Henrique Acker (correspondente internacional) – O avanço do universo digital, ao contrário de gerar a difusão do conhecimento, impulso à democracia e a pluralidade de opiniões, vem sendo usado pelos proprietários das grandes companhias de alta tecnologia (big techs) para forjar um sistema de concentração de lucros e riquezas global, imposição de valores e gostos que limita a concorrência.
Os grandes bilionários das mega companhias tornaram-se verdadeiros comandantes de uma nau desgovernada, um Mundo em que essas empresas agem sem qualquer regulamentação e sem limites aos seus poderes. Sua influência e seu discurso se somam às lideranças da extrema-direita, que desafiam a democracia e contestam os direitos sociais e trabalhistas.
Por princípio, esses senhores recusam submeter seus negócios às legislações em vigor nos diversos países em todo o mundo, apresentando-se como benfeitores da humanidade e paladinos da liberdade. Querem impor seu “vale-tudo” aos governos e povos, beneficiando-se do monopólio que exercem no mundo virtual, sem qualquer regulamentação.
Porta-voz da extrema-direita
É o caso do bilionário sulafricano Elon Musk, recentemente envolvido em polêmica com o ministro do STF, Alexandre de Moraes. Ao anunciar que pretendia desbloquear brasileiros punidos judicialmente por difundirem notícias falsas em suas contas no Twitter (X), Musk tentou desautorizar a Justiça brasileira, considerando que a decisão constitui censura e ataca a “liberdade de opinião”.
Sua posição foi e continua a ser aplaudida por quem se beneficiaria dela: a extrema-direita bolsonarista, useira e vezeira em distorcer fatos e opiniões para sustentar um discurso de ódio, incapaz de aceitar a diversidade e o contraditório.
Os casos mais exemplares de propagação de discurso de ódio no Brasil são os de Allan dos Santos e Oswaldo Eustáquio, influenciadores digitais da extrema-direita. No inquérito que corre no STF, os dois são apontados como difusores de fake news e hoje vivem fora do Brasil para fugir de mandados de prisão expedidos pela Justiça brasileira.
Uma mãozinha do Centrão
Aproveitando-se do clima de polêmica causado pelo confronto entre Musk e Moraes, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, retirou da pauta de votações o Projeto de Lei 2630 (combate às fake news), que vinha sendo debatido há cerca de quatro anos.
O Projeto pretendia coibir a disseminação de informações falsas nas redes sociais, vetando o uso de robôs ou contas automatizadas que não representam um humano em sua gestão. A ideia era criminalizar o uso das chamadas contas inautênticas na disseminação em massa de desinformação.
De acordo com a proposta, as empresas provedoras de conteúdos na internet (Facebook, Instagram, YouTube, Google, Twitter (X) e outros) passariam a ser responsabilizadas, caso não impedissem o uso desse tipo de perfil e mantivessem no ar discurso de ódio. Por este motivo, o lobby das empresas de alta tecnologia era forte contra o Projeto.
Nenhuma regra para os bilionários
Não por acaso há uma coincidência de interesses que liga os donos das grandes companhias de alta tecnologia à extrema-direita. Os bilionários do mundo virtual e os extremistas de direita não querem se submeter a regras que determinem limites e punam os que usam de falsos argumentos para justificar uma sociedade que beneficia uma ínfima minoria. Daí o alinhamento automático dos bolsonaristas com Elon Musk.
Mas a atuação das big techs não se limita ao desrespeito a aspectos éticos e políticos na sociedade, e ao descumprimento de preceitos que vigoram nas legislações dos países ao redor do mundo. O principal é a burla de regras no que diz respeito às relações econômicas.
Como não há uma regulamentação internacional que discipline as atividades nas redes sociais, todo o arcabouço de regras e leis em vigor em qualquer país que assegure a concorrência e coíba a atuação monopolista é desrespeitado pelos senhores das big techs.
O céu é o limite
O universo da internet permite aferir vultosos ganhos, através do exercício do monopólio sobre comércio virtual (e-commerce), uso indevido de obras autorais (matérias de jornais, fotografias, etc) e até nos jogos de azar. Tudo isso é feito ao arrepio da lei em grande parte dos países.
Esse volume de negócios deve crescer com a aplicação da chamada Inteligência Artificial (IA), que nada mais é do que a apropriação de todo o conhecimento acumulado pela humanidade e seu uso para gerar novos negócios em diversas áreas.
Sabe-se que a circulação e venda de bancos de dados é um negócio lucrativo, praticado há anos pelo sistema comercial e bancário. Mas as big techs vão mais longe e querem ter acesso a dados pessoais e intransferíveis. É o que se verifica com a compra de imagens das íris dos olhos pela empresa Worldcoin, que já coletou dados de quatro milhões de pessoas em 120 países até o início de março deste ano.
Lucros bateram recorde em 2023
Juntas, as cinco maiores empresas de tecnologia do mundo – Apple, Alphabet, Amazon, Microsoft e Meta – lucraram US$ 327 bilhões em 2023. O resultado superou o recorde de 2021, quando as companhias tiveram lucro somado de US$ 311 bilhões.
Apesar de alcançarem lucros estrondosos, as big techs praticam o enxugamento de custos. Em 2023 foram mais 240 mil funcionários dispensados. Só as cinco maiores empresas demitiram mais de 85.000 funcionários.
De acordo com o ranking das 500 marcas mais valiosas do Mundo em 2024, da agência Brand Finance, chamado de Global 500 Report, sete big techs (Apple, Microsoft, Google, Amazon, Samsung, TikTok e Meta/Facebook) estão entre as dez primeiras. A metodologia para cálculo deste ranking leva em conta o seguinte cálculo: “força da marca x taxa de royalties da marca x receitas da marca = valor da marca”. (Foto: / Gráfico: Poder 360)s
Por Henrique Acker (correspondente internacional)