Por Henrique Acker – Ao eleger a China como inimigo número um dos EUA, Donald Trump definiu sua estratégia, o alvo a ser atingido neste segundo mandato presidencial. Afinal, é a China com seu modelo de parceria público-privada que cresce e ameaça o decadente American Way of Life.
O presidente da maior potência econômica e militar do planeta nem tomou posse e já começa a fazer barulho, espalhando ameaças. É a forma estridente com que a nova extrema-direita encontrou para se firmar como alternativa política mundial no século XXI.
Ao contrário do que dizem alguns comentaristas, o comportamento provocativo de Trump não é errático e nem prova de demência. Mesmo que não realize metade do que promete, ele tem que mostrar que está no controle.
Aliados subordinados
Trump avisa que quer um alinhamento completo, uma subordinação plena de seus aliados, para traçar e alcançar suas metas. Sabe que a União Europeia teme a Rússia, ainda que essa seja uma ameaça propositalmente exagerada. E sabe que a UE não tem poderio militar.
Sabe também que os europeus atravessam enorme crise política, com líderes fragilizados diante do avanço da extrema-direita, com quem ele conta. Por isso, determina: quem quiser “proteção” terá que dedicar 5% de seu orçamento à OTAN para comprar armamentos e munições de fabricantes dos EUA.
Mira na Goenlândia como balão de ensaio. Afinal, são apenas 56 mil habitantes num território de dois milhões de km2, rico em petróleo, gás e outros minerais. É evidente que o corredor entre a Groenlândia e a Europa é estratégico. Quem vai defender tanta terra dos russos?
Vizinhos desvalorizados
Dos vizinhos da América Latina, reivindica a posse do Canal do Panamá, fundamental para o comércio marítimo internacional. Anuncia que vai jogar duro com o México, rota de passagem de imigrantes para os EUA.
Para o Canadá, a receita de Trump é a desmoralização. Daí o blefe de torná-lo o 51º estado dos EUA. Dane-se o discurso polido de Justin Trudeau, o primeiro-ministro liberal demissionário.
Na Ucrânia, talvez um acordo que assegure os interesses básicos de Vladimir Putin e uma saída honrosa para Zelensky. No Oriente Médio, apoio incondicional a Benjamin Netanyahu, suas tropas assassinas e seus colonos neofascistas. Eles estão lá para cumprir o papel de “cachorro louco” dos EUA. Os palestinos que se lasquem.
Dono do mundo
A retórica escrachada de Donald Trump nada tem de absurdo. É apenas a expressão da velha ambição imperialista dos EUA, combinada com o conhecido deboche da extrema-direita.
Ao invés de focar exclusivamente nos problemas internos dos EUA, como se previa, Trump está avisando aos seus aliados que o mundo tem dono. E que não pretende dividir a hegemonia estadunidense com a China e mais ninguém, nem com seus próprios amigos.
Quem quiser estar “a salvo” da Rússia e da China terá que ficar sob o guarda-chuva de Washington. Custe o que custar. Os europeus podem se escandalizar com Trump, mas os latino-americanos não se surpreendem. Conhecem isso dos tempos da guerra-fria.
Garoto-propaganda
Para coroar sua política, Trump faz de Elon Musk seu garoto-propaganda. A intenção é fragilizar os trabalhistas na Inglaterra – antiga aliada fiel dos EUA – e jogar lenha na crise econômica e política na Alemanha e na França, maiores economias da Europa.
Conta também com a adesão de Mark Zuckerberg, da Meta (Facebook, WhatsApp e Instagram), que já anunciou o fim da política de verificação e proibição de notícias falsas em suas redes sociais. Afinal, o “show” não pode parar.
Quem não gostar, paciência. Esse é o mundo do cassino, da lavanderia de dinheiro sujo, do capital financeiro globalizado e das big techs. Nele, pouco importa a democracia, o papel da educação, da saúde e da ciência. Tampouco a informação checada e baseada em fatos reais.
O que pesa mesmo para Trump e companhia são os interesses de um punhado de magnatas, que pretendem fazer do mundo à sua imagem e semelhança.
E se isso tudo redundar em crise econômica nos EUA, com a inflação a partir dos preços de produtos estrangeiros sobretaxados, paciência. A culpa será sempre dos chineses…
Por Henrique Acker (correspondente internacional)