Por Henrique Acker – José Pepe Mujica foi um revolucionário socialista que dedicou sua vida ao que acreditava. “É bom viver como você pensa, caso contrário você pensará como vive”, dizia.
Por isso, doava 70% de seu salário ao seu partido e a um fundo para construção de moradias. Para ele, bastava pouco para viver em sua chácara, na zona rural de Montevidéu, onde cultivava flores e hortaliças.
Guerrilha e prisão
Como tantos latino-americanos de sua geração, Pepe dedicou sua juventude a combater a ditadura em seu país, o pequenino Uruguai. Para isso, integrou-se ao Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros, com quem participou de operações de guerrilha contra o regime militar.
Ferido por seis tiros e preso quatro vezes, fugiu da prisão de Punta Carretas em duas oportunidades. Mujica passou quase quinze anos de sua vida na prisão. Seu último período de detenção durou treze anos, entre 1972 e 1985, numa solitária, tratado como refém pela ditadura.
Libertado em 1985, com o retorno à democracia, aderiu com seu partido à Frente Ampla, uma coligação política e eleitoral da esquerda uruguaia. Foi eleito deputado em 1989 e ocupou a pasta da Agricultura no primeiro governo de Tabaré Vázquez, em 2005.
Na Presidência
Em 2009, foi eleito presidente. A primeira lei que chamou a atenção em seu mandato foi a descriminalização do aborto. A segunda lei progressista aprovada foi a do matrimônio igualitário. A legislação permite a adoção também aos casais homossexuais.
A terceira lei que fez voltar os olhos para o Uruguai foi a legalização da maconha, cujas características da legislação a fazem única no mundo. Como tentativa de conter o avanço do narcotráfico no país, o Estado passaria a controlar a produção, distribuição e venda.
Entre 2005 e 2013, nos dois mandatos presidenciais seguidos da Frente Ampla, o peso da despesa social na despesa pública do país aumentou de 60,9% para 75,5%. Durante este período, a taxa de desemprego caiu de 13% para 7%, a taxa de pobreza nacional de 40% para 11% e o salário-mínimo foi aumentado em 250%.
Segundo a Confederação Sindical Internacional, naquele período o Uruguai tornou-se o país mais avançado das Américas em termos de respeito aos “direitos fundamentais do trabalho, em particular a liberdade de associação, o direito à negociação coletiva e o direito à greve”.
Palavras simples para assuntos profundos
Nos últimos anos, depois de abandonar o mandato de senador, Pepe Mujica concedia entrevistas, dava depoimentos para filmes (1) e participava de eventos públicos. Neles, abordava temas profundos sobre os destinos da sociedade e da humanidade, com a simplicidade de quem bate um papo com amigos num café.
Seus pensamentos não foram retratados em livros autorais, mas deram origem a vários títulos publicados com base em entrevistas que concedeu a diversos jornalistas.
Daí surgiram e foram replicadas frases de grande significado, com palavras que qualquer um pode compreender. Tanto que Mujica foi convidado para uma videocoluna na Deutsche Welle, cadeia de comunicação da Alemanha.
No Brasil
Esteve algumas vezes em público no Brasil. Na Conferência Rio+20, em 2013, explanou sobre a sociedade de consumo: “O desenvolvimento não pode ser contra a felicidade. Tem que ser a favor da felicidade humana: do amor pela vida, das relações humanas, do cuidado com os filhos, de ter amigos, de ter o essencial.”
Na Concha Acústica da UERJ, em 2015, falou aos estudantes criticando os saudosos das ditaduras militares. “Golpe de Estado, por favor! Este filme já vimos muitas vezes na América Latina. Esta democracia não é perfeita, porque nós não somos perfeitos. Mas temos que defendê-la para melhorá-la, não para sepultá-la”.
Pepe Mujica definiu o que pensava sobre a vida numa de suas últimas entrevistas, concedida à BBC:
“Se você não definir um objetivo, uma causa, a sociedade de mercado vai te enquadrar e você vai passar a vida inteira pagando contas. Agora, se você tem uma causa, isso é secundário, porque você vive pela causa.”
(1) Filmes sobre a vida de José Pepe Mujica: Uma noite de 12 anos (concorreu ao Oscar), Os sonhos de Pepe (documentário – 2024), El Pepe, uma vida suprema (documentário) e Tupamaros.
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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Fontes:
