PEC para criminalizar o porte de qualquer quantidade de droga passa com folga em comissão da Câmara

Proposta que criminaliza a posse de qualquer substância ilícita, e não distingue o usuário do traficante, é aprovada na CCJ depois de mais um confronto ideológico. Texto agora será analisado por uma comissão especial antes de ir a plenário

 

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, na noite de quarta-feira (12), a proposta de emenda constitucional (PEC) 45/2023, que criminaliza a posse de qualquer quantidade de droga. A matéria aprovada no Senado, em abril, foi patrocinada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), como uma resposta do Legislativo ao Supremo Tribunal Federal (STF) — que analisa uma ação que pode definir a quantidade que distingue o usuário do traficante.

O texto altera a Constituição Federal para criminalizar a posse e o porte de toda e qualquer droga ilícita sem autorização. Depois de quatro horas, a CCJ aprovou a PEC por 47 x 17. No debate, deputados da oposição acusaram os governistas de agirem em defesa do tráfico e do crime organizado. Os apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) rebateram, dizendo que a proposta não trata de descriminalização e a visão de punir usuário não vai resolver o problema.

O deputado Ricardo Salles (PL-SP), relator no colegiado, defendeu a importância da medida. Também responsabilizou os usuários de drogas pelos crimes cometidos por traficantes. “Se não tivermos uma medida constitucionalmente prevista que coloque responsabilidade sobre aqueles que são os verdadeiros originadores da demanda do tráfico de drogas, haverá um desincentivo, evidentemente, à interrupção do relativo consumo de entorpecentes no Brasil”, frisou.

O deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ) afirmou que a proposta beneficia as organizações criminosas, à medida que aumenta o nível de encarceramento de jovens negros e periféricos que tendem a ser recrutados por facções do crime organizado nas penitenciárias do país. “Uma pessoa é presa e quando ela chega no sistema prisional, a primeira pergunta que fazem, sabe qual é, formalmente? Qual é a sua facção? Porque o sistema carcerário é organizado por facções. Daí uma pessoa é presa por ser uma usuária, poderia ter uma outra abordagem, de acolhimento de saúde, mas ela entra no sistema prisional e vai ter que se faccionar”, afirmou.

“O encarceramento em massa é inteligentíssimo para o PCC, para o Comando Vermelho e para o Terceiro Comando. Parabéns, estão fortalecendo o crime organizado no Brasil”, ironizou.

A deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) também criticou a iniciativa que, segundo ela, busca “reduzir a criminalidade criminalizando”. “Nós temos relatórios científicos que [demonstram que] a criminalização de usuário não pode ser a saída para pensar um Brasil que esteja livre [das drogas], sobretudo para pensar segurança pública.”

A PEC é vista como uma reação de setores do Legislativo ao julgamento do tema pelo Supremo Tribunal Federal (STF), iniciado em 2015. Até o momento, cinco ministros deram votos favoráveis à descriminalização do consumo pessoal de maconha: Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e a ministra aposentada Rosa Weber. Apenas Cristiano Zanin votou contra.

A ação põe em debate a interpretação do artigo 28 da Lei de Drogas (11.343/2006), que elenca as penas para quem adquire, guarda, armazena, transporta ou porta, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. O deputado Hélder Salomão (PT-ES) destacou que a mudança proposta é ilegal, já que modifica uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal, e prometeu ir à Justiça se a proposta avançar.

“Estamos falando de uma cláusula pétrea. Nunca pode ser mudada para restringir direitos”, destacou. “Anotem aí: se prosperar essa proposta, teremos uma nova judicialização do caso”, concluiu.

(Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados)

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