticas de líderes como Trump e Bolsonaro, tem capacidade de produzir efeitos perversos na ordem democrática contemporânea.

Essa sombra fantasmagórica, a princípio difusa e hoje muito nítida, teve seu primeiro ápice com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, e terminou de se solidificar com a chegada de Jair Bolsonaro à presidência do Brasil.

Outros exemplos dessa nova linha de desconstrução do mundo, para criar uma nova realidade desenhada a partir dessas crenças obscurantistas, podem ser encontradas na Europa de Matteo Salvini (Itália), Viktor Orban (Hungria), Marine Le Pen (França) e Vox (Espanha).

O bolsonarismo diz cinicamente que a regulamentação, a criação de limites na internet, pode ser usada por regimes totalitários para calar a oposição, para estabelecer censuras ou sustentar regimes de exceção.

Mas como acreditar nesse tipo de preocupação por parte de um movimento que colocou milhares de pessoas no Distrito Federal do Brasil para literalmente destruir de forma terrorista, as sedes físicas dos três poderes da república brasileira?

Uma turma que reivindica um regime tipo “Intervenção militar com Bolsonaro no poder” ou “Um regime onde o único poder seja as Forças Armadas e o presidente seja o mito Bolsonaro”.

Como levar a sério a preocupação dessa turma com um dos pilares da democracia que é a liberdade de expressão?

Democracia é algo desprezado pelo bolsonarismo, que sempre sabotou o embate democrático, querendo colocar em dúvida o sistema eleitoral e a eficiência das urnas. São lobos maus usando pele de cordeiros defensores da liberdade para preservar o direito de mentir e agredir sem dó, nem piedade. (Foto: Reprodução)

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