Relatório do Ministério da Justiça e Segurança Pública destaca relação direta entre o tráfico de pessoas e o trabalho escravo no País
O perfil das vítimas de tráfico de pessoas é masculino, entre 18 e 29 anos, e negro. É o que diz o Relatório Nacional sobre Tráfico de Pessoas, publicado nesta terça-feira (30) pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). Os dados da pesquisa são de 2021 a 2023.
De acordo com o relatório, a principal finalidade identificada para o tráfico de pessoas é a exploração laboral. Segundo dados da Polícia Federal (PF), utilizados pela pesquisa, foram registrados 94 inquéritos por tráfico de pessoas entre 2021 e 2023. Desses, 50 foram por trabalho escravo, 25 por exploração sexual, oito em razão de adoção ilegal, outros oito para servidão e três casos de remoção de órgãos.
Boletins do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) apontam que, entre os anos de 2021 e 2023, 8.415 pessoas foram resgatadas em condições análogas à escravidão. Destas, 80% eram negras — pretas e pardas — (6.754), 18% brancas (1.497) e 2% indígenas (148). Além disso, 84% das vítimas pertenciam ao sexo masculino (7.115).
Neste mesmo período, foram resgatados 335 trabalhadores não nacionais em condições análogas à escravidão, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os paraguaios são as principais vítimas, seguidos dos venezuelanos e bolivianos.
Os setores com maiores números de migrantes resgatados são cultivo de mandioca, em São Paulo; madeireira, em Santa Catarina; e confecção de artigos de vestuário, em São Paulo. Segundo a pesquisa, pela primeira vez, foram registrados nos postos consulares mais brasileiros explorados laboralmente.
“Tradicionalmente, a exploração sexual era a finalidade primordial do tráfico internacional de brasileiros. Esse considerável aumento de vítimas brasileiras no contexto de submissão a trabalhos forçados possui relação direta com os casos de exploração no Sudeste Asiático”, diz o documento.
A pesquisa aponta ainda que, em relação ao tráfico de pessoas e fluxos migratórios, destaca-se a situação das mulheres que migram acompanhadas dos filhos. Elas, frisa o relatório, são as mais suscetíveis a aceitarem condições precárias de trabalho, visto a dificuldade em conciliar os cuidados dos filhos com a inserção no mercado de trabalho.
Também é destacado na pesquisa que o trabalho escravo no âmbito doméstico e a exploração do trabalho sexual são duas finalidades ignoradas socialmente por causa da desigualdade de gênero.
A pesquisa utilizou dados de 12 instituições públicas, 66 informantes qualificados que responderam um formulário online indicando suas percepções em relação ao tráfico e 17 profissionais entrevistados com relevante atuação no enfrentamento ao tráfico de pessoas.
Falta de registros sobre os indígenas
O MJSP chama a atenção para a falta de dados sobre a população indígena. “Uma ausência que não significa a inexistência do delito. O que ocorre é a invisibilidade desse grupo em relação aos registros de tráfico de pessoas no país”, alerta.
“Temos um desafio muito grande ali no Mato Grosso do Sul. A questão indígena é urgente em todo o Brasil, porém no Mato Grosso do Sul você tem um grande povo Guarani-Kaiowá desterritorializado desde a guerra do Paraguai, (…) foram desterritorializados, concentrados na pequena reserva indígena Dourados, ali é um depósito de gente sujeito a todo tipo de exploração, subjugação inclusive por pessoas do próprio grupo. (…) Eles são usados nas colheitas sazonais do Brasil. Primeiro na cana, depois na uva, na colheita da maçã”, contextualiza um representante do Sistema de Justiça e Segurança Pública, um dos entrevistados do relatório.
Segundo o MJSP, é urgente que se conheçam as especificidades do tráfico de pessoas indígenas, para assim “delinear estratégias efetivas para a proteção desse grupo”.
(Foto: Reprodução/Internet)