Rita Lee considerou eutanásia: “Queria uma passagem digna”

A cantora Rita Lee (1947-2023) congitou a eutánasia durante a batalha contra o câncer no pulmão.

No livro Outra Biografia, a própria explica que queria ter uma passagem digna e que sentia-se pronta para isso. O procedimento, no entanto, não é legalizado no Brasil.

”Disse a ele (médico) que minha vida tinha sido maravilhosa e, que por mim tomava o ‘chazinho da meia-noite’ para ir desta para melhor. Que me deixassem fazer uma passagem digna, sem dor, rápida e consciente. Queria estar atenta para logo recomeçar meu caminho em outra dimensão. Sou totalmente favorável à eutanásia. Morrer com dignidade é preciso”, escreveu Rita Lee, em sua segunda autobiografia.

Em outro trecho, a cantora aponta que lutar contra um câncer lhe trouxe más lembranças. A mãe de Rita Lee também sofreu com a enfermidade.

”Contei [ao chefe da área de oncologia do hospital] do trauma que ficou em mim por ter visto sofrimento da minha mãe fazendo esses dois procedimentos quando teve câncer. (…) O amor dos boys Carvalho/Lee me fez optar por aceitar fazer o tratamento, porque, se fosse por mim, adeus mundo cruel na boa”, complementou.

 

Prática é ilegal no Brasil

Tanto o suicídio assistido quanto a eutanásia voluntária são proibidas no Brasil, com pena de 6 a 20 anos de reclusão. Todos que auxiliarem um paciente a realizar qualquer procedimento neste sentido também podem ser responsabilizados por diversos crimes contra a vida.

“No Brasil, a eutanásia é equivocadamente equiparada ao homicídio doloso ou ao suporte na realização de suicídio, condutas criminalizadas. Não deveria ser visto assim, mas como acolhimento ao sofrimento de quem não possui outra solução”, argumenta Henderson Fürst, presidente da Comissão Especial de Bioética da OAB-SP e advogado da área da saúde.

Apesar de ambas as práticas não serem permitidas no Brasil, a legislação prevê que as pessoas possam ter dignidade na vida, assim como na morte. A paliativista Uiara Ribeiro defende que se fale mais sobre a morte para que deixe de ser um tabu, mas pondera: “Não podemos abreviar a vida do paciente, mas o que pudermos fazer para tornar aquele fim mais confortável e digno, fazemos”.

Um exemplo é o caso de um paciente que esteja em suporte mecânico. Se a permanência nessa condição apenas estenda sua dor, sem perspectiva de melhora, a aplicação de medicamentos para alívio de dores e o desligamento de maquinário são vistos como auxílio para um fim digno. A decisão, reforça Uiara, depende do consentimento da família do paciente.

 

Comunidade médica debate

Para a médica Uiara Ribeiro, tanto o suicídio assistido quanto a eutanásia voluntária têm espaço para serem debatidos no Brasil. Entretanto, antes de pensar na morte, é necessário pensar em equidade de acesso à saúde. Isso porque a diferença social impede que as pessoas recebam, de forma equivalente, tratamento médico de qualidade e esgotem as tentativas de amenizar suas respectivas dores.

“Ser a favor é respeitar a vontade individual da pessoa. Porém, é também abrir precedentes para: ‘será que esse paciente esgotou mesmo todas as chances de amenizar o sofrimento?'”, reflete.

O advogado Henderson Fürst reforça: “O enquadramento brasileiro atual condena pacientes ao sofrimento insolúvel indesejado”. (Foto: Reprodução)

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