CPMI dos atos golpistas se encerra nesta semana sem ouvir principais alvos

Relatora da Comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA) apresentará a conclusão dos trabalhos do colegiado na quarta-feira. Organizações da sociedade civil entregam sugestões para relatora na tarde desta segunda (14)

 

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas de 8 de janeiro chega ao fim nesta terça-feira (17). A relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), vai apresentar o relatório com a conclusão dos trabalhos realizados pelo colegiado ao longo de pouco mais de cinco meses, com votação do texto prevista para quarta-feira (18). As expectativas de um desfecho conclusivo são poucas, devido a muito bate-boca e poucos avanços durante o processo.

Está previsto que ainda nesta segunda-feira (14) grupos da sociedade civil realizem um movimento no Senado para pedir a inclusão de militares entre os indiciados no parecer final. Uma comitiva de organizações da sociedade civil com associações, como Pacto pela Democracia, Instituto Vladimir Herzog, Democracia em Xeque, Nossas, INESC e Coalizão Verdade, Memória e Justiça, realizam um ato em Brasília para apresentar contribuições ao relatório final da CPMI. Um documento produzido coletivamente será entregue à senadora nesta tarde que vai avaliar os pedidos.

São contribuições, divididas em três frentes: Educação midiática e cidadã, Forças Armadas e Regulação das plataformas de Mídias Sociais. “É importante reformular o papel das Forças Armadas, limitando-as à Defesa Nacional e proibir sua atuação sem convocação dos poderes constitucionais, restringir candidaturas de membros das Forças de Segurança, criar um Grupo de Trabalho para avaliar o Judiciário Militar”, diz o grupo no documento.

A relatora tem dito que ainda prepara o seu parecer e evita adiantar quais nomes apontará como culpados pelos atos golpistas que destruíram as sedes dos três Poderes. Integrantes da base do governo, contudo, afirmam haver elementos suficientes para pedir à Procuradoria-Geral da República (PGR) o indiciamento de Bolsonaro como o mentor intelectual dos ataques.

Nos mais de 120 dias desde a instalação da comissão, em 23 de maio, o grupo ouviu 21 depoentes e recebeu mais de 660 documentos sigilosos e ostensivos, mas o volume de informações não foi suficiente para os parlamentares chegarem, de forma concreta, ao objetivo proposto: encontrar os responsáveis por ações e omissões que levaram aos atos de vandalismo nos prédios dos Três Poderes.

Os planos da relatora, no início da comissão, eram investigar, principalmente, a atuação do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres; dos órgãos de segurança pública da União e do Distrito Federal; do tenente-coronel Mauro Cid; e das Forças Armadas. De acordo com Eliziane, à época, a intenção era que o primeiro depoimento fosse de Torres, mas, em 20 de junho, os parlamentares ouviram o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques, acusado de ordenar blitzes no Nordeste, no segundo turno das eleições de 2022, com o objetivo de impedir eleitores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de chegarem aos locais de votação.

Vasques compareceu à CPMI após a aprovação de um requerimento protocolado pela própria relatora e negou que a PRF tenha agido para impedir petistas de votarem. Torres que, de acordo com o plano de trabalho apresentado por Eliziane, seria o primeiro a ser ouvido, só apareceu no plenário mais de um mês após o início das oitivas. Nesse intervalo, o colegiado inquiriu Valdir Pires Dantas Filho, perito responsável pela elaboração do laudo da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) relativo ao episódio da bomba no Aeroporto de Brasília em 24 de dezembro de 2022; George Washington de Oliveira Sousa, condenado por participar do atentado; o perito da PCDF Renato Martins Carrijo; o delegado Leonardo de Castro, diretor de Combate à Corrupção e Crime Organizado da PCDF; o ex-comandante de Operações da Polícia Militar do DF coronel Jorge Eduardo Naime; o coronel do Exército Jean Lawand Junior; e o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Saulo Moura da Cunha.

A CPMI, desde o início, também pretendia investigar os episódios que ocorreram em dezembro de 2022, como o da bomba no aeroporto, os acampamentos em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, os ataques na capital no dia 12 daquele mês e os bloqueios de estradas feitos por caminhoneiros bolsonaristas, após o segundo turno das eleições. Segundo a linha do tempo apresentada por Eliziane, diversas vezes, ao longo das oitivas, esses momentos fazem parte de uma trama golpista que culminou nos atos de vandalismo de 8 de janeiro. Entretanto, a condução dos trabalhos se perdeu conforme os depoimentos foram prestados e deixou se levar pelo que cada depoente apresentou, perdendo o foco.

O colegiado tentou conseguir informações novas sobre o atentado no Aeroporto de Brasília, mas esbarrou na investigação da Polícia Federal, que não demorou em esclarecer os fatos e indiciar os envolvidos. Nas últimas semanas de trabalho da CPMI, os integrantes do grupo ainda ouviram o blogueiro Wellington Macedo de Souza, acusado de planejar a explosão do artefato, mas não obteve avanço significativo, o que acarretou no cancelamento da reunião em que seria ouvida outra figura da tentativa de explosão, o extremista Alan Diego dos Santos Rodrigues.

Para ajudar na elucidação dos fatos, a CPMI chegou a receber parecer favorável da advocacia do Senado para firmar acordos de delação premiada. Essa possibilidade tomou conta dos discursos dos membros do colegiado, mas não vigorou por falta de interesse dos depoentes. O presidente da comissão, deputado Arthur Maia (União-BA), também desencorajou a utilização do instrumento, por não existir possibilidade de manter a delação em sigilo. Ao fim, esse debate configurou mais uma derrota para o grupo.

Passados estes cinco meses, a CPMI dos Ataques Golpistas de 8 de janeiro chega ao fim nesta semana com a frustração de não ter ouvido os depoimentos dos principais alvos inicialmente apontados por governistas — o ex-presidente Jair Bolsonaro — e oposicionistas — o ministro da Justiça, Flávio Dino. Agora, a previsão de parlamentares é que as próximas sessões sejam marcadas pela guerra de pareceres, com a disputa pela aprovação do relatório oficial, de Eliziane, ou do paralelo, do deputado bolsonarista Alexandre Ramagem (PL-RJ). Há ainda um terceiro parecer do senador Izalci Lucas (PSDB-DF).

(Foto: Lula Marques)

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