Maria do Rosário: ‘Inelegibilidade enfraquece o Bolsonarismo nas próximas eleições’

Parlamentar é uma das maiores adversárias do ex-presidente Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados. 

 

 

Thiago Vilarins – O ex-presidente Jair Bolsonaro, quando deputado federal, tinha como um dos seus principais alvos de ataque a deputada Maria do Rosário (PT-RS). Uma das ofensivas mais emblemáticas e, principalmente, mais desprezíveis já vistas no plenário da Câmara, ocorreu em dezembro de 2014, quando Bolsonaro discursou da tribuna que só não estupraria a deputada petista porque “ela não merecia” por “ser muito feia” e porque “não fazia” o tipo dele. No dia seguinte, ele repetiu a declaração em entrevista ao jornal Zero Hora.

As declarações geraram repercussão nacional. A abertura de ação penal movida pela deputada e pelo Ministério Público Federal (MPF) ocorreu em 2016, quando o político se tornou réu pelo crime de injúria e por incitação ao crime de estupro. No entanto, desde 2019 a ação estava parada, pois Bolsonaro se tornou presidente e, de acordo com a Constituição, não poderia responder por atos alheios ao mandato. Ao perder as eleições de 2022, Bolsonaro também perdeu o chamado foro privilegiado e o Supremo Tribunal Federal (STF), enviou o caso para a justiça comum do Distrito Federal.

Depois de quatro anos parado, o processo deu mais um passo importante na última semana, quando o juiz Fellipe de Carvalho, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), determinou que a ação fosse enviada ao juizado especial. A decisão atendeu pedido do Ministério Público do DF. Os juizados especiais criminais atuam nos casos de crimes de menor potencial ofensivo, quando a pena de prisão não ultrapassa dois anos – o que na prática, permite que o condenado seja autorizado a cumprir pena em liberdade.

A contenda entre ambos fez com que Maria do Rosário fosse um dos nomes políticos que mais celebrou a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no inicio deste mês, que condenou o ex-presidente a inelegibilidade por oito anos, ou seja ele não poderá disputar nenhuma eleição municipal, estadual ou federal até 2030. “Essa decisão diz que não haverá anistia para os crimes cometidos ao longo do seu governo. Eu acho que o símbolo disso, também para o Brasil, é de que a política deve se transformar em um lugar melhor. Mais de serviço público e menos de pregação contrária à Constituição, à legalidade e à democracia”, disse a parlamentar à reportagem do Opinião em Pauta.

Maria do Rosário conversou com o portal sobre os efeitos da inelegibilidade do ex-presidente. Ela, que anunciou na última segunda-feira (17) que é pré-candidata do PT à prefeitura de Porto Alegre nas eleições municipais de 2024, avaliou como estarão as forças partidárias, sobretudo, as de direita a partir do baque de ter seu maior nome afastado do pleito eleitoral.

“Essa decisão enfraquece o chamado bolsonarismo, a política de confronto, do ódio, do negacionismo científico. Eu tenho convicção de que a população brasileira vai fazer um processo de educação política para a cidadania, onde vai começar a rejeitar cada vez mais o populismo político que está representado em uma figura como essa. Agora, depende da gente também o que será o futuro do Brasil, da nossa capacidade de fazermos com que a política aconteça com mais significado e a democracia tenha mais significado para vida das pessoas”, analisou.

 

Confira a breve conversa da deputada Maria do Rosário (PT-RS) com a reportagem do Opinião em Pauta, no último dia antes do recesso parlamentar, no corredor Tereza de Benguela, que dá acesso ao plenário da Câmara.

 

O que representa e qual o recado dado para a sociedade a decisão do TSE que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível?

Que não haverá anistia para os crimes cometidos ao longo do seu governo. Esse é só o primeiro processo. Há processos internacionais, inclusive, contra esse que esteve na presidência da República. Ele cometeu crimes que foram denunciados aos tribunais internacionais, o Tribunal Penal Internacional, como um crime de genocídio. Há tantas circunstâncias que ainda virão às claras no próximo período que, provavelmente, a situação deste personagem político terá ainda uma responsabilização maior do que a inelegibilidade. Mas eu acho que o símbolo disso, também para o Brasil, é de que a política deve se transformar em um lugar melhor. Mais de serviço público e menos de pregação contrária à Constituição, à legalidade e à democracia.

 

A senhora e o então deputado Jair Bolsonaro viveram grandes embates aqui na Câmara. Imagino que a senhora esteja comemorando muito esta inelegibilidade. E em relação aos próximos passos, a senhora acredita que o ex-presidente possa ser preso?

Ele anda com um amplo direito de defesa. Bem diferente do que aconteceu em outros períodos em que os processos eram marcados somente pela intenção política. O fato de, claramente, eu, por exemplo, ter uma intenção política e comemorar, inclusive, a retirada da vida pública, por inelegibilidade, de uma figura tão danosa ao interesse público, como esse Jair Bolsonaro, não influencia a decisão de quem está julgando. Porque eu não estou lá pressionando um juiz, eu não sou do Ministério Público… Então,  todos os processos relacionados ao Bolsonaro estão no âmbito do estado de direito e da ampla defesa que ele tem, mas da impossibilidade e incapacidade de provar a sua inocência. Isso porque ele é responsável, efetivamente, pelos crimes que cometeu e que agora começam a ser punidos e, por eles, se responsabilizar.

 

Apesar do ex-presidente Jair Bolsonaro ter sido derrotado nas urnas, o bolsonarismo se mostrou muito forte nas últimas eleições, elegendo, por exemplo, a maior bancada conservadora do Congresso Nacional desde a redemocratização. Com o ex-presidente impossibilitado de disputar um novo mandato nos próximos oito anos, a senhora imagina esse movimento ligado ao nome dele enfraquecido, principalmente para as próximas eleições municipais, no ano que vem?

Essa decisão enfraquece o chamado bolsonarismo, a política de confronto, do ódio, do negacionismo científico. Eu tenho convicção de que a população brasileira vai fazer um processo de educação política para a cidadania, onde vai começar a rejeitar cada vez mais o populismo político que está representado em uma figura como essa. Agora, depende da gente também o que será o futuro do Brasil, da nossa capacidade de fazermos com que a política aconteça com mais significado e a democracia tenha mais significado para vida das pessoas, na melhoria da qualidade de vida, na retomada dessa qualidade de vida, não apenas como direitos econômicos e sociais, garantia dos direitos de voto, mas também um processo de educação política e que a população entenda e tenha uma postura mais crítica, seja diante das fake news, seja diante dos meios de comunicação, seja diante de lideranças como essa que atuaram danosamente contra o país, mas de fato receberam o apoio para isso. Começa um processo de esvaziamento deste apoio, eu acredito nisso, mas depende também do nosso trabalho.

 

A direita tem usado muito o discurso de que estão sendo “vitimas do sistema” para justificar as atuais derrotas na justiça. Ou seja, eles colocam as decisões judiciais contrárias a eles na conta de um revanchismo do governo do PT. A esquerda não teme que a direita em vez de se enfraquecer diante desse cenário desfavorável possa ganhar força com um discurso de perseguição?

O país continua em disputa. A democracia continua em disputa. Há menos de seis meses essa Câmara dos Deputados, onde nós nos encontramos, agora, em um corredor era invadido por grupos paramilitares, altamente financiados, que visavam um golpe contra a democracia e a Constituição e impedir o exercício do mandato por quem foi eleito pelo presidente Lula. Tentaram impedir também o Parlamento e o Supremo Tribunal Federal. Então, não dá pra dizer que em seis meses a gente mudou essa realidade. Nós estamos em meio a uma ferrenha disputa, grave disputa, onde este essa condenação de Jair Bolsonaro é um passo para desmascará-lo, mas todo o trabalho político de conscientização e de desmascarar estes segmentos populistas fascistas devem ser feitos em prol da democracia.

(Foto: Giuliana Miranda)

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