Lula diz que governo Maduro tem regime com ‘viés autoritário’, mas ‘não é ditadura’

Presidente afirmou não concordar com nota do PT que reconheceu reeleição do chavista e cobrou divulgação de dados

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta sexta-feira (16), em entrevista à Rádio Gaúcha, que a Venezuela vive um regime autoritário, mas negou que seja uma ditadura. Lula afirmou também que o presidente Nicolás Maduro tentou barrar a ida do assessor especial Celso Amorim para acompanhar o processo eleitoral, mas foi dissuadido após ameaça de Lula em divulgar o assunto.

“E acho que a Venezuela vive um regime muito desagradável. Não acho que é ditadura, é diferente de ditadura, é um governo com viés autoritário, mas não é uma ditadura como conhecemos em vários países do mundo”, afirmou Lula.

Na sequência, o presidente revelou que seu braço direito para assuntos internacionais quase foi impedido de acompanhar as eleições. “Quando o Celso Amorim ia viajar para a Venezuela, eu fui informado que eles tinham pedido para ele não ir. Eu mandei comunicar a eles que, se o Celso Amorim não pudesse ir, eu comunicava a imprensa que a Venezuela estava impedindo o Celso Amorim. Ai deixaram o Celso Amorim ir”, revelou.

Questionado sobre a nota divulgada pelo seu partido, o PT, pouco depois da eleição venezuelana, na qual a legenda reconhece a vitória de Maduro e declara apoio ao regime chavista, Lula disse que discorda desse posicionamento.  “Eu não concordo com a nota. Eu não penso igual à nota. Mas eu não sou da direção do PT. O problema da Venezuela será resolvido pela Venezuela”, afirmou.

“Teve uma eleição. A oposição fala: ‘eu ganhei as eleições’, o Maduro fala: ‘eu ganhei as eleições’. O que eu estou pedindo para poder reconhecer? Eu quero, pelo menos, saber se foi verdade os números. Cadê a ata, a aferição das urnas?”, questionou o presidente.

“Eu disse para o presidente Maduro o seguinte: ‘para você, é essencial que o mundo compreenda que houve uma eleição limpa e democrática’. Ele disse que ia fazer”, prosseguiu Lula, que historicamente é um aliado do chavismo na Venezuela.

Nesta quinta-feira (15), Lula afirmou que não reconhece a vitória de Maduro e que o venezuelano “sabe que está devendo” uma explicação ao mundo. O presidente também afirmou que não reconhece a vitória de Edmundo González Urrutia, principal candidato da oposição, indicando que qualquer reconhecimento tem de ser feito com base em resultados críveis.

Para Lula, se Maduro tiver “bom senso”, poderia convocar novas eleições no país — proposta que lhe foi sugerida por Amorim. Segundo o brasileiro, uma das sugestões é criar um “governo de coalizão” com a oposição venezuelana. Nesta sexta-feira, Lula ainda afirmou que não acredita na possibilidade de que haja uma guerra civil no país, temor já apontado por Amorim.

“Eu não acredito em uma guerra civil, eu não acredito. Porque eu acho que há muitos países com disposição de ajudar que a gente viva em paz na América do Sul. A guerra não leva à nada, a guerra só leva à destruição. A paz leva ao crescimento econômico, distribuição de riqueza. É isso que eu espero para a Venezuela. É isso que eu torço para a Venezuela. E vamos esperar porque agora tem uma Suprema Corte que está com os papéis para decidir. Vamos esperar qual será a decisão disso”, disse.

O governante de esquerda foi proclamado reeleito para um terceiro mandato de seis anos, até 2031, com 52% dos votos. A oposição liderada por María Corina Machado, que considera a declaração fraudulenta, criou um portal em que diz ter apresentado mais de 80% de atas eleitorais, coletadas por testemunhas no dia da votação, que provariam a vitória de González com quase 70%. María Corina, que foi impedida de disputar o pleito, ofereceu entregar os documentos para verificação do Brasil, mas o governo rejeita uma apuração paralela, reforçando a necessidade de que o governo venezuelano apresente as atas eleitorais.

Nesta quinta-feira, em audiência pública no Senado, Amorim afirmou que o Brasil não reconhecerá um terceiro mandato de Maduro, a partir de janeiro do ano que vem, se as atas eleitorais não aparecerem. Na semana passada, o Centro Carter, um dos poucos observadores internacionais do processo eleitoral na Venezuela, disse que as atas eleitorais coletadas pela oposição são “consistentes”, afirmando que González venceu de maneira clara e “por uma margem intransponível”.

Pela primeira vez falando em público sobre a proposta de Amorim sobre novas eleições, Lula também pontuou que uma eventual nova votação poderia ocorrer com observadores internacionais — Amorim havia defendido que a União Europeia suspendesse as sanções em vigor e enviasse observadores se houvesse nova votação. Na terça-feira, porém, o líder da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodríguez, propôs uma reforma eleitoral para suspender a observação internacional nos pleitos.

Desde que ouviu a sugestão de nova eleição, Lula tem considerado o assunto e chegou a tratar sobre o tema na última reunião ministerial, realizada na semana passada. Na ocasião, afirmou que Maduro deveria ter tido, ele próprio, a iniciativa de convocar um novo pleito, segundo pessoas presentes no encontro.

(Foto: Reprodução/Canal Lula)

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