Henrique Acker (correspondente internacional) – Nos últimos dias, o governo de Israel lançou uma ofensiva militar na Cisjordânia, território governado pela Autoridade Nacional Palestina (ANP). O governo Netanyahu alega que o objetivo seria “combater o terrorismo” em algumas áreas. Os alvos são grupos do Hamas que atuam junto aos acampamentos de refugiados palestinos.
As operações dos militares israelenses contam com o apoio entusiástico dos grupos de colonos sionistas, que atuam sem qualquer limite na Cisjordânia, expulsando palestinos e construindo assentamentos e postos avançados ilegais por toda a região.
A decisão de atacar o território controlado pela ANP consolida a postura do governo de Israel de provocar uma guerra total contra os palestinos e países árabes vizinhos, como o Líbano e a Síria. Ao mesmo tempo, desgasta o governo do Partido Democrata nos EUA, que enfrenta o aliado incondicional de Netanyahu, o republicano Donald Trump, em eleição marcada para novembro deste ano.
Como surgiram e como agem os colonos israelenses
Eles são mais de 700 mil e vivem na Cisjordânia em 146 assentamentos considerados legais e outros 154 postos avançados ilegais, mas tolerados pelo governo de Israel. O movimento de recolonização judaica em terras palestinas sempre existiu, mas cresceu ainda mais depois da Guerra dos Seis Dias (1967).
Algumas das organizações que reivindicam a retomada das terras da Judéia e Samaria, são Hashomer Yosh, Nachala e Herança Judaica. Todos têm em comum o fanatismo religioso e práticas de invasão de terras, expulsão violenta de palestinos e o estabelecimento de assentamentos considerados legais ou ilegais pelo governo de Israel.
Seus métodos intimidatórios lembram as milícias que atuam em áreas largadas à sua própria sorte pelo Estado no Rio de Janeiro. Atuam com ampla liberdade justamente porque contam com o apoio velado dos governantes. No caso israelense, o objetivo é a tomada de terras e residências, das quais os palestinos são expulsos com violência e muitas vezes com o apoio do Estado.
Base da extrema-direita
Os colonos fanáticos judeus são a grande base política e eleitoral dos partidos de extrema-direita israelense, que participam da coligação que sustenta o governo de Benjamin Netanyahu. Por isso, contam com o apoio entusiástico dos ministros Ben-Gvir e Bezalel Smotrich.
As organizações desses colonos atuam livremente e não têm qualquer receio em anunciar seus propósitos. O Projeto Herança Judaica declara que “apesar do mundo ser contra o assentamento judaico nesta terra… é essencial que todo judeu esteja conectado com a terra que é mais central para nossa identidade judaica.”
Na página do Hashomer Yosh na internet, por exemplo, pode-se ler que “… além do apoio via mão de obra, a organização também auxilia fornecendo equipamentos agrícolas e de segurança e respondendo em momentos de emergência.”
Já o Nachala tem como um de seus objetivos a recolonização da Faixa de Gaza. Uma de suas lideranças, Daniella Weiss, tem consciência da ilegalidade das operações do grupo, e afirma sem qualquer receio: “Se Netanyahu realmente quisesse me silenciar, ele poderia, mas não o faz”.
Terrorismo sionista fora de controle
Sobre o ataque de colonos judeus à vila palestina de Jit, no começo de agosto deste ano, que provocou o ataque a moradores, queima de carros e a morte de jovem de 23 anos, o Shin Bet (serviço secreto israelense) forneceu ao exército (IDF) e à polícia informações de que os colonos já estariam planejando “violência nacionalista” antes do incidente. A conclusão do relatório é que o exército deveria ter “operado com mais determinação”. Avi Bluth, chefe do Comando Central da IDF, declarou que o incidente constituiu terrorismo.
O próprio chefe do Shin Bet, alertou os líderes do país que o terrorismo judaico na Cisjordânia está fora de controle e se tornou uma séria ameaça à segurança nacional. Ronen Bar enviou carta ao primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, ao procurador-geral e a membros do gabinete israelense, na qual denuncia as ações do grupo “Jovens do topo da colina”, classificando-as de terrorismo.
“É o uso da violência para criar intimidação, para espalhar o medo. Isso é terror”, escreveu ele, descrevendo como a campanha “se expandiu significativamente” na ausência de uma resposta policial adequada e com a conivência de alguns líderes nacionais.
De acordo com relato do Departamento de Estado dos EUA, um dos líderes do Hashomer Yosh liderou em fevereiro (2024) “um grupo de colonos armados para montar bloqueios de estradas e conduzir patrulhas para perseguir e atacar palestinos em suas terras e expulsá-los à força de suas terras”.
Anistia Internacional denuncia regime de Apartheid
Em relatório publicado em 2022, A Anistia Internacional (AI) classifica o Estado de Israel como um regime de apartheid contra os palestinos, qualificado como um crime contra a humanidade, “uma grave violação de direitos humanos proibida pelo direito internacional público”.
“Esta extensa investigação e análise legal da Anistia Internacional, realizada em consulta com peritos externos, demonstra que o Estado de Israel aplica este mesmo sistema contra a população palestina através de leis, políticas e práticas que confirmam o seu tratamento discriminatório prolongado e cruel”, conclui o relatório da AI.
As conclusões do relatório da Anistia Internacional partem de um trabalho crescente de ONG palestinas, israelitas e internacionais, que têm aplicado progressivamente o quadro de apartheid à situação em Israel e/ou nos Territórios Palestinos Ocupados (Cisjordânia e Gaza).
Tribunal de Haia fala em ilegalidade na ocupação da Cisjordânia
Em parecer emitido em 19 de julho de 2024, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), conhecido como Tribunal de Haia, defendeu o fim dos assentamentos israelenses e o pagamento de indenizações a palestinos. A decisão atende a um processo aberto em 2022, portanto antes do conflito em Gaza, iniciado a partir de outubro de 2023.
O parecer sustenta ainda que o Conselho de Segurança e a Assembleia Geral da ONU, bem como todos os países-membros da entidade internacional, têm a obrigação de não reconhecer a ocupação israelense da Cisjordânia como legal e não apoiar a sua manutenção.
Em resposta, Benjamin Netanyahu declarou no X que “Nenhuma falsa decisão em Haia vai distorcer a verdade histórica, nem a legalidade dos assentamentos israelenses em todos os territórios de nossa pátria pode ser contestada.”
Em resposta à política de anexação de territórios palestinos, dois jornais judeus ultraortodoxos Yated Ne’eman e Haderech condenaram como profanações as provocações do ministro Ben-Gvir em lugares sagrados para os muçulmanos.
Terra arrasada e diáspora palestina
A Cisjordânia é a parte que resta do território palestino, apesar de não ser reconhecido como um país. O território de apenas 5.860 km², é separado da região controlada por Israel por um Muro de 800 km, apelidado de “Cerca de Segurança” pelos sionistas.
Na Cisjordânia vivem cerca de três milhões de palestinos, obrigados a passar todos os dias por cerca de 500 postos de controle da segurança israelense. Dois milhões e 100 mil palestinos vivem em Gaza e outros cerca de seis milhões em países vizinhos e espalhados pelo Mundo.
Desde o ataque do Hamas, em 7 de outubro de 2023, as incursões militares de Israel em Gaza já provocaram mais de 40 mil mortes e 90 mil feridos. Também na Cisjordânia intensificaram-se as atividades militares e de colonos paramilitares israelenses, provocando cerca de 650 mortes e prisões de milhares de palestinos. (Foto: Reprodução – Mapa da Cisjordânia, junto com a Faixa de Gaza)
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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