Delação de Mauro Cid: Bolsonaro tentou esconder alvos da PF no Alvorada

Mauro Cid teria dissuadido Bolsonaro da ideia, sob o argumento de que isso poderia lhe acarretar problemas sérios perante o STF

 

O tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, disse em depoimento que faz parte do acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal (PF), que o ex-presidente tentou esconder na residência oficial, o Palácio do Alvorada, dois blogueiros que foram alvos de mandados de prisão expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com Cid, a intenção era impedir que Oswaldo Eustáquio e Bismark Fugazza fossem presos. A informação foi divulgada colunista Aguirre Talento, do UOL, que teve acesso a um novo trecho da delação do militar e principal ajudante de ordens do ex-presidente.

Os dois são apontados como integrantes do chamado gabinete de ódio do ex-capitão e se tornaram alvos da PF por incentivo aos ataques antidemocráticos. Fugazza é um dos donos do canal de humor de direita Hipócritas e foi preso no Paraguai em março com o cantor gospel Salomão Vieira. Em junho, o humorista foi colocado em liberdade. Eustáquio já havia sido preso em 2020 por envolvimento com atos antidemocráticos e, no final do ano passado, teve uma nova ordem de prisão decretada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes. Ele fugiu para o Paraguai e a polícia do país vizinho busca prendê-lo. A última tentativa foi no dia 16 de setembro.

Corrobora com o relato de Cid o fato de que, no dia 12 de dezembro do ano passado, quando bolsonaristas atacaram a sede da PF em Brasília, Eustáquio e Fugazza estiveram no Alvorada. Segundo Cid, foi neste momento que Bolsonaro teria feito o pedido para refugiar os aliados na residência oficial diante de uma iminente ordem de prisão contra eles. A ordem, de fato, foi expedida poucas horas depois. O próprio advogado do blogueiro, naquele período, disse que o seu cliente foi ao Alvorada para se esconder da polícia. O próprio blogueiro narrou o episódio nas redes sociais e pediu aos correligionários doações via Pix.

De acordo com a reportagem, Cid relata ter pessoalmente convencido Bolsonaro a não fornecer abrigo aos criminosos, já que poderia “arrumar problemas com o STF”. O ex-capitão ordenou então, segundo Cid, que um carro oficial fosse usado para transportar Eustáquio para transportar Eustáquio para outro ponto, com objetivo de dificultar o rastreamento do blogueiro pela PF. Mais tarde, Eustáquio e Fugazza fugiram para o Paraguai.

Apoiadores do ex-presidente registraram a entrada dos dois em vídeo e comemoraram o episódio. A PF investiga se eles instigaram, ajudaram e financiaram atos antidemocráticos em 2022. Mauro Cid foi preso pela Polícia Federal no dia 3 de maio, durante as diligências da Operação Venire, que coletava provas sobre uma fraude nos cartões de vacinação de Bolsonaro e sua filha mais nova, Laura. Depois disso, o ex-ajudante de ordens foi vinculado a outra investigação contra o ex-presidente, o caso das joias sauditas.

A PF suspeita que Bolsonaro coordenava e se beneficiava de um esquema internacional de venda de presentes de alto valor que ganhou em agendas oficiais. Entre eles, está um Rolex cravejado de diamantes que foi recomprado pelo advogado Frederick Wassef. Um dos presentes vendidos é uma estatueta de coqueiro, que teria sido negociada por Mauro Cid e seu pai, o general Mauro Cesar Lourena Cid. O reflexo do general aparece nas fotos que ele tirou da caixa do objeto para enviar ao filho.

Os termos totais da delação de Mauro Cid permanecem em segredo de Justiça, mas alguns pontos já foram revelados. O acordo o colocou em liberdade, mas ele cumpre restrições, como usar tornozeleira eletrônica, não poder ter redes sociais e ter que se recolher em casa. O ex-ajudante de ordens teria dito que Bolsonaro é o mandante da fraude nos cartões de vacinação e que o ex-presidente recebeu, em mãos, dinheiro vivo oriundo da venda das joias. Até o momento, Bolsonaro é investigado. Não há ação penal contra ele por causa de nenhum desses episódios. Os advogados do ex-presidente tentaram ter acesso ao acordo de colaboração, mas não tiveram êxito.

(Foto: Adriano Machado/Reuters)

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