Após uma manhã “sangrenta” nos mercados pelo mundo, o Ministério da Fazenda avalia que a evolução favorável dos ativos brasileiros ao longo desta segunda-feira indica que um freio mais forte na economia dos Estados Unidos tende a ser favorável para o país. À exceção de um cenário de recessão muito intensa e turbulenta nos EUA, a leitura é de que uma ação mais rápida do banco central americano, o Federal Reserve (Fed), deve favorecer o câmbio brasileiro e, consequentemente, resultar em um quadro mais tranquilo de inflação e juros no país.
A segunda começou com o derretimento das bolsas asiáticas repercutindo um risco maior de recessão nos Estados Unidos devido a dados mais fracos do mercado de trabalho divulgados na última sexta-feira. O principal índice do mercado acionário do Japão teve a maior queda desde 1987, por exemplo.
Aqui, o dólar abriu em forte alta e chegou a bater R$ 5,86, mas começou a ceder após a divulgação de um indicador mais favorável sobre o setor de serviços dos EUA e retomou patamares similares ao fechamento da última sexta-feira, de R$ 5,70.
Nesse sentido, a equipe do ministro Fernando Haddad está acompanhando os desdobramentos, mas em um primeiro momento avalia que a manhã de hoje pode ter sido contaminada por “exageros” e que o saldo deve ser positivo para o Brasil. Na semana passada, o Fed já indicou que pode começar a cortar os juros americanos na próxima reunião, em setembro.
Caso a preocupação maior com a economia dos EUA se concretize, um integrante da Fazenda considera que a queda de juros já pode começar em um ritmo mais forte, de 0,50 ponto percentual, em vez de 0,25 ponto. Por enquanto, contudo, parece improvável a convocação de uma reunião extraordinária este mês, acredita.
Outro membro da equipe de Haddad avalia que episódios como o desta segunda-feira mostram o peso que o cenário externo tem sobre os preços dos ativos domésticos, retirando um pouco da pressão sobre a conjuntura fiscal no país.
Uma queda mais forte dos juros americanos tende a enfraquecer o dólar globalmente, favorecendo a moeda de países emergentes, como o Brasil. Além disso, como o BC brasileiro já parou de reduzir a taxa Selic, que permanece no patamar elevado de 10,50% ao ano, a tendência é de que o país volte a atrair recursos externos, o que ajuda o câmbio local e diminui a pressão sobre a inflação.
Tudo isso pode afastar um cenário de alta da Selic, algo que entrou de vez no radar do mercado financeiro após o comunicado mais duro do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC na semana passada. O colegiado incluiu entre os riscos de alta para a inflação “uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada.”
Por outro lado, reforçou como um vetor de baixa para a inflação uma possível desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, o que vem sendo especulado nesta segunda-feira. A ata do Copom será divulgada nesta terça-feira e poderá dar mais detalhes sobre a avaliação do comitê em relação ao cenário econômico no país e no exterior.
O documento, contudo, não trará considerações sobre a turbulência mais recente, posterior à reunião da semana passada.
Nos corredores da autoridade monetária, a avaliação é de que o momento é de bastante volatilidade nos mercados. Sem referência firme de BCs ao redor do mundo sobre os passos futuros, todos os dados provocam ondas enormes de repercussão, em um ambiente de baixa liquidez.
Para o economista-chefe do Banco BMG, Flávio Serrano, o câmbio é uma variável muito importante para ser monitorada em relação aos próximos passos do Copom. Por outro lado, o cenário internacional está “caminhando” para mais desaceleração econômica, o que indica menos inflação.
— Então me parece que a melhor estratégia mesmo é continuar atento, mas parado. Até conseguirmos saber qual dos dois vetores será o mais forte, me parece que Selic em 10,50% ao ano é o cenário mais provável — diz Serrano.
Já Tony Volpon, ex-diretor do BC e professor adjunto da Georgetown University (EUA), avalia que uma recessão “organizada” nos EUA tende a ajudar a condução da política monetária no Brasil. Além da redução global do dólar, Volpon cita que a fraqueza da economia americana tende a moderar os preços de commodities, o que representaria um bem-vindo vetor desinflacionário para o BC local. (Foto: Ministério da Fazenda/Divulgação)