Jornalista e cronista político morreu aos 92 anos. Nery teve mandato como deputado estadual da Bahia cassado pela ditadura e atuou na criação do PDT
O jornalista Sebastião Nery faleceu na madrugada desta segunda-feira (23), aos 92 anos, no Rio de Janeiro. Considerado um dos maiores cronistas e analistas políticos do país, Nery estava muito debilitado por causa da idade, que se agravou nos últimos quatro meses. Ele morreu de causas naturais. Viúvo, Nery deixa três filhos. A cerimônia de cremação ocorrerá nesta terça-feira (24), das 8h às 10h, no Cerimonial do Carmo, bairro do Caju, no Rio de Janeiro.
Baiano de Jaguaquara (BA), Sebastião Nery teve mais de 15 obras publicadas. Nery nasceu em 8 de março de 1932, mas deixou a cidade natal para frequentar seminário em Amargosa (BA). Na década de 1950, ele se muda para Minas Gerais, onde inicia a carreira como jornalista. Na juventude, formou-se em filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais e em direito pela Universidade Federal da Bahia.
A sua trajetória política também se inicia nesta época. Em 1954 disputou as eleições para a Câmara Municipal pelo PSB. Foi eleito, mas sua candidatura foi impugnada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, que alegou que ele representava o então clandestino Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Foi enviado em 1957 pelo Partido Comunista para Moscou, na União Soviética, para participar do Festival Internacional da Juventude. Ao voltar ao Brasil, retornou para Salvador, onde trabalhou nos jornais A Tarde e Jornal da Bahia e foi um dos fundadores do Jornal da Semana.
Voltou à política em 1962, quando foi eleito deputado estadual na Bahia pelo Movimento Trabalhista Renovador (MTR). Exerceu o mandato por pouco mais de um ano até ser preso em 31 de março de 1964, dia em que eclodiu o golpe militar. Foi cassado pela Assembleia Legislativa em 28 de abril.
Deixou a cadeia em agosto de 1964 e conseguiu reassumir o mandato após decisão do Tribunal de Justiça da Bahia. Mas voltaria a ser cassado em dezembro e teria os direitos políticos suspensos em 1965. Foi absolvido pelo Superior Tribunal Militar, mas não conseguiu retomar o mandato.
Deixou a Bahia para trabalhar no Rio de Janeiro, onde atuou no Diário Carioca, TV Globo, Tribuna da Imprensa e Correio da Manhã. Foi processado com base na Lei de Segurança Nacional em 1972 após associar o então o primeiro-ministro de Portugal, Marcelo Caetano, a Adolf Hitler e Benito Mussolini, mas acabou sendo absolvido.
A partir de 1975, passou a assinar coluna Contraponto, no jornal Folha de São Paulo, na qual se destacou por contar bastidores e casos folclóricos da política brasileira. Permaneceu no jornal até 1983. Na mesma época, também atuou em um programa de comentários políticos na TV Bandeirantes e publicou os quatro livros da série Folclore Político, com crônicas e histórias da política nacional.
Voltou a ter uma atuação política em 1979, quando sob a liderança de Leonel Brizola tentou refundar o PTB. A legenda acabou ficando nas mãos de Ivete Vargas e Nery se uniu a Brizola na fundação do PDT. Foi secretário da executiva nacional do partido.
Em 1982, foi eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro com 111.460 votos na mesma eleição em que Brizola foi eleito governador. Na Câmara dos Deputados, foi relator da CPI que investigou o endividamento externo brasileiro e foi um dos parlamentares favoráveis à derrota da emenda Dante de Oliveira, que previa o retorno das eleições diretas para presidente.
Foi expulso do PDT em 1985 após divergências com Brizola. Filiou-se ao MDB e foi candidato a vice-prefeito do Rio em 1985 na chapa encabeçada por Rubem Medina, do PFL. Ambos foram derrotados. Concorreu a um novo mandato na Câmara no ano seguinte, mas não foi reeleito.
Nas eleições presidenciais de 1989, foi um dos assessores de Fernando Collor de Melo. Após a vitória do alagoano nas urnas, foi nomeado adido cultural em Roma e em Paris. Afastado dos mandatos eletivos, voltou a atuar no jornalismo como colunista da Tribuna da Imprensa.
Em sua trajetória como jornalista, escreveu livros como “Sepulcro Caiado: O Verdadeiro Juraci”, “Socialismo com Liberdade”, “16 Derrotas que Abalaram o Brasil”, “A História da Vitória: Porque Collor Ganhou” e “A Eleição da Reeleição”. Em 2010, recontou a sua trajetória no livro “A Nuvem”, lançado pela Geração Editorial. Quatro anos depois, lançou o livro “Ninguém Me Contou, Eu Vi”, com histórias de seis décadas da política brasileira, entre os governos Getúlio Vargas e Dilma Rousseff.
(Foto: Reproidução)