Parlamentares recriam foto histórica nos 35 anos da Constituição Federal  

Esquerdistas e bolsonaristas posaram na rampa de acesso à sede do Parlamento em homenagem à “bancada do batom”. Foto original foi feita na promulgação da Constituição Federal, em 1988, e marcou a aliança suprapartidária das deputadas constituintes para garantir direitos às mulheres

 

Na semana em que a Constituição Federal completa 35 anos da sua promulgação, as bancadas femininas da Câmara e do Senado recriaram a foto histórica da chamada “bancada do batom”, feita, à época, na rampa do Congresso Nacional, pelas mulheres que participaram da Assembleia Constituinte, entre 1987 e 1988, nos trabalhos que culminaram na elaboração da Constituição Federal. A “bancada do batom” foi a aliança suprapartidária entre senadoras e deputadas constituintes para garantir e ampliar os direitos das mulheres na Carta Magna.

Na Assembleia Constituinte, dos 559 integrantes, apenas 26 eram mulheres, ou seja, 5% do total. Atualmente, a bancada feminina na Câmara tem 90 deputadas, o que representa aproximadamente 18% das cadeiras; e no Senado 15 parlamentares, o que também representa aproximadamente 18% das cadeiras. Duas deputadas constituintes ainda estão no Parlamento hoje: Benedita da Silva (PT-RJ) e Lídice da Mata (PSB-BA). Mas a foto contou ainda com a presença das constituintes Moema São Thiago e Raquel Cândido.

O registro contou com a participação, por exemplo, de Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS), ambas alinhadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e de Bia Kicis (PL-DF) e Carla Zambelli (PL-SP), duas das mais ferrenhas defensoras do ex-chefe do Executivo Jair Bolsonaro (PL). Ao todo, mais de 50 parlamentares estiveram presentes no tributo às constituintes.

Atual coordenadora da bancada feminina da Câmara, Benedita da Silva destaca que a ampliação no número de deputadas é resultado da luta das mulheres pela inclusão delas na política. Segundo ela, a luta da bancada feminina só se ampliou desde a Constituição. “Quando nós lutamos pelos direitos das mulheres, estamos lutando pelos direitos dos demais, porque direito das mulheres equivale a direitos humanos”, afirma. “Nós somos maioria da população brasileira e mãe dos outros. Então, nossas bandeiras são todas as bandeiras. Nós estamos debatendo e discutindo todos os temas, porque todos os temas nos pertencem”, acrescentou.

À época da Constituinte, a parlamentar carioca era a única mulher negra. Passadas mais de três décadas, somente nas últimas legislaturas é que houve uma diversidade maior das deputadas e senadoras.

A deputada Lídice da Mata acredita que a participação das mulheres na Assembleia Constituinte mudou a própria política, além de sido transformadora para os direitos da mulher. “Começou no artigo 5º, quando considera que homens e mulheres são iguais diante da lei, com direitos e deveres iguais. Essa foi a primeira vez que uma Constituição na história do Brasil registrou esse fato”, frisou. “E a partir daí em todos os capítulos ou em quase todos se introduz algo vinculado aos direitos da mulher”, completou.

Jandira Feghali destacou a importância da participação das mulheres na luta. “Subimos a rampa do Congresso Nacional para demonstrar nossa força na luta pelos direitos das mulheres. Somos muitas vozes, unidas por todas. Nada sobre nós, sem nós”, disse a parlamentar. Já a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) afirmou que irá continuar lutando ao lado das parlamentares pelos direitos das mulheres brasileiras e destacou o desejo de ver o crescimento a cada eleição da bancada feminina. “Esperamos que nosso time cresça ainda mais”, reforçou.

Para a deputada Juliana Cardoso (PT-SP), uma das integrantes da inédita Bancada do Cocar, formada por representantes de povos indígenas, “o Movimento Lobby do Batom é uma força transformadora que desafia as barreiras de gênero e contribuiu significativamente para a inclusão das mulheres na política brasileira”. “Sua luta incansável resultou na criação de políticas públicas e leis que promovem a igualdade de gênero e coíbem a violência contra as mulheres. Celebrar os 35 anos desse movimento é reconhecer a coragem e a determinação das mulheres que abriram caminho para uma sociedade mais justa e igualitária”, comentou.

Em seu primeiro mandato, a deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) celebrou a participação na recriação da foto histórica. Além do aumento da bancada, Daiana celebrou a diversidade existente. Pela primeira vez, o Parlamento conta com deputadas assumidamente lésbicas, deputadas trans, além do aumento da bancada negra. “A foto atual contou com uma diversidade maior, só que não queremos que ela pare por aqui. Além de lutarmos por mais espaços de poder para mulheres, estaremos lutando contra a PEC 9, que pretende retirar os direitos de nós, mulheres negras no sistema político. Temos esse desafio da ampliação. 88 foi um marco. A presença dessas mulheres na Constituinte simbolizou uma mudança na política do Brasil e foi essa mudança que me trouxe até aqui. E esse momento histórico, que me faz ainda mais feliz, também reforça a luta pelas mudanças reais na política e para criarmos uma sociedade com um olhar mais atonto para as mulheres negras, indígenas”, pontuou.

Entre as conquistas femininas na Constituição estão a licença-maternidade de 120 dias e o direito a creche para a criança. No capítulo da família, foi eliminada a figura do homem como chefe da relação conjugal. Também foi estabelecido o dever do Estado de coibir a violência doméstica e familiar, o que forneceu a base para a formulação da Lei Maria da Penha, em 2006. Para as mulheres rurais, foi garantido o direito à titularidade da terra, e, para as mulheres presidiárias, o direito de amamentar os filhos.

Além disso, a Constituição assegurou alguns direitos para as trabalhadoras domésticas, como o direito ao salário mínimo, descanso semanal e férias remuneradas, efetivado apenas em 2013, com a PEC das Domésticas; e estabeleceu a proibição de diferença salarial entre homens e mulheres, regulamentado apenas 2023, no governo Lula.

Documento histórico

O grupo produziu a “Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes”, entregue ao presidente da Assembleia Nacional Constituinte, o deputado Ulysses Guimarães. O documento afirmava que “para nós, mulheres, o exercício pleno da cidade significa, sim, o direito à representação, à voz e à vez na vida pública, mas implica, ao mesmo tempo, a dignidade na vida cotidiana, que a lei pode inspirar e deve assegurar o direito, à educação, à saúde, à segurança, à vivência familiar sem traumas. O voto das mulheres traz consigo essa dupla exigência: um sistema político igualitário e uma vida civil não autoritária”.

“Nós, mulheres, estamos conscientes que este país só será verdadeiramente democrático e seus cidadãos e cidadãs verdadeiramente livres quando (…) for garantido igual tratamento e igual oportunidade de acesso às ruas, palanques, oficinas, fábricas, escritórios, assembleias e palácios”, diz outro trecho do documento.

A partir da atuação das parlamentares constituintes da sociedade brasileira, houve uma série de direitos assegurados na Constituição, como a licença-maternidade de 120 dias e o direito à creche para crianças. “No capítulo da família, foi eliminada a figura do homem como chefe da relação conjugal. Também foi estabelecido o dever do Estado de coibir a violência doméstica e familiar, o que forneceu a base para a formulação da Lei Maria da Penha, em 2006. Para as mulheres rurais, foi garantido o direito à titularidade da terra, e, para as mulheres presidiárias, o direito de amamentar os filhos”, informa a Agência Câmara de Notícias.

Entretanto, um dos direitos previstos na Carta Magna foi assegurado somente em 2023. Trata-se da equidade salarial entre mulheres e homens, sancionada este ano pelo presidente Lula. A lei foi um compromisso assumido por Lula durante a campanha.

A foto clicada nesta quarta-feira e o registro histórico, feito há 35 anos — (Fotos de Brenno Carvalho e do arquivo da Câmara)

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