Moraes condena por 17 anos de prisão o primeiro réu dos atos golpistas

Primeiros julgamentos ocorrem oito meses depois dos atos golpistas; PGR pediu punição exemplar para os executores das depredações, e expectativa no STF é que julgamento seja simbólico. Ministro Nunes Marques, das ações penais, discordou do voto de Moraes e defendeu pena de dois anos e seis meses em regime aberto.

 

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes votou pela condenação do primeiro réu julgado pelos atos golpistas do 8 de janeiro, Aécio Lúcio Pereira, e defendeu uma pena de 17 anos, sendo 15 anos e seis meses em regime fechado e 1 anos e quatro meses em regime aberto, além de multa. Aécio Lúcio Lopes Costa Pereira aparece em imagens do dia dos ataques dentro do plenário do Senado Federal e na área externa da Suprema Corte.

Em seu voto, o magistrado afirmou que “está muito claro” que os ataques cometidos contra as sedes dos Três Poderes ocorreram com o intuito de derrubar o governo democraticamente eleito em 2022. O STF iniciou na manhã desta quarta-feira (13) os primeiros julgamentos que podem resultar na condenação de quatro pessoas. “Consideradas as penas, fixo a pena inicial do réu em 17 anos. Sendo 15 anos e 6 meses de reclusão e 1 ano e seis meses de detenção”,  proclamou.

No entanto, a condenação ainda deverá ser analisada pelos demais ministros, que poderão ou não acompanhar a pena proposta pelo relator. Ao analisar o caso de Pereira, Moraes entendeu que ele cometeu os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural e associação criminosa.

“Essa turba, de forma violenta, passou a destruir o patrimônio público, o Congresso, o STF, com maior violência, e o Palácio do Planalto. Está muito claro nas próprias mensagens que vários deles postaram: com o intuito de derrubar o governo democraticamente eleito em 2022 e que havia tomado posse em janeiro de 2023, pleiteando uma intervenção militar”, afirmou o ministro.

Moraes explicou os fundamentos do chamado “crime multitudinário”, praticado por multidões, como forma de demonstrar a participação e autoria de Pereira, o primeiro a ser julgado pela Corte. Imagens das invasões aos prédios do Congresso e do STF foram exibidas durante o voto do ministro, que rebateu os argumentos de que os atos de 8 de janeiro tinham uma finalidade “pacífica”. “Não há nada de pacífico nestes atos, são atos criminosos, atos antidemocráticos, que realmente estarreceram a sociedade”, disse.

Ao falar sobre quais eram as intenções da “turba golpista”, que almejava uma intervenção militar, Moraes defendeu a posição institucional do Exército. “O Exército brasileiro não aderiu a esse devaneio golpista, defendido inclusive por vários políticos que estão sendo investigados”, apontou.

Aécio foi empregado por mais de 20 anos da Companhia de Saneamento Ambiental de São Paulo (Sabesp). Durante a invasão, ele teria enviado imagens pelas redes sociais, citando a Sabesp, incitando que as pessoas saíssem às ruas para forçar a decretação de uma GLO (Garantia da lei e da Ordem), supostamente para permitir uma intervenção militar.

“Armados com pedaços de ferro, pedaços de pau, destruindo o patrimônio público, não há nada pacífico nestes atos. São atos criminosos, antidemocráticos e que realmente estarreceram a sociedade brasileira. A versão mentirosa de vários depoimentos de que várias portas do Senado estavam abertas. Várias câmeras foram depredadas também”, disse Moraes.

O magistrado destacou que o fato da tentativa de golpe não ter sido bem-sucedida não faz com que os crimes não tenham ocorrido. “Várias pessoas defendendo que este crime não ocorreu porque não conseguiram dar um golpe de Estado. Não existe crime de golpe de Estado, pois se tivesse golpe de Estado, não estaríamos aqui. Quem dá golpe, não é julgado. Por isso, as elementares do crime são claras, tentar depor”, completou Moraes.

Moraes rebateu a defesa de Pereira, que pediu que o julgamento fosse suspenso e que o tribunal reconhecesse que os casos deveriam ser analisados na primeira instância. Ele também criticou o “terraplanismo” e o “negacionismo” dos que tentam minimizar os ataques às instituições. “Às vezes o terraplanismo e o negacionismo de algumas pessoas faz parecer que no dia 8 de janeiro tivemos um domingo no parque. Então as pessoas vieram, pegaram um tíquete, entraram numa fila, assim como fazem no Hopi Hari, na Disney. ‘Agora vamos invadir o Supremo, agora o Palácio do Planalto. Agora vamos orar na cadeira do presidente do Senado’, ironizou o ministro.

Ele frisou, em seguida, que houve “mais de mil acórdãos que reconhecem a competência” do STF para julgar os réus acusados de participar do 8 de janeiro, mesmo que não tenham foro privilegiado. O ministro se referiu às decisões colegiadas que receberam as denúncias da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os envolvidos nos atos golpistas. No início do julgamento nesta manhã, Moraes mencionou que o prejuízo estimado pelos estragos causados no dia 8 de janeiro foi superior a R$ 15 milhões. Ao ler o relatório sobre a primeira ação penal analisada, o magistrado elencou os valores calculados após a invasão dos prédios.

“O prejuízo inicialmente estimado, e sem contar os danos incalculáveis a bens da União, foi de R$ 3,5 milhões no Senado Federal e R$ 3,039 milhões na Câmara dos Deputados. No Palácio do Planalto, os danos ultrapassam o valor de R$ 9 milhões apenas com obras de arte. No Supremo Tribunal Federal, ainda não há prejuízo estimado. Todos os valores serão aferidos”, disse ele.

Moraes relembrou a destruição causada pelos radicais, que, segundo ele, estavam “possuídos de ódio irracional, quase patológico” e, “imbuídos de ousadia, ignorância, destroçaram bens públicos sujeitos a proteção especial, tombados pelo patrimônio histórico, como mobiliário, tapetes e obras de arte”. “Mas advirto: não destruíram o espírito da democracia. Não foram nem jamais serão capazes de subvertê-lo, porque o sentimento de respeito pela ordem democrática continua, e continuará a iluminar as mentes e corações desta Corte Suprema, que farão prevalecer sempre os fundamentos éticos e políticos que informam e dão sustentação ao Estado Democrático de Direito”, completou o ministro.

Voto do revisor

A sessão foi encerrada às 18h pela presidente da Corte, Rosa Weber, que anunciou a retomada do julgamento para esta quinta-feira (14). O encerramento foi após o voto do revisor das ações penais, o ministro Nunes Marques, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que discordou de Moraes. “As lamentáveis cenas do dia 8 de janeiro, apesar da gravidade e do vandalismo, não tiveram o alcance de abolir o estado democrático de direito”, afirmou no inicio do seu voto.

Nunes Marques votou para condenar Aécio Lúcio Pereira por dano qualificado e por deterioração de patrimônio. A pena, pelo voto de Nunes Marques seria de dois anos e seis meses em regime aberto.

 

(Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles)

 

 

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