Aguardando a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR) referente a uma alegada conspiração golpista, o tenente-coronel Mauro Cid está preocupado com a possibilidade de o sigilo de sua colaboração premiada ser revelado. Os testemunhos do ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL) foram essenciais para o desenrolar da investigação.
Apesar de algumas partes da colaboração terem sido divulgadas nos relatórios da Polícia Federal (PF), a maior parte das informações ainda permanece sob sigilo judicial.
A inquietação do ex-ajudante de ordens, conforme investigado pela CNN, refere-se ao nível de visibilidade que suas declarações à Polícia Federal acerca da suposta conspiração golpista envolvendo Bolsonaro, membros de seu governo e apoiadores, estão recebendo. Mauro Cid já forneceu mais de dez testemunhos.
O pacto de colaboração premiada foi validado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 9 de setembro de 2023. Com a formalização do acordo, o ex-assistente de ordens de Bolsonaro foi liberado da detenção. Ele estava encarcerado desde 3 de maio daquele ano, após ser investigado por suspeita de ter inserido informações falsas nos registros de vacinação do ex-presidente.
No relato inicial da colaboração, o ex-assessor mencionou nove dos 40 investigados pela Polícia Federal por uma alegada tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
De acordo com o antigo ajudante de ordens, após a conquista de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), três facções se formaram ao redor de Bolsonaro.
Segundo Mauro Cid, o primeiro grupo era composto por “conservadores” que seguiam uma determinada ideologia política. O objetivo desse grupo era moldar Bolsonaro como um “importante líder da oposição”. Entre seus membros estariam o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Bruno Bianco, que foi advogado-geral da União.
Existiam também os “moderados”, que expressavam desaprovação em relação “às injustiças” presentes no Brasil, mas não apoiavam uma ação drástica. “Acreditavam que nada poderia ser alterado em relação ao resultado das eleições; qualquer movimento contrário seria considerado um golpe”, relata Cid. Entre os envolvidos estavam o general Freire Gomes, que era o comandante do Exército, e o general Paulo Sérgio Nogueira, que ocupava o cargo de ministro da Defesa.
O terceiro grupo, conforme indicado na delação, era formado por “extremistas”, que se dividia em duas vertentes: uma que defendia a investigação de uma alegada fraude nas urnas, e outra que apoiava a criação de um braço militar. De acordo com o relatório, entre os envolvidos estavam o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, e o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello.
Cid menciona também que, entre os integrantes da facção mais extremista que dialogava “frequentemente com o ex-Presidente, incentivando-o a realizar um golpe de Estado“, estavam a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
O ex-assistente de ordens, em duas ocasiões, enfrentou a possibilidade de perder os benefícios da colaboração premiada. Em março de 2024, Mauro Cid esteve em situação de vulnerabilidade em relação à sua delação, após a divulgação de gravações nas quais ele faz críticas a Alexandre de Moraes e à Polícia Federal.
Depois de depor a Moraes no dia 22 daquele mês sobre a divulgação dos áudios publicados pela revista “Veja“, o militar foi detido novamente. Durante a audiência, ele enfrentou problemas de saúde e chegou a desmaiar.
Mauro Cid foi liberado em 3 de maio do ano passado, após uma decisão de Alexandre de Moraes, que ratificou completamente o acordo de colaboração premiada.
Na sua deliberação, o ministro mencionou que o ex-assistente de ordens reiterou a “espontaneidade e a conformidade legal do pacto” e enfatizou que os áudios que foram publicados pela revista Veja eram apenas um “simples desabafo“.
Em novembro, o antigo auxiliar de ordens teve que fornecer explicações ao ministro Alexandre de Moraes, uma vez que a Polícia Federal identificou incoerências em suas afirmações. (Foto: TON MOLINA/ESTADÃO CONTEÚDO)