Lisboa (Henrique Acker ) – A vitória eleitoral conquistada pelo Partido Socialista, no final de 2021, lhe conferiu maioria absoluta no parlamento e permitiu formar um governo de um só partido. O PS arrastou para si os votos de parte do eleitorado da esquerda (Bloco de Esquerda e PCP), amedrontado com a ameaça de uma vitória do PSD.
Em vez de retomar o diálogo com a esquerda e um programa semelhante ao da “geringonça” (2015/2019), com medidas efetivas de socorro aos mais pobres diante do crescimento da inflação (cerca de 10% ao ano), António Costa e seu partido decidiram dar as costas para os problemas concretos da vida dos portugueses.
Assim, os hospitais estão enfrentando a falta de profissionais e de equipamentos, piorando o atendimento de urgência, as escolas seguem com falta de professores e salários baixos, o salário mínimo (agora em 760 €) está muito abaixo das necessidades de uma família, a casa própria cada vez mais distante e os aluguéis consumindo grande parte dos salários, além de um mercado de trabalho onde o que mais cresce é o serviço temporário, em condições precárias.
Não por acaso profissionais da Educação, ferroviários e outras categorias voltaram a paralisar suas atividades neste final de ano, exigindo melhores salários e condições de trabalho. Sem falar na penúria de milhões de portugueses aposentados, com ganhos médios de cerca de meio salário-mínimo.
Para piorar, o primeiro-ministro António Costa não contém as disputas internas, a incapacidade e a gula de alguns dos membros de seu governo. Já são 11 demissões de ministros e secretários envolvidos em escândalos em apenas nove meses de mandato. As mais recentes ligadas ao caso da indenização da ex-secretária Alexandra Reis, que fora agraciada com 500€ mil quando pediu para sair da TAP, empresa pública que vem sendo esvaziada rumo a uma nova privatização.
Enquanto isso, na vizinha Espanha, o PS e seus aliados de esquerda tomam medidas concretas para abrandar os efeitos da crise sobre os mais pobres. As de maior impacto são a recente suspensão do IVA sobre gêneros alimentícios de primeira necessidade e o congelamento do preço das rendas.
A crise do governo da maioria absoluta do PS, em Portugal, não é apenas consequência dos efeitos da guerra na Ucrânia, que todos os países membros da União Européia decidiram bancar, subordinando-se aos interesses dos EUA/OTAN e da indústria armamentista. É também resultado das escolhas políticas ao centro e da autossuficiência dos que acreditam poder governar só com seus pares.
A seguir aprofundando sua postura de ignorar o sofrimento dos trabalhadores, os aposentados e os mais pobres, adotando medidas tímidas e fazendo propaganda de um Portugal que não existe, o Partido Socialista vai ressuscitar o PSD nas próximas eleições. E o pior, provavelmente com uma maioria que poderá ser formada em aliança com a extrema-direita e a direita liberal.
Na foto, o primeiro ministro António Costa em atividade de campanha do Partido Socialista | Reprodução/Instagram
Henrique Acker é jornalista e correspondente internacional