Foram detectados níveis de mercúrio em todas as amostras de cabelo analisadas, incluindo adultos, idosos, homens, mulheres e crianças
Indígenas de nove comunidades da Terra Yanomami estão altamente contaminados com mercúrio. As aldeias sentem os impactos da presença do garimpo ilegal no território. Segundo um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Socioambiental (ISA), divulgado nesta quinta-feira (4), 94% dos nativos estão sob contaminação do metal pesado.
Das 287 amostras de cabelo examinadas por pesquisadores, 84% registraram níveis de contaminação por mercúrio acima de 2 g/g (micrograma). Além disso, outros 10,8% ficaram acima de 6 g/g. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que os níveis de mercúrio em cabelo não devem ultrapassar um micrograma por grama.
A pesquisa identificou que os indígenas com níveis mais elevados de mercúrio nas amostras de cabelo apresentaram déficits cognitivos e polineuropatia periférica com mais frequência. Mais de 1/4 das crianças com idade menor ou igual a 11 anos encontravam-se com anemia, quase metade (43,8%) apresentavam déficits de peso para idade (desnutrição aguda), e quase 80% apresentam déficits de estatura para idade (desnutrição crônica).
O estudo também revelou que a cobertura vacinal estimada foi baixíssima, sendo que apenas 15,5% das crianças estavam com as vacinas do calendário nacional de imunização em dia. “Esse cenário de vulnerabilidade aumenta exponencialmente o risco de adoecimento das crianças que vivem na região, e potencialmente pode favorecer o surgimento de manifestações clínicas mais severas relacionadas à exposição crônica ao mercúrio, principalmente nos menores de 5 anos”, diz a pesquisa.
Os dados da pesquisa mostram que o garimpo ilegal de ouro tem afetado a população local, pois foram detectados níveis de mercúrio em todas as amostras de cabelo analisadas, incluindo adultos, idosos, homens, mulheres e crianças, sem exceção. Além disso, foram detectados níveis de mercúrio em todas as 47 amostras de pescados, assim como em duas amostras de sedimento do rio Mucajaí, em locais próximos a áreas onde havia atividades de mineração.
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Socioambiental (ISA) fizeram um série de recomendações ao Estado para conter os prejuízos à saúde dos ianomâmis. Em caráter emergencial, a pesquisa aponta a necessidade de interrupção imediata do garimpo e do uso do mercúrio, assim como a desintrusão de invasores da TI Yanomami.
“É necessário que o Estado brasileiro – por intermédio de ações intersetoriais, incluindo Ministério da Justiça, Ministério dos Povos Indígenas, Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Saúde e outros órgãos – busque estabelecer uma reorganização nos territórios afetados, incluindo a implementação de ações de recuperação dos equipamentos públicos disponíveis na região, tais como: postos de fiscalização da Funai, escolas, pistas de pouso, postos de saúde e alojamento para equipes, entre outras melhorias de ordem logística e de apoio à população local”, destaca a pesquisa.
Considerando ações estruturais com foco na área da saúde, o estudo frisa ser essencial atualizar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), promulgada em 2002, a fim de garantir ações em saúde no território que deem conta de atender às demandas da população em todos os níveis de complexidade do Sistema Único de Saúde (SUS).
Para isso, é fundamental assegurar a ampliação e a reestruturação dos serviços de atenção à saúde existentes nas terras indígenas, de modo a abastecer os postos com medicamentos, equipamentos e insumos para atendimentos emergenciais e pequenos procedimentos, assim como garantir a realização de exames laboratoriais e de imagem no território.
Queda no garimpo
Segundo o governo federal, em março deste ano, 2,16 novos hectares foram degradados ante a 42,59 novos hectares degradados em março de 2023, o que representa uma queda de 94,86% no garimpo na Terra Yanomami.
“O Estado brasileiro cumprirá a sua responsabilidade. Vamos vencer a agressão e a violência contra os yanomami e contra seu território. A queda no número de novas áreas de garimpo é expressiva e importante. Seguiremos agora para próxima etapa deste trabalho coordenado e pactuado que é a retirada dos intrusos do território”, disse o ministro da Casa Civil, Rui Costa.
(Foto: Ipen/Divulgação/Arquivo)