Estudo revela que pobreza infantil no Brasil seria 12 vezes maior sem o Bolsa Família

Levantamento com base no Cadastro Único indica que, em vez de 670 mil (3,7%) das crianças de zero a seis anos em situação de vulnerabilidade, sem o programa, seriam 8,1 milhões (44,75%)

 

Um estudo inédito realizado pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) em colaboração com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal lançou luz sobre o impacto transformador do Bolsa Família. Os achados destacam que o programa reduz em 91,7% o percentual de crianças na primeira infância que vivem em famílias em condição de pobreza ou extrema pobreza, definida como renda mensal familiar de até R$ 218 por pessoa.

Os números mais recentes apontam que 670 mil (3,7%) crianças brasileiras de 0 a 6 anos de idade vivem em situação de extrema pobreza. No entanto, o estudo aponta que esse número poderia ser ainda mais preocupante, atingindo 8,1 milhões de crianças (44,75%) ou doze vezes mais, se não fosse a intervenção de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.

Desta forma, o programa desempenha um papel crucial na mitigação da pobreza infantil, conforme destacado pela secretária de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único, Letícia Bartholo. De acordo com o Censo de 2022, o país abriga aproximadamente 18,1 milhões de crianças nessa faixa etária.

O levantamento, intitulado “Perfil Síntese da Primeira Infância e Famílias no Cadastro Único”, utiliza dados de outubro de 2023 do Cadastro Único (CadÚnico), sistema que reúne informações das famílias de baixa renda no país. Dos 10 milhões de crianças de 0 a 6 anos registradas no CadÚnico, 55,4% são classificadas como vivendo em situação de vulnerabilidade.

Além disso, o estudo revela que 43% dos responsáveis por famílias com crianças nessa faixa etária não possuem nenhuma fonte de renda fixa, sendo o Bolsa Família a principal fonte de renda para 83% dessas famílias. A maioria das famílias é chefiada por mães solo, em sua maioria pardas e com idade entre 25 e 34 anos.

Em relação ao perfil das crianças, o estudo destaca que 11,1% são indígenas, 6,7% são quilombolas e 0,2% estão em situação de rua. Eliane Aquino, secretária Nacional de Renda de Cidadania, ressalta o potencial do Bolsa Família em equacionar as desigualdades do país, enfatizando a importância da criação do Benefício Primeira Infância.

O estudo também aponta disparidades regionais significativas. Por exemplo, enquanto o Nordeste concentra 72% das crianças registradas no CadÚnico, o Sudeste conta com uma proporção menor, com apenas 45% das crianças registradas. Mariana Luz, diretora da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, destaca a importância de uma política nacional integrada para abordar as necessidades específicas das famílias mais vulneráveis.

Por fim, o estudo faz um recorte municipal, evidenciando a falta de infraestrutura básica em muitas regiões. Por exemplo, 71% dos municípios na região Norte não possuem saneamento adequado, contrastando com os 20% na região Sudeste e os 9% no Nordeste. Esses dados, parte da série “Caderno de Estudos” do MDS, fornecem dados valiosos para a formulação de políticas públicas direcionadas à primeira infância no Brasil.

 

Programa de transferência de renda do Governo Federal tem atuação direta na redução da vulnerabilidade na primeira infância. (Foto: Lyon Santos/ MDS)

 

Uma das descobertas mais impactantes foi o potencial dos valores mais altos do benefício do Bolsa Família na redução da desnutrição de grávidas e crianças menores de 2 anos de idade. A pesquisa mostrou que aumentos nos valores do programa resultaram em melhorias nos indicadores nutricionais dessas crianças, incluindo aumento do peso ajustado por altura e redução da desnutrição crônica.

No entanto, o estudo também ressaltou que simplesmente aumentar os valores das transferências de renda não é suficiente para resolver o problema da pobreza infantil. É necessário priorizar cuidadosamente os beneficiários dos programas e considerar estratégias complementares para garantir o desenvolvimento integral das crianças.

Uma simulação de cenários demonstrou o impacto de diferentes desenhos de transferência de renda na redução da pobreza infantil. Além de analisar a redução da porcentagem de crianças em situação de pobreza, a pesquisa também avaliou o custo fiscal de implementação para cada estado, comparando-o com a receita estadual de arrecadação de impostos.

Em suma, o estudo enfatizou que políticas de transferência de renda são mais eficazes quando são concebidas com uma visão abrangente do desenvolvimento infantil e complementadas por outras medidas, como acesso à saúde, educação, assistência social e cultura. Políticas que incorporem condicionalidades e promovam a qualificação e ampliação dos serviços públicos de saúde, educação e assistência social são fundamentais para garantir resultados significativos.

Para compreender melhor o cenário, o estudo avaliou o impacto de transferências incrementais de renda para famílias já beneficiárias do Bolsa Família, sem a adição de novas condicionalidades. Ao explorar as regras descontínuas de recebimento do componente Bolsa Variável Jovem, os pesquisadores puderam mensurar o impacto de aumentar a renda dessas famílias. Os resultados mostraram uma redução estatisticamente significativa da desnutrição infantil em crianças menores de 2 anos. No entanto, análises adicionais ressaltaram que esse efeito não foi consistente em todos os anos da amostra, sugerindo que pequenos incrementos de renda sozinhos podem ter um impacto limitado na ausência de serviços de apoio.

(Foto: Márcia Foletto/Agência O Globo)

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