O G20 conseguiu superar o impasse entre o G7 e a aliança entre Rússia e China e chegou a um consenso para a publicação do documento final da Cúpula de Líderes, realizada em Nova Delhi, na Índia.
O documento, no entanto, foi brando com relação à guerra na Ucrânia, sem adotar o tom de condenação à invasão russa defendido pelos Estados Unidos, o G7 e a União Europeia.
A Rússia, no entanto, só é citada no documento no contexto do acordo para exportação de grãos, que foi suspenso em julho deste ano.
Nem nesse ponto os russos foram condenados, com o texto apelando apenas para a implementação plena, rápida e eficaz de novo acordo “para garantir as entregas imediatas e desimpedidas de cereais, produtos alimentares e fertilizantes/insumos provenientes da Federação Russa e da Ucrânia. Isto é necessário para satisfazer a procura nos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos, especialmente nos países de África”.
A declaração branda foi a única forma encontrada pelos países para conseguir chegar a um consenso com relação ao tema.
Rússia e China ameaçavam vetar qualquer documento final que apresentasse condenações contra o Kremlin. Caso isso acontecesse, seria a primeira vez que uma Cúpula do G20 acabaria sem uma declaração final — o texto que deixa claro que ações concretas devem ser tomadas pelos países do bloco.
A hipótese de uma cúpula sem declaração enfraqueceria ainda mais o bloco, que já está dividido, e transformaria o evento num fracasso.
A anfitriã Índia trabalhou até o final para conseguir um texto, mesmo que fosse brando como foi.
O primeiro-ministro do país, Narendra Modi, fez todos os esforços para transformar o encontro em um sucesso que demonstrasse a emergência da Índia como poder global. Um texto fraco, sem nenhuma condenação, pelo ponto de vista dele (que enfrenta uma eleição no ano que vem) é muito melhor do que a falta de uma declaração.
Outros países importantes do sul global também trabalharam como mediadores — entre eles o Brasil e a África do Sul.
O Itamaraty usou a posição do Brasil, que tem excelentes relações tanto com o ocidente como com russos e chineses, para facilitar o diálogo, segundo um diplomata declarou à CNN.
A CNN teve acesso à versão oficial do documento e o texto é similar ao adotado em Bali, na Indonésia, local onde foi realizada a cúpula de 2022.
Atendendo a uma demanda da China, o G20 reafirmou na declaração que a cúpula é um fórum de natureza econômica, e não geopolítica.
“Reafirmando que o G20 é o principal fórum para a cooperação econômica internacional e reconhecendo que, embora o G20 não seja a plataforma para resolver questões geopolíticas e de segurança, reconhecemos que estas questões podem ter consequências significativas para a economia global”, diz um trecho.
Ao comentar sobre a Guerra da Ucrânia, a cúpula ancorou-se ainda na Carta das Nações Unidos para lembrar que os países devem “abster-se da ameaça ou do uso da força para procurar a aquisição territorial contra a integridade territorial e soberania ou independência política de qualquer estado”.
No texto, os líderes consideram o uso de armas nucleares “inadmissível”.
Veja abaixo íntegra dos trechos que falam sobre a Ucrânia:
- Notamos com profunda preocupação o imenso sofrimento humano e o impacto adverso das guerras e conflitos em todo o mundo.
- No que diz respeito à guerra na Ucrânia, embora recordando a discussão em Bali, reiteramos a nossa posições e resoluções nacionais adotadas no Conselho de Segurança da ONU e na Assembleia-Geral da ONU (A/RES/ES-11/1 e A/RES/ES-11/6) e destacou que todos os estados devem agir de maneira consistente com os propósitos e princípios da ONU
Carta na íntegra. De acordo com a Carta das Nações Unidas, todos os Estados devem abster-se da ameaça ou uso da força para buscar aquisição territorial contra a integridade territorial e soberania ou independência política de qualquer estado. O uso ou ameaça de uso de energia nuclear armas é inadmissível. - Reafirmando que o G20 é o principal fórum para a cooperação econômica internacional e reconhecendo que embora o G20 não seja a plataforma para resolver problemas geopolíticos e questões de segurança, reconhecemos que estas questões podem ter consequências significativas para a economia global.
- Destacamos o sofrimento humano e os impactos negativos adicionais da guerra na Ucrânia no que diz respeito à segurança alimentar e energética mundial, às cadeias de abastecimento, à estabilidade macrofinanceira, inflação e crescimento, o que complicou o ambiente político para os países, especialmente os países em desenvolvimento e menos desenvolvidos que ainda estão se recuperando da pandemia da Covid-19 e a perturbação econômica que atrapalhou o progresso rumo ao Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Houve diferentes pontos de vista e avaliações da situação.
- Agradecemos os esforços dos Acordos de Turquia e de Istambul, mediados pela ONU, que consistem do Memorando de Entendimento entre a Federação Russa e o Secretariado das Nações Unidas para a Promoção de Produtos Alimentares e Fertilizantes Russos aos Mercados Mundiais e à Iniciativa para o Transporte Seguro de Grãos e Produtos alimentares provenientes dos portos ucranianos (Iniciativa do Mar Negro), e apelamos à sua entrega completa, atempada e implementação eficaz para garantir entregas imediatas e desimpedidas de grãos, alimentos e fertilizantes/insumos provenientes da Federação Russa e da Ucrânia. Isso é necessário para satisfazer a procura nos países em desenvolvimento e nos países menos desenvolvidos, particularmente aqueles em África.
- Neste contexto, enfatizando a importância de sustentar a segurança alimentar e energética, apelou à cessação da destruição militar ou de outros ataques a infraestruturas relevantes.
Manifestamos também profunda preocupação com o impacto adverso que os conflitos têm sobre a segurança dos civis, exacerbando assim as fragilidades socioeconômicas existentes e vulnerabilidades e impedindo uma resposta humanitária eficaz. - Apelamos a todos os Estados para que defendam os princípios do direito internacional, incluindo o direito territorial, integridade e soberania, direito humanitário internacional e sistema multilateral que salvaguarda a paz e a estabilidade. A resolução pacífica de conflitos e os esforços para abordar as crises, bem como a diplomacia e o diálogo são fundamentais. Vamos nos unir em nosso esforçar-se para enfrentar o impacto adverso da guerra na economia global e saudamos todas as iniciativas relevantes e construtivas que apoiam uma abordagem abrangente, justa e uma paz duradoura na Ucrânia que defenderá todos os propósitos e princípios da ONU Carta para a promoção de relações pacíficas, amistosas e de boa vizinhança entre nações no espírito de “Uma Terra, Uma Família, Um Futuro”.
Lula prometeu força-tarefa pelo clima
Em seu primeiro discurso no G20, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu usar a presidência do Brasil no G20 para criar uma “força-tarefa para mobilização global contra a mudança do clima”.
Lula não deu maiores detalhes de como tal força-tarefa poderia funcionar e nem que poderes teria. De qualquer forma, tal iniciativa só tomará vida se for aprovada de forma unânime pelos demais membros do grupo das maiores economias do mundo.
O presidente aproveitou o discurso para também criticar as nações desenvolvidas por suas responsabilidades pelo aquecimento global, já que elas historicamente emitiram muito mais gases de efeito estufa.
Segundo a assessoria de imprensa da Presidência, Lula sentiu o fuso horário e está cansado e por isso não vai participar do jantar com os líderes.