Ministro da Justiça afirma que o Congresso Nacional precisa definir mecanismos de controle das big techs para coibir disseminação de discursos de ódio, ataques à democracia e incitação à automutilação
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, defendeu nesta quarta-feira (13) a regulação das plataformas digitais por meio do Congresso Nacional. Durante audiência pública da Comissão de Comunicação e Direito Digital (CCDD), Dino classificou o controle das empresas de internet como “um desafio inevitável e inafastável”. “É falsa a antinomia (contradição) entre quem defende regulação e quem defende liberdade de expressão. Isso é uma falácia. Na verdade, quem defende a regulação defende a liberdade de expressão, que em nenhum país do mundo significa vale tudo”, argumentou..
“Liberdade de expressão é sempre regulada. Sempre, em qualquer país do planeta Terra. A família é regulada, o casamento é regulado, mas as plataformas digitais não podem ser reguladas em nome da privacidade? Isso é um paradoxo, uma contradição que não se sustenta de pé. Esse desafio de regulação é inevitável, é inafastável”, complementou.
O ministro da Justiça foi convidado para discutir as diretrizes do Poder Executivo na área de Direito Digital. O presidente da CCDD, senador Eduardo Gomes (PL-TO), defendeu a harmonização de temas como políticas, legislação e regulamentação do direito digital. “Consideramos que a interlocução entre governo e Congresso Nacional facilita a criação de políticas públicas que garantam direitos e deveres dos usuários, empresas e governos, além de promover a transparência e a participação democrática no processo decisório que envolve o uso da tecnologia e da internet”, justificou o parlamentar no requerimento de audiência pública.
Durante a reunião, Flávio Dino defendeu especificamente a aprovação do projeto de lei (PL) 2.630/2020, do senador Alessandro Vieira (MDB-SE). Conhecido como PL das Fake News, o texto regula a transparência nas redes sociais e serviços de mensagens privadas, além de reforçar a responsabilidade dos provedores pelo combate à desinformação. Aprovada pelo Senado em julho de 2020, a matéria aguarda deliberação da Câmara dos Deputados. “Nós queremos um ambiente digital que seja íntegro, seguro e confiável. Em relação a esses três atributos, não há clivagem ideológica. Não importa se a pessoa trafega mais à direita ou à mais esquerda. Todos nós queremos que a internet a que nossos filhos, netos, sobrinhos, crianças e adolescentes têm acesso seja saudável e propague bons valores, boas informações”, disse o ministro.
A pasta encaminhou ao relator do PL 2.630/2020 na Câmara, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), uma série de sugestões para aperfeiçoar o texto. Entre elas, a previsão de que as plataformas revelem os critérios de estruturação dos algoritmos usados para a disseminação de conteúdos. Dino incluiu na lista de projetos que têm apoio do governo o PL 2.628/2022, também do senador sergipano, que garante proteção a crianças e adolescentes em ambientes digitais. “Entre tantas preocupações, as crianças devem sempre estar na frente, pois são o público mais vulnerável”, completou Dino.
O senador Fabiano Contarato (ES), líder do PT no Senado, criticou o que classificou como “conduta extremamente permissiva e omissa” das plataformas com relação aos discursos de ataque à democracia, fomento à violência e, até mesmo, de estímulo à automutilação. Para ele, o Congresso Nacional precisa dar uma resposta para a sociedade. “É necessário que tenhamos a percepção de que se a sua opinião fere, dói, machuca ou mata, você não tem liberdade para expressá-la. É simples assim”, disse. “Que elas [plataformas] tenham sua responsabilidade elencada e explicitada quando permitem a veiculação [de discurso de ódio] e nada fazem contra isso. É necessário que esta Casa dê uma resposta à sociedade. Temos o dever constitucional de legislar.”
A senadora Augusta Brito (PT-CE) exemplificou como o discurso de ódio que transita no meio digital afeta diretamente a vida de milhares de mulheres, diariamente, principalmente por meio da prática da violência política. “O ambiente virtual se entrelaça com casos de violência, disseminação de fake news e os casos de violência política que penalizam, sobretudo, as mulheres. Quando a gente vê um crime de violência sexual ou fake news exploradas no ambiente digital, as maiores vítimas são as mulheres. Essa é a nossa realidade, infelizmente”, lamentou a senadora.
Em resposta, Flávio Dino relatou que o ministério encaminhou farto material coletado pela sua equipe para que a Polícia Federal instaurasse inquérito para investigar o que classificou como “indústria que afasta as mulheres da política”. “Há semanas vêm correndo pelas redes sociais mensagens falando sobre ‘estupro corretivo’. Os moderadores de conteúdo, os filtros, os algoritmos não estão vendo isso? Isso está acontecendo com vereadoras, prefeitas, deputadas estaduais, deputadas federais, senadoras. As plataformas conseguem filtrar uma imagem de nudez, mas não conseguem filtrar esse tipo de mensagem? É algo espantoso”, enfatizou Dino.
Para Flávio Dino, as empresas “querem posar de guardiãs da liberdade de expressão”. Mas devem ser responsabilizadas por conteúdos que estimulem a prática de crimes contra crianças e adolescentes, racismo, violência contra a mulher, infração sanitária e instigação ao suicídio.
(Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)