Henrique Acker (correspondente internacional) – Em dois anos e quatro meses de guerra os avanços, recuos e deslocamentos de tropas e equipamentos de russos e ucranianos enfrentam dificuldades no terreno. A demora na definição de posições ocorre porque o objetivo de Moscou é a conquista do Donbass, onde estão as regiões de Lugansk e Donetsk, de maioria russófona, no leste da Ucrânia.
As batalhas se concentram justamente na região de fronteira com a Rússia, onde Vladimir Putin pretende criar um cinturão de segurança que impeça a instalação de armas de longo alcance da OTAN, capazes de atingir o território russo.
Outro ponto estratégico para a Rússia é a manutenção da Crimeia, território reincorporado ao país em 2014, que permite o pleno acesso ao Mar Negro, fundamental para a chegada e escoamento de mercadorias através do Mar Mediterrâneo.
Apelos em vão dos dois lados
Numa guerra pela conquista de território a tendência é que as batalhas sejam prolongadas, até que se consolide o domínio das posições desejadas pelo invasor. Daí o número elevado de baixas dos dois lados, o que torna o recrutamento uma questão crucial.
Os apelos dos dois governos nem sempre dão bons resultados. Segundo o sítio britânico Forces Network, especializado em temas militares, a Rússia aumentou em 10,5% os salários dos combatentes em 2023, a fim de atrair mais interessados.
Vladimir Putin anunciou em janeiro deste ano o recrutamento periódico, cujo objetivo é adicionar às Forças Armadas cerca de 150 mil homens a partir dos 18 anos. Antes, em julho de 2023, o parlamento russo já havia aumentado a idade máxima de 27 para 30 anos.
A escassez de mão de obra militar também é um problema para a Ucrânia, que no início deste ano reduziu a idade mínima de recrutamento para ir à guerra, baixando-a de 27 para 25 anos, segundo a agência Associated Press (AP).
Segundo artigo de Mykyta Vorobiov no portal do Center For European Policy Analysis, todos os ucranianos dos 18 aos 60 anos teriam que criar uma conta digital através da qual poderiam ser convocados. Sanções seriam impostas aos desertores. “Essas punições incluiriam a proibição do uso de serviços consulares no exterior e o bloqueio de contas bancárias de recrutas”.
Um dos problemas enfrentados pelo governo é a fuga e a recusa ao alistamento militar. Kiev diz que 6.100 homens foram apanhados tentando deixar o país com documentos falsos para evitar participar na guerra.
Destacamentos de presidiários russos
Um dos recursos que vem sendo utilizado pela Rússia desde o início da guerra é o alistamento de presos comuns, em troca da supressão da pena e a promessa de retorno para casa em seis meses.
No início do conflito o serviço era realizado pelo Grupo Wagner (espécie de milícia privada), mas depois passou a ser adotado oficialmente. Há destacamentos militares russos formados só por ex-presidiários, como as tropas Tempestade V.
Até agosto de 2023 estima-se que cerca de 50 mil presidiários russos foram engajados nas tropas enviadas para a Ucrânia. No início os que conseguiam sobreviver podiam retornar depois de seis meses de serviços prestados. Agora, têm que permanecer na linha de frente até o final da guerra.
Presidiários também do lado ucraniano
Com o avanço da guerra e a escassez de pessoal, o governo da Ucrânia adotou medida semelhante. O que era condenável quando se tratava da Rússia, passou a ser encarado pela mídia ocidental como algo compreensível e aceitável do lado ucraniano.
Até agora, mais de 2,7 mil prisioneiros, incluindo traficantes de drogas e assassinos, já foram soltos das prisões ucranianas para servir o exército. Hoje há cerca de 20 mil presidiários com perfil exigido para serem incorporados às tropas ucranianas.
Foram formados destacamentos de recrutamento, que percorrem as ruas das cidades em busca de homens para o alistamento. De um lado e de outro, geralmente os batalhões de ex-presidiários são enviados para as missões de maior periculosidade.
Segundo os dados do Eurostat, o serviço de estatísticas da União Europeia (UE), cerca de 768 000 homens ucranianos com idades compreendidas entre os 18 e os 64 anos beneficiaram de proteção temporária nos países da UE até novembro do ano passado.
Só há estimativas de mortos e feridos
Embora os dois lados mantenham a informação sob sigilo, as estimativas mais otimistas dão conta que pelo menos 80 mil soldados (50 mil russos e 31 mil ucranianos) já perderam suas vidas nos campos de batalha da Ucrânia. Mas este número de baixas varia até 300 mil russos e cerca de 170 mil ucranianos mortos e feridos até o final de 2023.
No início de março, o Ministério da Defesa britânico calculou 355 mil baixas entre os russos, contando-se aí mortos e feridos. Os números são semelhantes aos sugeridos pela inteligência norte-americana em dezembro de 2023, de 315 mil baixas russas.
O jornal The New York Times afirmou, em agosto do ano passado, que até ali haviam morrido cerca de 70 mil ucranianos, com algo entre 100 mil e 120 mil feridos. Os dados foram sugeridos por autoridades norte-americanas ouvidas sob condição de anonimato.
O número de civis mortos já ultrapassa os 10 mil e os feridos chegam a mais de 20 mil, também por estimativas de órgãos de imprensa e organizações não governamentais.
De acordo com a ONU, mais de 14 milhões de pessoas (quase um terço da população da Ucrânia) tiveram que abandonar suas casas desde o início da invasão russa. Desse total, 3,7 milhões são consideradas deslocadas internas, vivendo em outras regiões do país. Outros 6,4 milhões abandonaram a Ucrânia.
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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Fontes:
https://www.forces.net/russia/what-are-russian-soldiers-being-paid-fight-putins-war
https://www.bbc.com/portuguese/articles/cw4r1md09g9o
https://pt.euronews.com/2023/09/01/milhares-de-ucranianos-recusam-participar-na-guerra
https://www.bbc.com/portuguese/articles/cj53qy6vmyqo
https://www.bbc.com/portuguese/articles/clmvxyd3y8go
https://www.bbc.com/news/articles/cz994d6vqe5o