Mulheres disputam espaço com agronegócio no campo

Bia Cardoso  – Quem são as mulheres que dirigem quase 1 milhão de propriedades rurais no Brasil?

São Joanas, Marias, Teresas, mulheres espalhadas nas quatro regiões do país, que tentam fazer do campo um ambiente menos concentrado, mais produtivo, mais feminino, por meio da agricultura familiar.

Elas trazem a ideia de um Brasil da partilha, que celebra o bem comum.

Segundo o último Censo Agropecuário divulgado pelo IBGE, em 2017, nos 5,7 milhões de estabelecimentos rurais do país, os homens ainda são maioria. Eles dirigem 4,1 milhões de propriedades contra 947 mil em poder das mulheres.

A concentração tem explicações históricas, diretamente ligadas à forma de obtenção da terra: por herança dos pais, normalmente repassada aos homens e também por meio de aquisição.

As mulheres têm papel essencial nos sistemas alimentares e no combate à fome. No entanto, não tem poder igual ao dos homens.

Elas representam 40% da força de trabalho no campo. Mas são as que menos tem acesso à terra. Apesar dos avanços, não chega a 10% o percentual de mulheres  proprietárias das áreas onde plantam e colhem .

Nos 30 milhões de hectares que possuem, ou seja, quase 8,5 % da área total ocupada por estabelecimentos rurais no Brasil, elas se empenham para colocar em prática conceitos como a agroecologia, modelo de agricultura alternativa baseada na integração.

Plantam em pequenos lotes, no quintal de casa, cultivam horta embaixo de floresta, vivem do extrativismo, da pesca. Essa biodiversidade possibilita diversas atividades que incluem cada vez mais a mulheres no mundo rural e reafirmam a perspectiva de produzir em família.

 

Luta das mulheres

 

São muitas as histórias inspiradoras nesse universo.

No Norte do Brasil, no município de Itupiranga (PA), Maria Eunice  – foto acima -,  usa sementes para plantar em vazantes. Ela vive as margens de um dos maiores rios da Amazônia Oriental: o Rio Tocantins. Cultiva maxixe, melancia, feijão e arroz. Integra o amplo universo das cadeias produtivas da Floresta Amazônica paraense.

Eunice lidera um grupo de comunidades tradicionais numa área de grande confusão fundiária por onde irá passar a Hidrovia do Araguaia Tocantins, projeto do Governo Federal para dinamizar o escoamento da soja produzida no Centro Oeste brasileiro, que irá impactar comunidades ribeirinhas que vivem nesse eixo.

Maria Eunice faz o trabalho doméstico de organizar mulheres na luta pelo direito à terra.

Dialoga com quebradeiras de coco, discute a cadeia produtiva do babaçu, do peixe, da agricultura de vazante, mas percebe uma resistência velada ao papel que cumpre.  “Tem muitas mulheres que não entendem que o mundo mudou. Eu sei que hoje, se votamos com liberdade, se conquistamos o direito de participar da política, de ter nosso pedaço de chão, de falar o que pensamos, foi por causa de uma luta que travamos de maneira coletiva”, afirma.

 

Agronegócio x Agricultura Familiar

Thaísa Daiane, agricultora familiar e Secretária da Contag.

O mapa do IBGE aponta as regiões do Brasil onde as mulheres têm mais acesso à terra.

O Nordeste desponta com 57% das mulheres dirigindo propriedades rurais. Em seguida vem o Sudeste com 14%. Os dados revelam que onde o agronegócio tem força, a mulher ocupa menos espaço.  O Norte responde apenas por 12%, seguido do Sul com 11% e o Centro-Oeste que concentra apenas 6% de mulheres com propriedades rurais.

Para Thaisa Daiane, agricultora familiar de Jaraguari ( MS)  – foto acima -,  atual   Secretária Geral da CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), os desafios  no campo são muitos, mas não maiores que  a esperança de um país mais justo.  “Nós, mulheres do campo, precisamos nos manter organizadas, dialogando com o Congresso Nacional, com o Governo Federal, resistindo no campo da democracia e da justiça”.

Thaísa tem a clareza de que, diante desse novo cenário político, com a posse do governo Lula, isso é possível, e vai além: “estamos articuladas no debate da democracia e da soberania popular indicando caminhos que possam superar as desigualdades sociais no Brasil”.

Maria Eunice é contundente: “nós não podemos fazer outra coisa senão ser otimistas e fazer o que prega aquela música que diz, levanta, sacode a poeira e dá volta por cima. Um chamado a todas as mulheres, não só para vencer, mas vencer com grandeza”.

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