Publicação do Ipea estima ainda que os homicídios relacionados a proibição das drogas reduz a expectativa de vida dos brasileiros de 4, 2 meses.
O Brasil perde cerca de R$ 50 bilhões por ano com a proibição do uso de drogas e repressão ao tráfico, ou 0,77% do Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, cada brasileiro tem uma redução de 4,2 meses na sua expectativa de vida ao nascer por causa dos efeitos da principal política de segurança pública do país. A soma de todo o tempo de vida perdido devido a homicídios relacionados a drogas chega a 1,14 milhão de anos. Os dados, referentes a 2017, fazem parte de um estudo divulgado na quinta-feira (22), no Fórum de Segurança Pública, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), intitulado “Custo de bem-estar social dos homicídios relacionados ao proibicionismo das drogas no Brasil”.
A publicação trata dos efeitos da guerra às drogas nas vidas e nos recursos brasileiros. A ideia é contar os prejuízos assim como se faz com o impacto dos acidentes de trânsito no sistema de saúde, por exemplo. O texto considera o custo de bem-estar anual dos homicídios atribuídos ao proibicionismo para o Rio de Janeiro e São Paulo que é de 1,14% e 0,15%, respectivamente, do PIB dessas localidades. Ao regionalizar esses dados, as perdas no Estado do Rio de Janeiro equivalem a mais do que o dobro das estimadas em São Paulo. O levantamento argumenta que tais mortes representariam um custo intangível médio anual para cada cidadão fluminense de R$ 456,80, sendo de R$ 269,51 para o Brasil e de R$ 72,86 se levar em conta apenas os cidadãos paulistas.
De acordo com o pesquisador do Ipea responsável pelo estudo e conselheiro do Fórum, Daniel Ricardo de Castro Cerqueira, o modelo se baseia na ideia geral que a prevalência de homicídios afeta o consumo e a geração de renda não apenas das vítimas, mas de toda a sociedade, uma vez que essas vítimas indiretas terão suas chances de sobrevivência alteradas. “É como se cada brasileiro pagasse um imposto de R$ 269 por ano da guerra às drogas. É irracionalidade do ponto de vista humano e econômico”, afirma Cerqueira. Para ele, a violência está ligada justamente à proibição. “É o que chamamos de fatores sistêmicos: se a droga fosse legalizada, esses efeitos teriam dimensão muito menor.”
Cerqueira defende que a sociedade, policy makers e academia devem passar a debater seriamente alternativas ao problema das drogas. Um dos exemplos citados pelo estudo aponta os Estados Unidos, onde a violência é abandonada e substituída por ações mais inteligentes de natureza educacional, por políticas de redução de danos e por regulação e legalização dos mercados.
Expectativa de vida
Ao considerar a expectativa de vida condicional, em relação ao momento em que a morte prematura se deu, o texto calcula os anos de vida potenciais perdidos devido à morte por violência intencional atribuída a questão das drogas. Ao fazer o cálculo agregado para o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasil, os fluminenses perderam 153.000 anos de vida potenciais, enquanto os paulistas perderam 64.000 e os brasileiros perderam 1.148.000 anos de vida potenciais.
A pesquisa considera as mortes violentas intencionais associados a drogas em 2017 com base em estudos do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, que observaram boletins de ocorrência, e em dados da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo. Na região metropolitana do Rio de Janeiro, 46,6% das mortes intencionais são relacionados a questões de drogas. No estado de São Paulo, o índice chega a 27,7%. Considerando o total de homicídios atribuídos à questão das drogas, no país a perda de expectativa ao nascer foi estimada em 4,2 meses. Quando observado só o Rio de Janeiro, a redução é ainda maior: 7,4 meses.
No estudo, ressalta-se que esses números podem ser ainda maiores, se feito o recorte por gênero, uma vez que a maioria das vítimas no país é do sexo masculino. Já os valores estimados da perda de dinheiro, segundo o pesquisador, abrangem, por exemplo, a estimativa de renda que a pessoa teria ao longo da vida. Defensor das políticas de redução de danos, Cerqueira afirma que as drogas geram problemas para os usuários e suas famílias, mas que o caminho de tratamento é pela saúde. “Se formos comparar os efeitos, é muito mais gente que morre pelo proibicionismo do que pela droga em si”, afirmou.
Em valores de 2017, a perda de bem-estar econômico devido a mortalidade associada à violência nas dinâmicas que envolvem drogas ilícitas no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasil foi de R$ 7,6 bilhões, R$ 3,3 bilhões e R$ 50,9 bilhões, respectivamente. Tais valores equivaleriam a um imposto intangível que cada fluminense, paulista e brasileiro pagaria anualmente de R$ 457, R$ 73 e R$ 269,5.
(Foto: Bruno Santos/FolhaPress)