Eleição em Portugal: Extrema-direita pode ser o fiel da balança

No ano em que se comemora cinco décadas da Revolução dos Cravos (25 de abril de 1974), os portugueses vão às urnas no próximo domingo, 10 de março, para eleger um novo governo. A maioria das pesquisas dá vitória à Aliança Democrática (AD), que reúne o Partido Social-Democrata, o CDS e o Partido Popular Monárquico.

No entanto, se confirmadas as sondagens eleitorais, nenhum partido de direita ou de esquerda terá maioria na Assembléia da República. Por isso, apesar das juras de que não fará acordos com a extrema-direita, a AD deve precisar dos deputados do Chega para governar, ainda que conte apenas com apoio parlamentar daquele partido.

 

Briga pelo voto conservador

Para não depender da extrema-direita, a AD apela ao voto útil na reta final de campanha, procurando esvaziar a votação do Chega, que aparece nas pesquisas com 14% a 18% da preferência dos entrevistados (terceiro partido mais citado).

Apesar das juras de Luís Montenegro – líder do PSD – de que a AD não tem qualquer trato com a extrema-direita, é sabido que os dois partidos mantêm contatos, como admite Rui Gomes da Silva, antigo dirigente do PSD, que defende abertamente o acordo.

André Ventura (Líder do Chega) insiste que só pode existir governo de direita com a participação de seu partido. Até recentemente houve um acordo entre PSD e Chega para o governo regional da Ilha da Madeira.

Em debate entre os candidatos, Pedro Nuno Santos (líder do PS) admitiu até mesmo que a bancada de seu partido pode se abster, viabilizando a formação de um governo da AD, caso a direita vença e não convide a extrema-direita para compor o ministério. No entanto, Luís Montenegro (AD) não respondeu se faria o mesmo, caso os socialistas vençam a eleição.

 

Só um acordo leva esquerda ao governo

À esquerda, a única possibilidade de formar governo é com uma vitória do Partido Socialista, que esteve no poder nos últimos oito anos. Ainda assim, os moderados do PS terão que contar com a participação ou apoio dos demais partidos da esquerda (Bloco de Esquerda, PCP, e Livre) e do Partido dos Animais e da Natureza (PAN).

Seria uma nova versão da “Geringonça”, como ficou conhecido o governo do PS e o Bloco de Esquerda (com apoio parlamentar do PCP), entre 2015 e 2019. Foram anos de recuperação da economia, com o aumento médio dos salários, das aposentadorias, do emprego, incremento nos investimentos públicos e redução dos juros bancários.

Os dirigentes do Partido Socialista têm razões para não confiar nas pesquisas eleitorais. Na eleição de 2022 as sondagens davam empate técnico entre PS e PSD, mas o resultado foi uma vitória esmagadora dos socialistas, que obtiveram maioria absoluta na Assembleia da República.

A outra possibilidade (remota) da esquerda chegar ao governo é que a AD, mesmo contando com a Iniciativa Liberal – uma espécie de Partido Novo de Portugal – não chegue a  um acordo com o Chega. Portanto, a tendência é que a extrema-direita seja o fiel da balança deste processo eleitoral.

 

Reta final de campanha

Nos últimos dias, os partidos intensificaram os comícios e as caminhadas pelas ruas das principais cidades portuguesas.

A AD ressuscitou velhas raposas conservadoras da direita, muitas das quais ligadas ao trágico governo da troika (2011 a 2015). Naquela época os social-democratas e o CDS governaram Portugal com a supervisão direta de representantes do FMI, do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia.

Entre as medidas mais sentidas pelos portugueses no governo da troika destacam-se a redução e congelamento do valor das aposentadorias, subsídios e salários, corte nos investimentos em educação e saúde, além de aumentos de impostos que incidiam diretamente sobre os preços da maioria dos produtos e serviços.

Já a Iniciativa Liberal insistiu que para derrotar o PS é preciso mais do que as meias medidas do programa da AD. O partido quer a redução de impostos para as empresas e uma presença da iniciativa privada em todas as esferas da vida pública, inclusive na saúde e na educação.

A extrema-direita não apelou ao seu discurso preconceituoso contra os imigrantes e insiste na necessidade de um acordo de governo com a AD. Em discurso de campanha, André Ventura chegou a afirmar que, caso seja primeiro-ministro, não permitirá a entrada do presidente Lula no país para as comemorações da Revolução de 25 de Abril.

Os socialistas apelaram à mobilização e ao voto dos mais velhos, os mais prejudicados com o governo de direita, dos tempos da troika. O Bloco de Esquerda alertou que qualquer acordo à esquerda passa pela questão da moradia, que atinge a todos os portugueses, dos mais idosos aos mais jovens.

 

Indecisos podem definir a eleição

Cabe lembrar que a eleição foi antecipada em função da demissão do primeiro-ministro socialista António Costa, a partir das investigações da chamada Operação Influencer, movida pelo Ministério Público. As acusações ligam um ministro e assessores do governo a grupos privados, supostamente beneficiados em contratos de exploração de lítio e hidrogênio, além da criação de um data-center.

As apurações seguem, em meio a uma nuvem de dúvidas que paira sobre a comprovação das acusações de envolvimento direto ou não do antigo primeiro-ministro com as irregularidades apontadas nas investigações.

No sistema parlamentarista, cada eleitor dá o seu voto a um partido. Cabe aos partidos indicar seus cabeças de chapa em cada distrito, para compor as bancadas partidárias na Assembleia da República.

A novidade desta eleição é o elevado percentual de eleitores indecisos, às vésperas da votação. Em todas as pesquisas eles aparecem entre 15% a 20% dos entrevistados.

Milhares de brasileiros com cidadania portuguesa, residentes ou não em Portugal, podem votar nas eleições para a Assembleia da República, desde que estejam com sua situação regularizada junto à Comissão Nacional de Eleições (CNE).

Na imagem, André Ventura, líder do partido de extrema direita “Chega”. (Foto: Patricia de Melo Moreira)

 

Por Henrique Acker (correspondente internacional)

 

 

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