Líderes indígenas do sul do Pará relatam o abandono e descaso com a saúde dos povos na região

Lideranças se articulam para levar aos governos estadual e federal reivindicações por mais atenção e investimentos na política de saúde indígena

 

Bia Cardoso – A situação da saúde dos povos indígenas no Estado do Pará é apontada como um exemplo público de fracasso na política de terceirização dos serviços de atendimento à saúde indígena no Brasil. A denúncia é de lideranças indígenas das regiões do sul do Pará – e de algumas do norte do Estado também – que  já começaram a se articular para mostrar aos Governos Estadual e Federal a realidade nas 77 áreas indígenas distribuídas em 52 municípios paraenses.

Os indígenas reclamam do abandono por parte da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), órgão do Ministério da Saúde, da gerência nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), da precarização nos distritos sanitários e, também, das  casas de apoio ao índio (Casai). “Nós estamos sem remédios tendo que tirar do bolso para comprar. Faltam  profissionais de saúde para atender nosso povo”, declara um dos líderes.

As nomeações recentes e futuras também são alvo de críticas. Segundo o cacique e conselheiro Irykw Suruí da aldeia Akamassyron, o apelo central dos povos indígenas do Pará é por mudanças. Ele afirma que, entre as diferentes etnias, a proposta é de que nenhum ex-administrador das CASAI e DSEIS voltem a ocupar cargos  administrativos . “A experiência com eles foi péssima . O esquema com empresas é pesado”, denuncia o cacique, que ainda reconhece o esforço do Governo Federal em permitir que os indígenas gerenciem suas próprias políticas públicas.

O atraso na contratação de equipes multidisciplinares de atenção à saúde indígena também estão no centro da crise. Conforme o líder Arukapé,   exemplos não faltam de sucateamento da saúde indígena. “Os problemas começam no Hotel contratado em processo licitatório em Marabá. Fica fora de rota e não possui área de lavanderia. Outro problema é que, aqui,  só temos um técnico para assistir os doentes. Outro dia, ele socorreu um e, ao deixar o hotel, houve outra emergência com o filho do guerreiro Irikuá. Ele precisou fazer um curativo e não tinha ninguém pra fazer” , conta ele.

De acordo com os caciques, a situação nas aldeias também é crítica. Faltam postos de saúde e profissionais da área também. “Na maioria, tem só um técnico de enfermagem. Quando ele tira folga, a aldeia também fica descoberta. Aqui, na UBSI Sororó, temos um técnico. Quando ele sai com pacientes para a cidade, o posto fica sem ninguém.”

A indígena Ipêui é mãe de gêmeos que nasceram prematuros. Segundo MUREATYNG um dos bebês tem deficiência de ferro. Há uma semana, a médica pediatra do Hospital Materno Infantil de Marabá, recomendou o uso do Neutrofe, medicamento que custa em média R$ 62,90 nas farmácias. Por falta de dinheiro, o remédio ainda não foi comprado e a deficiência do bebê continua sem tratamento. Um caso de responsabilidade da alta complexidade.

Para Sebastiao Tembé da aldeia São Pedro no Alto Rio Guamá, a saúde indígena em seu território vai de mal a pior. “Aqui não tem o mínimo de medicamentos. Se você não tiver dinheiro, não se trata”, denuncia indígena, ressaltando, em seguida, que há três meses ele espera por uma fisioterapia em um hospital público de Belém. Ele ainda completa que precisou fazer empréstimo pra comprar remédios.

E essa queixa é da maioria dos indígenas ouvidos pela reportagem do Opinião em Pauta. A saúde indígena agoniza sem que uma saída plausível seja apresentada pelos governos. As lideranças ressaltam que o território indígena no Pará é extenso, com ocupação de 25% da área do total das terras estaduais. Em muitas aldeias não há um posto de saúde e o acesso é ainda mais difícil devido as chuvas. “Nós vamos para o posto de saúde dos brancos. Lá  demora demais e a gente vem embora”, reclama uma Surui.

Para o cacique Ehapikong   Suruí da aldeia AWUSSEHÉ é preciso estancar o retrocesso e garantir ao indígena o direito constitucional à saúde de qualidade. Ele lembra que diferentes etnias em todo o Brasil, revelam  situações de abandono e descaso no atendimento das populações indígenas. O exemplo mais recente é o dos povos Yanomamis.

Os líderes afirmam que o Governo Federal ao concentrar esforços para socorrer os Yanomamis, deixou sem assistência o restante do Brasil. Eles lembram que a política de saúde indígena foi uma conquista fruto das lutas encampadas pelos  povos indígenas do Brasil e pedem ao atual governo, mais atenção e investimentos na política de saúde indígena. (Fotos: Divulgação)

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