Texto apresentado pelo senador do Fabiano Contarato retirou da proposta trechos sensíveis e retrocessos promovidos pela Câmara dos Deputados. Projeto deve ser votado na próxima semana
A Comissão de Meio Ambiente (CMA) adiou por uma semana a análise e votação do relatório apresentado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES) ao Projeto de Lei 1459/2022, o PL do Veneno. A proposta, que tramita no Congresso Nacional desde 1999, revoga a atual Lei dos Agrotóxicos (Lei 7802/1989) e altera as regras para aprovação e comercialização desses produtos no país.
A matéria recebeu uma série de alterações ao longo dos anos e tem como objetivo revogar a Lei dos Agrotóxicos. O PL é alvo de uma série de críticas de entidades de conservação ambiental por afrouxar regras para pesquisa, experimentação, produção, comercialização, importação, exportação, embalagens e destinação final de pesticidas no Brasil. Com o pedido de vista de parlamentares ligados à Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) concedido, a expectativa é de que a CMA retome a análise do projeto na próxima quarta-feira (4). Depois a proposta segue para análise do plenário.
Logo no começo da leitura do documento, feita na quarta-feira (27), o senador lembrou que durante os 23 anos de tramitação da proposta o texto saiu de um texto aprovado no Senado com três artigos para uma nova proposição, depois de análise na Câmara dos Deputados, contendo 67 artigos. Com o retorno da proposta ao Senado, cabe ao relator apenas acatar ou tentar suprimir mudanças promovidas pela Câmara. Não há possibilidade de novas mudanças, com acréscimos de propostas, apenas retirada de pontos.
“Permitimos que o projeto fosse amplamente avaliado e discutido. Apresentamos o relatório com supressões de expressões e procedimentos prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. Levando tudo isso em consideração, conseguimos avançar com diálogo e acordo entre as partes”, explicou Contarato.
O projeto, de acordo com o líder do PT no Senado, atende a uma necessidade de atualização normativa diante do desenvolvimento técnico e científico do mundo atual. O regramento de 1989 tem mais de 30 anos e, de acordo com Fabiano Contarato, nesse período a economia, o setor agropecuário e a ciência evoluíram de forma significativa pela incorporação de novos conhecimentos, tecnologias, processos e instrumentos.
Uma das modificações promovidas por Contarato retirou da proposta os trechos que permitiriam a aplicação da “anuência tácita” nos casos em que o órgão federal registrante não homologasse ou alterasse a solicitação de complementação de informações para uso de agrotóxicos em 30 dias. “A anuência tácita abriria possibilidade para a efetiva concessão de registro e comercialização de moléculas que sequer foram avaliadas pelos órgãos brasileiros competentes”, alertou o senador.
Contarato também atendeu apelos feitos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para impedir a flexibilização da atuação desses órgãos na atividade de fiscalização. “O objetivo é garantir as competências e a atuação da Anvisa e do Ibama na homologação e na elaboração de pareceres técnicos apresentados nos pleitos de registro dos produtos, conforme as análises de risco à saúde e ao meio ambiente”, detalhou.
Também houve a retirada do conceito “risco inaceitável”, inserido durante a tramitação na Câmara dos Deputados. Para Contarato, a ausência da clara definição de quais produtos poderiam ser considerados inaceitáveis levaria a um aumento do risco de judicialização e insegurança jurídica quanto à delimitação do termo.
Assim, o projeto passa a determinar a proibição do registro de agrotóxicos ou produtos de controle ambiental quando essas substâncias permanecerem inseguras, de acordo com parâmetros adotados internacionalmente. Exemplos de normas que buscam garantir a segurança sanitária desses produtos citadas pelo senador são o Globally Hamonized System of Classification and Labelling of Chemicals, o Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS) e o Codex Alimentarius.
Fabiano Contarato disse considerar “natural e recomendável” que a legislação que rege a produção, a comercialização e o uso agrotóxicos seja revisada para que possa levar em consideração as transformações ocorridas no setor. Há muitos pedidos de liberação de agrotóxicos em que as moléculas sob análise são muito menos agressivas ao meio ambiente e à saúde do que as que são liberadas e seguem em utilização apenas porque não há outras opções autorizadas.
A atualização, ainda conforme Contarato, é necessária para que possa incorporar melhorias recomendadas pela experiência de mais de três décadas na aplicação da norma atual. Além disso, o senador disse ser fundamental a avaliação criteriosa dos dispositivos aprovados pela Câmara para que se evitem retrocessos em pontos específicos do projeto. “Reiteramos o nosso compromisso de defesa intransigente da saúde humana e da preservação ambiental. O relatório foi entregue com diálogo e foco nos pontos sensíveis diante das limitações regimentais”, enfatizou Contarato.
Construção coletiva
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), elogiou a “coragem” do senador Fabiano Contarato para encabeçar a construção de um acordo que viabilizasse o avanço do projeto ao mesmo tempo em que retirou trechos que promovessem retrocessos na atual legislação. “Ninguém governa sem princípios. Mas ninguém governa também só com seus princípios. E quando você está no ato de governar é preciso buscar a agregação da sua comunidade e não estimular a divisão entre aqueles que devem estar trabalhando juntos pela melhoria da vida do povo brasileiro”, disse.
Wagner também reforçou a necessidade de encontrar um caminho para solucionar essa questão que tramita há mais de duas décadas no Congresso Nacional. “Alguém precisava se movimentar no tabuleiro. Se não a gente ia levar mais 40 [anos] para encontrar uma solução e [esse entrave] estimulando o contrabando, o uso de defensivos mais agressivos. O senador Contarato fez um esforço hercúleo próprio daqueles que tem honestidade intelectual e coragem pessoal”, enfatizou o líder do governo.
(Foto: Reprodução/Twitter)