Hamilton exalta Brasil por decisão ‘incrível’ de condenar Piquet por racismo

O ex-piloto bolsonarista foi condenado, em primeira instância, a pagar R$ 5 milhões

 

A sentença aplicada a Nelson Piquet pelas declarações consideradas racistas e homofóbicas contra Lewis Hamilton foi celebrada pelo heptacampeão mundial da Fórmula 1. Durante a coletiva de imprensa desta quinta-feira (30), em Melbourne, onde será disputado neste fim de semana o GP da Austrália de F-1, o piloto da Mercedes elogiou a forma como as autoridades no Brasil conduziram o caso.

Piquet foi condenado, na semana passada, a pagar R$ 5 milhões em indenização a Hamilton em decisão publicada pela 20ª Vara Cível de Brasília. Em entrevista veiculada no canal do YouTube Motorsport Talks em 3 de novembro de 2021, o tricampeão da F1 referiu-se a Lewis como “o neguinho” de forma pejorativa ao comparar a manobra do inglês no GP da Inglaterra do mesmo ano com uma de Ayrton Senna.

“O neguinho meteu o carro. O (Ayrton) Senna não fez isso. O Senna saiu reto”, comentou Piquet ao comparar um acidente envolvendo Hamilton em 2016 com o acidente envolvendo Senna e Alain Prost no GP do Japão em 1990. Em seguida, ele insultou os ex-pilotos Keke e Nico Rosberg, pai e filho: “(Keke) é que nem o filho dele (Nico). Ganhou um campeonato… o neguinho devia estar dando mais o c.. naquela época e ‘tava’ meio ruim, então… (risos)”.

 

“Racismo e homofobia não são aceitáveis. E não há espaço para isso em nossa sociedade. Então, eu amei que estejam mostrando que defendem uma posição”

 

“Eu gostaria de agradecer ao governo brasileiro. Acho que é incrível o que fizeram ao responsabilizar alguém, mostrando às pessoas que isso (preconceitos) não é tolerável”, declarou Hamilton. “Racismo e homofobia não são aceitáveis. E não há espaço para isso em nossa sociedade. Então, eu amei que estejam mostrando que defendem uma posição”, comentou o inglês. “E ainda credito que, de forma geral, não devemos dar plataforma para pessoas que estão cheias de ódio.”

As entidades Aliança Nacional LGBTI, Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas, Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de SP e Faecidh acionaram a Justiça ao alegarem que Piquet violou direito fundamental difuso à honra da população negra e da comunidade LGBTQIA+ ao se referir em comentário a Hamilton como “neguinho” e ao proferir falas homofóbicas contra Keke e Nico Rosberg.

Nesta quinta, Hamilton pediu mais decisões como a da Justiça brasileira em outros países. “Eu gostaria que mais governos fizessem o mesmo, temos visto o caso de Uganda (país que aprovou lei que impõe pena de morte para homossexuais)”, declarou o piloto da Mercedes. “Obviamente, há mais de 30 países na África e no Oriente Médio (com leis do tipo). Há muitas coisas que podemos aprender (com a decisão da Justiça brasileira)”, comentou.

 

Lewis Hamilton recebeu em novembro do ano passado título de cidadão honorário do Brasil na Câmara dos Deputados, em Brasília (Foto: Adriano Machado/Reuters)

 

Histórico

Em julho do ano passado ressurgiram nas redes sociais a parte da entrevista que o ex-piloto Nelson Piquet concedeu ao canal “Motorsports Talks” em novembro de 2021. Nessa época, Nelson Piquet estava tendo muita visibilidade por não perder a oportunidade de mostrar apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo, a imprensa tornou público que Piquet doou a bagatela de R$ 501 mil a Jair Bolsonaro, tornando-se o maior benfeitor pessoa física da campanha para a reeleição. O afago foi registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), menos de um mês após a empresa do ex-piloto faturar mais de R$ 6 milhões em um contrato assinado, sem licitação, em 2019, com Instituto Nacional de Meteorologia, órgão ligado ao Ministério da Agricultura.

O tricampeão mundial fez comentários racistas e homofóbicos na entrevista ao canal internacional em relação a Hamilton, a quem se referiu como “neguinho”. Os comentários de Piquet viralizaram na internet e foram respondidos com repúdio por todo o ecossistema da Fórmula 1. Pilotos, equipes, jornalistas e fãs condenaram a atitude do piloto brasileiro, defendendo Hamilton e afirmando que não havia mais espaço para esse tipo de comportamento no esporte.

Em seu perfil no Twitter, o heptacampeão foi breve em sua resposta. Ele afirmou, em português, que era necessário “mudar a mentalidade”. “É mais do que linguagem. Essas mentalidades arcaicas precisam mudar e não têm lugar no nosso esporte. Fui cercado por essas atitudes minha vida toda. Houve muito tempo para aprender. Chegou a hora da ação”, disse o britânico.

A Federação Internacional de Automobilismo (FIA) se posicionou, afirmando que “condena veementemente qualquer linguagem e comportamento racista ou discriminatório, que não tem lugar no esporte ou na sociedade em geral”. A Fórmula 1 também saiu em defesa de Hamilton. “A linguagem discriminatória ou racista é inaceitável sob qualquer forma e não tem parte na sociedade. Lewis é um embaixador incrível do nosso esporte e merece respeito.”

Em contrapartida, Piquet se desculpou por seus comentários justificando o uso do termo racista ao afirmar que o termo “neguinho” é usado como sinônimo de “rapaz” e “pessoa” no português brasileiro. “Eu gostaria de esclarecer a história que tem circulado na mídia a respeito de um comentário que fiz em uma entrevista no ano passado. O que eu disse foi mal pensado, e não há defesa para isso. Mas gostaria de esclarecer que o termo usado é historicamente usado de forma coloquial no português brasileiro como um sinônimo de ‘rapaz’ ou ‘pessoa’, mas sem a intenção de ofender. Eu nunca usaria a palavra da qual tenho sido acusado em algumas traduções. Condeno toda e qualquer sugestão de que a palavra que usei tenha sido direcionada de forma depreciativa ao piloto por causa da cor de pele dele”, disse o ex-piloto. (Foto: Carl de Souza/AFP)

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