A jornalista Bia Cardoso, do portal Opinião em Pauta, traz hoje o drama dos paraenses que enfrentam longas filas e tempo de espera para tentar o benefício da aposentadoria do INSS. Além do acúmulo de informações de quem viveu o dia a dia da reportagem no sudeste do Pará, Bia agora atua na comunicação parlamentar onde mergulha nos números para mostrar não as filas ou as histórias de quem tentou mais de uma vez e não conseguiu. Mas as causas que impedem muitos brasileiros de viver com mais dignidade sobretudo camponeses.
Para mostrar a situação de agricultores familiares, uma das categorias mais afetadas pelo aumento do tempo de espera na fila do INSS, Bia foi buscar números que revelam um Pará rural distantes dos serviços públicos, concentrados nas áreas urbanas, famílias que não conseguem exercer esse direito nem quando estão doentes. Em 11 anos, o INSS negou mais de 20 milhões de pedidos de auxílio-doença fora as aposentadorias.
Leiam o artigo de Bia Cardoso (foto abaixo)
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Dificuldades de camponeses no acesso a Aposentadoria Rural no Pará
Por Bia Cardoso
Por que o estado do Pará tem um dos menores índices de concessão de aposentadorias rurais no Brasil? Essa realidade reflete uma série de desafios enfrentados pelos segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), incluindo a burocracia, a dificuldade de comprovação da atividade rural e a falta de acesso à informação.
Uma pesquisa conduzida pela acadêmica da Universidade de Brasília, Roseli Maria, resultou no lançamento do livro, O Lugar das Mulheres Camponesas na Luta pelo Acesso à Previdência Social em Anos Recentes da editora Dialética. A obra revela que, apesar da aposentadoria rural ser uma conquista, ela ainda está distante da realidade de muitas mulheres camponesas. O estudo analisou dados gerais, mas a situação do Pará se destaca pelo alto nível de exclusão. No ranking nacional, o estado lidera em negativas de concessão do benefício.
As Causas da Exclusão Previdenciária no Pará
Para compreender esse cenário, é necessário analisar as causas na origem dos problemas que geram à exclusão previdenciária. Isso envolve fatores estruturais, econômicos e sociais como:
A informalidade no Mercado de Trabalho
O Pará tem uma elevada taxa de trabalhadores informais: 2,3 milhões. São pescadores, extrativistas, pequenos agricultores, feirantes e trabalhadores domésticos. Muitos não contribuem para a Previdência Social por falta de conhecimento, dificuldades financeiras ou desconfiança no sistema.
Baixa Renda e Condições de Trabalho Precarizadas. As Comunidades ribeirinhas e áreas rurais enfrentam grandes dificuldades econômicas, tornando inviável o pagamento das contribuições previdenciárias.
Dificuldade de Acesso à Informação e Serviços Previdenciários: Muitas pessoas desconhecem seus direitos e os procedimentos para se tornarem seguradas. Além disso, cidades do interior carecem de agências do INSS, dificultando o atendimento e a regularização.
Migração Sazonal de Trabalhadores: Trabalhadores que atuam na colheita de açaí cuja safra é julho e dezembro, a pesca, o plantio de vazantes passam longos períodos sem renda fixa, o que leva muitos a migrar para os centros urbanos ondem buscam outras atividades temporárias.
Desconfiança e Burocracia do Sistema Previdenciário
As constantes mudanças nas regras da Previdência Social e a dificuldade de acesso aos benefícios aumentam a desconfiança, afastando trabalhadores da formalização. Muitos temem contribuir por não confiarem que, no futuro, terão acesso aos benefícios públicos, especialmente pelo déficit que a previdência tem em função dos gastos que aumentam e as contribuições não acompanham esse crescimento.
Falta de Políticas Públicas e Fiscalização: A ausência de políticas eficazes para inclusão previdenciária dos trabalhadores informais e a baixa fiscalização do cumprimento dos direitos previdenciários em setores como construção civil e agronegócio agravam o problema.
Esses fatores fazem com que muitos paraenses cheguem à velhice sem acesso à aposentadoria ou outros benefícios, aumentando sua vulnerabilidade social.
Dificuldades na Análise dos Benefícios
Mas a grande vilã da exclusão previdenciária é a dificuldade na análise dos benefícios. Os dados apontados no estudo dirigido pela Universidade de Brasília (UNB) relevam que, quando um segurado dá entrada no pedido de aposentadoria rural, o pedido cai no sistema e, a partir de então, a análise é feita por técnicos do INSS, muitas vezes localizados no Rio Grande do Sul. Esse distanciamento da realidade amazônica prejudica o reconhecimento dos direitos dos trabalhadores paraenses. Atualmente, cerca de 25% dos benefícios rurais só são concedidos por meio de ação judicial, o que torna o processo judicializado e ainda mais longo e oneroso para os segurados.
Esses fatores atestam que nos últimos anos, houve um aumento significativo no número de indeferimentos de solicitações de benefícios do INSS em âmbito nacional. Por exemplo, entre 2021 e 2022, os indeferimentos automáticos de um dos benefícios aumentaram em 754%, ou seja, 416,7 mil benefícios em todo o país não conseguiram se aposentar.
Soluções Possíveis
O tema irá trazer a Previdência para o centro dos holofotes, no Senado Federal que já estuda a matéria e considera que, reverter esse cenário, é fundamental para ampliar o acesso a aposentadoria e tornar os processos mais ágeis e acessíveis. Uma das medidas em debate seria a possibilidade legal de regionalização da análise dos benefícios, uma alternativa em estudo pelo gabinete do senador Beto Faro (PT), que acredita ser possível garantir maior inclusão previdenciária considerando as especificidades regionais. Algumas medidas incluem critérios adaptados à realidade local como: o reconhecimento de atividades típicas da região, a pesca artesanal, o extrativismo e agricultura familiar que facilitam a comprovação da atividade para fins previdenciários.
Definição de Alíquotas Diferenciadas: Pequenos agricultores e microempreendedores poderiam contar com alíquotas mais acessíveis, considerando a sazonalidade do trabalho. Uso de Dados Socioeconômicos Regional como: Indicadores locais de renda, informalidade e acesso a serviços previdenciários ajudariam a flexibilizar exigências documentais.
Ampliação do Atendimento Presencial e Digital: Municípios isolados poderiam contar com atendimento móvel ou parcerias com prefeituras para facilitar o acesso ao INSS. O reconhecimento da Cultura Previdenciária Local, Comunidades tradicionais (quilombolas, indígenas, ribeirinhas) poderiam contar com métodos alternativos de comprovação de atividade, como reconhecimento por lideranças comunitárias ou sindicatos locais.
A implementação dessas mudanças poderia garantir que trabalhadoras e trabalhadores rurais, especialmente mulheres camponesas, tenham acesso ao direito constitucional da aposentadoria, reduzindo as desigualdades e promovendo maior justiça social no estado do Pará.