Milhares de indígenas marcham pela Esplanada com cobranças a Lula, Congresso e STF

Nos 20 anos do Acampamento Terra Livre (ATL), indígenas listaram reivindicações aos Três Poderes. “Nossos direitos não podem ser negociados”, afirmam os povos

 

Povos indígenas de todo o País, reunidos em Brasília, nesta semana, durante a 20ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL), escreveram uma carta com uma lista de reivindicações aos Três Poderes. O documento por demarcações de terras e compromisso com a proteção dos direitos deverá ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), aos parlamentares do Congresso Nacional e aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

O ATL começou na segunda-feira (22) e vai até sexta-feira (26), com o tema “Nosso marco é ancestral, sempre estivemos aqui”. Na manhã, milhares de indígenas e apoiadores tomaram as ruas da Esplanada dos Ministérios em uma caminhada em direção a Praça dos Três Poderes. Segundo dirigentes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entidade organizadora do acampamento, cerca de oito mil representantes de mais de 200 etnias participaram da marcha, além de integrantes de organizações sul e centro-americanas e da Indonésia, superando os resultados anteriores.

“Ao marcar os vinte anos de luta e resistência do Acampamento Terra Livre, a maior manifestação indígena do Brasil, redigimos esta carta no contexto de um momento crucial para os povos indígenas do Brasil. Apesar da recente mudança de governo, as ameaças aos nossos territórios, culturas e direitos persistem, reforçadas pelo contexto do ano mais quente já registrado na história, evidenciando a contínua emergência indígena. Seguimos afirmando a urgência para as demarcações de nossas terras”, diz a carta.

Portando faixas e cartazes, os participantes deixaram o acampamento montado no Eixo Monumental, ao lado do Centro Ibero-Americano de Culturas (antigo Complexo Cultural da Funarte) por volta das 9 horas da manhã. Muitos dos participantes exibiam pinturas corporais e usavam adereços tradicionais característicos de seus povos, mas, por força de um acordo com autoridades de segurança pública do Distrito Federal, foram orientados a não portarem lanças, bordunas e arcos e flechas durante a marcha.

“Esta é uma marcha de luta, de resistência, para reivindicarmos ao governo brasileiro, ao Estado, aos Três Poderes [Executivo, Legislativo e Judiciário], que avance em nossos direitos. Principalmente em relação à demarcação das terras indígenas”, disse Kleber Karipuna, um dos coordenadores-executivos da Apib, durante a caminhada.

Os manifestantes se aproximaram do Congresso Nacional pouco depois das 10h30 e ocuparam o gramado central do Eixo Monumental, onde se espalharam para acompanhar a transmissão da cerimônia que a Câmara dos Deputados realiza esta manhã, em homenagem aos 20 anos do Acampamento Terra Livre.

 

Os manifestantes se aproximaram do Congresso Nacional por volta das 10h30 desta terça-feira (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

 

Os indígenas criticaram uma fala recente de Lula, que anunciou a demarcação de apenas duas das seis terras esperadas. Na última quinta-feira (18), o presidente afirmou que alguns territórios estão ocupados e governadores “pediram mais tempo” para resolver onde vão destinar essas pessoas (fazendeiros e trabalhadores rurais) “sem violência”.

“Mas e o nosso tempo, os tempos dos povos indígenas? Nosso tempo é agora, urgente e inadiável. Enquanto se discute marcos temporais e se concede mais tempo aos políticos, nossas terras e territórios continuam sob ameaça, nossas vidas e culturas em risco e nossas comunidades em constante luta pela sobrevivência. Não podemos simplesmente dar um tempo enquanto nossos direitos fundamentais estão sendo negligenciados. O tempo que queremos é o tempo de ação imediata, onde cada segundo conta para honrarmos nossa ancestralidade e para proteger o futuro de nossas gerações e da humanidade”, afirma a manifestação dos povos indígenas.

No âmbito do Acampamento Terra Livre, os indígenas cobram do Poder Executivo a demarcação imediata das Terras Indígenas Morro dos Cavalos (SC), Toldo Imbu (SC), Xucuru Kariri (AL) e Potiguara de Monte-Mor (PB) — anunciadas entre as terras indígenas que seriam homologadas nos primeiros 100 dias de mandato. Além disso, os povos também reivindicam a finalização do processo de demarcação de 23 Terras Indígenas, cujos processos administrativos aguardam apenas a portaria declaratória, e que estão na relação enviada pelo Ministério dos Povos Indígenas ao Ministério da Justiça.

A carta especial da 20ª edição do ATL também pede o fortalecimento do Ministério dos Povos Indígenas, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas e da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai). Também foram feitas as seguintes reivindicações: criar a Secretaria Específica para a Educação Escolar Indígena, no âmbito do Ministério da Educação; introduzir o ensino médio e técnico profissionalizante nas escolas indígenas; fomentar a sustentabilidade econômica dos territórios, estimulando e financiando as múltiplas formas de produção indígena; e impulsionar a descarbonização da matriz energética brasileira, com incentivo às energias renováveis que previnam e reparem danos socioambientais.

Ao Congresso Nacional, os indígenas pedem a retirada de tramitação e arquivamento definitivo das Propostas de Emenda a Constituição (PEC) que “desconstitucionalizam” os direitos indígenas e a ratificação do Acordo de Escazú pelo Estado brasileiro, para comprometer o país internacionalmente com a defesa do meio ambiente e de seus defensores e aumentar a transparência e a participação social na tomada de decisões ambientais e climáticas.

Já ao STF, os povos solicitam a declaração imediata da inconstitucionalidade da Lei no 14.701/2023, para conter as violências contra os povos indígenas, reafirmando o direito originário e excluindo a aplicação da tese do marco temporal, a regulamentação da consulta em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reconheceu o direito de candidaturas indígenas a reserva de fundos e de propaganda partidária, além de garantir o acesso à justiça dos povos indígenas, por meio da obrigatoriedade de atuação de intérpretes de línguas maternas e da elaboração de laudo antropológico.

(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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