Por Henrique Acker -O mundo assistiu em 12 de fevereiro ao anúncio de que Donald Trump negociará uma possível proposta de paz na Ucrânia diretamente com Vladimir Putin. Os dois presidentes conversaram por uma hora e meia por telefone e acertaram a formação de equipes de negociação. Trump anunciou que deve se encontrar com Putin na Arábia Saudita, sem definir data.
A iniciativa de Trump em conversar diretamente com Putin é um reconhecimento claro de que a guerra sempre foi entre Rússia e os EUA, tendo a Ucrânia apenas como cenário. Volodymyr Zelensly recebeu telefonema de Trump logo após a conversa com Putin.
O presidente da Ucrânia acompanhará as negociações entre Trump e Putin, através do secretário de Estado dos EUA Marco Rubio e do vice-presidente JD Vance. A União Europeia sequer foi mencionada como mediadora ou convidada para as negociações de paz.
Ucrânia continuará fora da OTAN
Antes do início da reunião do Grupo de Contato para a Defesa da Ucrânia, realizada em Bruxelas em 12 de fevereiro, Pete Hegseth, secretário de Defesa dos EUA, foi claro sobre as negociações de paz: “Temos que começar a admitir que regressar às fronteiras anteriores a 2014 na Ucrânia é um objetivo irreal. Perseguir esse objetivo ilusório irá apenas prolongar a guerra e causar mais sofrimento.”
Hegseth foi mais longe, ao declarar que “os EUA não acreditam que a adesão da Ucrânia à OTAN seja um desfecho realista de um acordo negociado”. O secretário de Defesa dos EUA deixou claro que a prioridade de seu país será dar atenção às fronteiras da OTAN com a China.
Ele incentivou os aliados europeus a tomarem conta de suas fronteiras. “Quero expressar de forma direta e sem ambiguidades que realidades estratégicas difíceis impedem os Estados Unidos de se concentrar em primeiro lugar na segurança da Europa”.
Isso explica por que Mark Rutte, ex-primeiro-ministro da Holanda e atual secretário-geral da OTAN, está em peregrinação pela Europa, tentando convencer os dirigentes europeus a destinar até 5% dos orçamentos de seus países para a Defesa.
Europa paga a conta
Passaram-se três anos da invasão russa da Ucrânia. Fábulas de dinheiro público foram gastas pela UE e pelos EUA em armas, munições, ajuda humanitária e reconstrução do país. Calcula-se que, só em 2024, o total de gastos dos aliados com a guerra foi de 50 bilhões de euros. A maior parte é de recursos dos impostos pagos pelo contribuinte europeu.
Os dirigentes da UE firmaram posição de que qualquer solução para o conflito teria que passar por negociações diretas entre Putin e Zelensky, com a participação da União Europeia. O slogan da UE era “Nada para a Ucrânia sem a Ucrânia”, mas a realidade tornou-se bem diferente.
Em resposta à iniciativa de Trump, os ministros das Relações Exteriores da França, Alemanha, Polônia, Itália, Espanha e Reino Unido divulgaram um comunicado no qual defenderam seu papel nas negociações.
Trump ignora UE
A cúpula da UE apostou suas fichas numa vitória dos democratas na eleição presidencial dos EUA. O governo Biden era visto como um aliado e fiador da postura de apoio incondicional da UE à Ucrânia.
A vitória de Donald Trump alterou por completo o cenário político mundial e agora a União Europeia corre o risco de pagar a conta e ficar de fora dos acordos, que devem envolver a exploração das riquezas minerais do subsolo ucraniano.
O presidente estadunidense já deixou claro que pretende centrar seus esforços na luta pela hegemonia econômica, política e militar mundial, mirando na China como alvo principal. Sob essa ótica, os conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia tornam-se empecilhos que dificultariam o grande embate geopolítico entre as superpotências.
Trump anunciou que iria acabar com a guerra na Ucrânia e, em momento algum, convocou a cúpula da UE ou o próprio Zelensky para debater o assunto. Preferiu ser mais objetivo, reconhecendo que qualquer solução para o conflito passa por negociações diretas com Moscou.
Carvão e manganês nas mãos dos russos
A segurança das fronteiras sempre foi usada como argumento para a ofensiva militar russa contra a Ucrânia. Mas há outros interesses em jogo na região do Donbass. Até 80% do carvão ucraniano está no leste do país ocupado pela Rússia. O carvão antracito, valioso do ponto de vista energético, está sob controle russo.
Desde 2022, os russos ocupam áreas de mineração que totalizam cerca de 12 trilhões de dólares em recursos minerais, de acordo com estimativas da instituição de pesquisa canadense SecDev.
Além do minério de ferro, essas áreas concentram não só outros recursos importantes para a metalurgia – como carvão, titânio e manganês –, mas também ouro, gás natural, petróleo, caulim, sal, gesso, zircônio e urânio, embora em menor proporção.
“Terras raras” para os EUA.
Apesar de combater com um discurso nacionalista os efeitos econômicos da ocupação do Leste de seu país pela Rússia, Vlodymyr Zelenski escancarou o subsolo da Ucrânia à exploração de empresas estadunidenses nas chamadas “terras raras” da Ucrânia.
“Esses depósitos são inestimáveis, são enormes quantias de dinheiro, enormes. Por isso, precisamos protegê-los. Então, se estamos falando sobre um acordo, se é isso que os americanos querem, vamos fazer o acordo, estamos totalmente a favor disso”, disse Zelensky à Agência Reuters em entrevista na sexta-feira, 7 de fevereiro.
A Ucrânia possui depósitos de 22 dos 50 materiais classificados como “críticos”, segundo o governo ucraniano. Entre eles, as maiores reservas de urânio, lítio e titânio da Europa. Os EUA dependem em grande parte das importações desses minerais.
Especialistas da OTAN estimam que a Ucrânia tem potencial para se tornar uma fornecedora-chave de diversas matérias-primas críticas, como titânio, lítio, berílio, manganês, gálio, urânio, zircônio, grafite, apatita, fluoreto e níquel.
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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