Presidentes, em reunião bilateral no Palácio do Planalto, criticam proibição de candidatura de opositora de Maduro e defende mais transparência
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reforçou nesta quinta-feira (28), as críticas anunciadas pelo Itamaraty sobre a eleição na Venezuela, uma inflexão no apoio ao aliado Nicolás Maduro, e disse que a situação no país “é grave”. A expressão foi reproduzida pelo presidente da França, Emmanuel Macron, que concluiu uma visita de Estado ao Brasil, e também cobrou a realização de eleições justas e transparentes.
A declaração foi feita em encontro com jornalistas no Palácio do Planalto. Foi a primeira vez que Lula criticou abertamente o aliado Maduro sobre as eleições no país vizinho. O brasileiro tem um histórico de relativizações acerca da ditadura venezuelana. No início de março, questionado sobre o veto à participação de María Corina na disputa eleitoral, o presidente comparou o episódio à proibição imposta a ele de ser candidato à Presidência em 2018. “Eu fui impedido de concorrer às eleições de 2018. Ao invés de ficar chorando, eu indiquei um outro candidato e disputou as eleições”, afirmou à época.
Desta vez, Lula mudou o tom e criticou o impasse sobre as eleições venezuelanas, com a candidata da oposição Corina Yoris (substituta de María Corina) ter afirmado ter sido impedida de se registrar para disputar o pleito de 28 de julho contra o presidente Nicolás Maduro. O presidente Lula contou que ficou surpreso com a reação da Venezuela em relação ao posicionamento do Ministério das Relações Exteriores (MRE), que emitiu nota criticando o fato. Ele contou que, quando conversou com Maduro no encontro dos países amazônicos na Guiana, recentemente, pediu para que ele fizesse um processo transparente e o “mais democrático possível”.
“Eu fiquei surpreso com a decisão [de bloquear Yoris]. Primeiro, a decisão boa da candidata proibida pela Justiça [María Corina Machado] indicar uma sucessora. Achei um passo importante. Agora, é grave que a candidata [substituta] não possa ter sido registrada. Ela não foi proibida pela Justiça”, declarou Lula. “Foi uma coisa que causou prejuízo a uma candidata. Não tem explicação jurídica, política você proibir um adversário [de] ser candidato.”, acrescentou.
O petista voltou a fazer comparação com sua situação em 2018, quando, preso no âmbito da Lava Jato, foi proibido de concorrer por decisão da Justiça Eleitoral —mas pôde designar Fernando Haddad como seu candidato. Ele contou ainda ter argumentado ao ditador Nicolás Maduro, durante encontro entre os dois na cúpula da Celac em São Vicente e Granadinas, que o pleito realizado no país deveria ser o mais democrático possível. “Disse para ele [Maduro] que a coisa mais importante para reestabelecer a normalidade na Venezuela era não ter problema no processo eleitoral. Era que a eleição fosse convocada da forma mais democrática possível”, relatou Lula.
“O fato de uma candidata ter sido proibida pela Justiça ser candidata não era um agravante. Porque vocês não podem esquecer que, aqui no Brasil, eu fui proibido de ser candidato quando era o primeiro colocado em todas as pesquisas de opinião pública”, disse. “Eu indiquei outro candidato, perdemos as eleições. Mas fez parte do jogo democrático. Participei, perdi, paciência”.
Os comentários de Lula sobre o tema ocorreram após seu encontro bilateral com o presidente francês, Emmanuel Macron. Os dois chefes do Executivo assinaram acordos de cooperação. O presidente francês elogiou a postura de Lula de criticar o recrudescimento da repressão contra opositores na Venezuela. Ele disse que o petista adotou uma “posição muito corajosa”. “Nós a compartilhamos totalmente, e seu papel é determinante para encontrar uma saída para essa crise”.
Em seguida, Macron foi além: disse que o quadro em que as eleições na Venezuela estão sendo instaladas não pode ser considerado como democrático. “[É preciso] fazer tudo para convencer o presidente Maduro e seu sistema a reintegrar todos os candidatos que se apresentem e, em seguida, criar as condições mais transparentes de organização dessas eleições pelos observadores regionais e internacionais”.
Depois das declarações, Lula e Macron seguiram para o Itamaraty, onde foi oferecido um almoço em homenagem ao francês. À tarde, Macron terá um encontro com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), último compromisso da sua visita de três dias ao Brasil. Este é o terceiro dia do líder no país, que também esteve em Belém (PA), Itaguaí (RJ) e São Paulo (SP). Lula acompanhou-o nas duas primeiras cidades.
(Foto: Wilton Júnior/Estadão)