Novo conflito entre Israel e palestinos põe o Oriente Médio sob tensão

Henrique Acker (corresponde internacional)Ataques coordenados pelo grupo Hamas, que causaram pânico e um banho de sangue em cidades israelenses, foram lançados em 7 de outubro, por céu e terra. Uma chuva de dois a cinco mil foguetes e a incursão de centenas de grupos armados motorizados surpreenderam as populações de pequenas cidades nos territórios ocupados, ao Sul de Israel.

Até às 16 horas (horário local) de terça-feira, 9 de outubro, as informações davam conta de 1.350 mortos, sendo 800 israelenses e 550 palestinos, além de 2.500 feridos em Israel e 2.900 na Faixa de Gaza. Num desses ataques do Hamas, 260 pessoas que participavam de uma Festa Have foram mortas. Há notícias de que centenas de civis e militares israelenses sequestrados e levados para a Faixa de Gaza.

A ofensiva do Hamas contou com lança-foguetes de larga escala, drones operacionais de precisão e baixo custo, além de mísseis antiaéreos. A organização, as armas usadas e o método de ataque lembram operações militares que vêm sendo executadas na guerra da Ucrânia, a chamada “guerra híbrida”, com armas mais leves e deslocamentos de combatentes em pequenos grupos.

 

Banhos de sangue

A retaliação do governo israelense veio logo a seguir, com uma declaração do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu de que o país está em guerra contra o Hamas e que o “inimigo pagará um preço que nunca conheceu”. Teme-se que a operação militar israelense possa dificultar a negociação e troca de prisioneiros entre os dois lados.

Para levar a cabo as operações contra o Hamas, o governo de Israel decretou o corte do fornecimento de água e energia elétrica em toda a Faixa de Gaza. O estreito território de 41 quilômetros de extensão por até 12 quilômetros de largura concentra cerca de 2,3 milhões de palestinos.

Foram convocados cerca de 300 mil reservistas do Exército de Israel e grande parte dos tanques e carros de combate deslocados para o Sul do país. De acordo com o governo israelense, mais de 500 ataques aéreos foram lançados contra alvos do Hamas na Faixa de Gaza. Segundo fontes palestinas, os bombardeios atingiram prédios residenciais, causando a morte de civis.

 

Por que “Tempestade Al Aqsa”

O 6 de outubro marca o início da Guerra do Yom Kippur, entre árabes e israelenses, ocorrida em 1973, que durou vinte dias. Na ocasião, egípcios e sírios se levantaram em resposta à linha de fortificações construída na região do Canal de Suez, para garantir a proteção dos territórios conquistados por Israel na Guerra dos Seis Dias, em 1967.

Foi precisamente esta a data escolhida pelo Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) para lançar a Operação Tempestade Al Aqsa, que vem a ser uma Mesquita sagrada, em Jerusalém. Provavelmente o nome da ofensiva do Hamas seja uma resposta ao desrespeito praticado por judeus radicais, que nas últimas semanas passaram a invadir a Esplanada das Mesquitas e profanar o terceiro templo mais importante para os muçulmanos, com a cobertura de tropas israelenses.

 

Surpresa em Israel

Os ataques foram recebidos com surpresa e estranheza por parte da opinião pública israelense, visto que a segurança do país é uma das principais bandeiras do atual primeiro-ministro e seus aliados de extrema-direita. Não se consegue entender como o Mossad, serviço secreto tido como um dos mais eficazes do Mundo, não detectou com antecedência a preparação da ofensiva do Hamas.

O governo foi duramente criticado pelo Haaretz, um dos mais conceituados órgãos de imprensa de Israel. “O desastre que se abateu sobre Israel no feriado de Simchat Torá é de clara responsabilidade de uma pessoa: Benjamin Netanyahu”, diz o primeiro parágrafo do editorial do jornal.

Segue o editorial: “O primeiro-ministro, que se orgulha de sua vasta experiência política e de sua insubstituível sabedoria em questões de segurança, não conseguiu identificar os perigos para os quais estava conscientemente conduzindo Israel ao estabelecer um governo de anexação e desapropriação, ao nomear Bezalel Smotrich (atual ministro das Finanças de Israel, de extrema-direita)  e Itamar Ben-Gvir (ministro da Segurança Nacional de Israel, do partido de extrema-direita Otzma Yehudit) para cargos importantes e ao adotar uma política externa que ignorava abertamente a existência e os direitos dos palestinos.”

 

Manobra de Netanyahu?

Há quem associe o ocorrido à tentativa de Netanyahu e seus aliados de extrema-direita em neutralizar a onda de manifestações populares contra seu governo, que se arrasta desde janeiro. Algumas lideranças da oposição moderada já se dispuseram a participar de uma espécie de governo de união nacional, até que se consiga debelar o conflito.

No entanto, há vozes divergentes. “Condenamos e nos opomos a qualquer ataque a civis inocentes. Mas, em contraste com o governo israelense, isso significa que também nos opomos a qualquer ataque a civis palestinos, disse Ofer Cassif, deputado do partido de esquerda Hadash.

“O governo israelense, que é um governo fascista, apoia, incentiva e lidera pogroms(*) contra os palestinos. Há uma limpeza étnica acontecendo. Era óbvio que a escrita estava na parede, escrita no sangue dos palestinos – e infelizmente agora dos israelenses também”, acrescentando que “a única maneira de parar o derramamento de sangue de ambos os povos é acabar com a ocupação”.

“A única coisa com a qual Netanyahu se preocupa não é o bem-estar dos cidadãos de Israel, muito menos dos palestinos nos territórios ocupados”, afirma Cassif. “Ele está interessado em sobreviver. Ele só quer ficar fora da prisão. Essa é a única motivação que o impulsiona.”

 

Sem acordo na ONU

Convocado para debater o tema 24 horas depois da ofensiva do Hamas, o Conselho de Segurança da ONU – atualmente presidido pelo Brasil – só conseguiu chegar a uma unanimidade: a condenação de ataques e mortes de civis de ambos os lados.

Não está descartada a hipótese de nova reunião do Conselho. Como a reunião foi a portas fechadas, os meios de comunicação informam apenas que haveria articulações para que se alcance uma resolução que condene a ofensiva do Hamas. As declarações dos representantes dos membros do Conselho foram as mais objetivas possível, para evitar mal entendidos.

Sob suspeição de estar por trás do fornecimento de armas e treinamento de pessoal, o governo do Irã reafirmou o compromisso com a causa palestina, mas negou participação na ofensiva do Hamas. Quando fechávamos esta matéria, o Exército de Israel anunciou que estava atacando combatentes do Hezbollah (Partido de Alá) ao Sul do Líbano.

 

Governo brasileiro pede negociações de paz

Em comunicado emitido em 7 de outubro, o governo brasileiro condena a série de bombardeios e ataques terrestres realizados em Israel e expressa condolências aos familiares das vítimas e manifesta sua solidariedade ao povo de Israel. Diz ainda a nota, que o governo brasileiro “exorta todas as partes a exercerem máxima contenção a fim de evitar a escalada da situação.”

Finalmente, o comunicado reforça que “o governo brasileiro reitera seu compromisso com a solução de dois Estados, com Palestina e Israel convivendo em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas. Reafirma, ainda, que a mera gestão do conflito não constitui alternativa viável para o encaminhamento da questão israelo-palestina, sendo urgente a retomada das negociações de paz.”

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(*) Progroms – O termo pogrom tem múltiplos significados, mais frequentemente atribuída à perseguição deliberada de um grupo étnico ou religioso, aprovado ou tolerado pelas autoridades locais, sendo um ataque violento massivo, com a destruição simultânea do seu ambiente. (Wikipedia)

 

Por Henrique Acker (correspondente internacional)

(Foto: : ANAS BABA/Getty Images )

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