Em três anos, 15.101 vítimas com até 19 anos foram assassinadas e 164.199 foram assassinadas, mostra relatório do Unicef e Fórum Brasileiro de Segurança
Mais de 15 mil crianças e adolescentes, com idades entre 0 e 19 anos, foram mortos de forma violenta no Brasil nos últimos três anos. Em média, foram quase 14 mortes violentas por dia em todo o país. No mesmo período, 165 mil meninos e meninas foram vítimas de violência sexual. O que representa 150 vítimas de estupro por dia no mesmo período – números que evidenciam o cenário preocupante de violência contra crianças e adolescentes no País.
É o que revela a segunda edição do relatório Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil, lançado nesta terça-feira (13) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Ao todo, foram 15.101 mortes violentas intencionais e 164.199 estupros e estupros de vulnerável de vítimas entre 0 e 19 anos de 2021 a 2023.
A categoria mortes violentas intencionais foi criada pelo Fórum e soma os registros criminais de homicídio doloso, feminicídio, latrocínio, lesão seguida de morte e mortes decorrentes de intervenção policial. A maioria (91,6%) das vítimas de mortes violentas têm entre 15 e 19 anos. Além disso, grande parte são meninos (90%) e negros (82,9%). O relatório mostra que, em 2023, a taxa de mortalidade (a cada 100 mil habitantes) de meninos negros (18,2) foi 4,4 vezes maior do que de meninos brancos (4,1).
Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que os marcadores de gênero e raça interagem de diferentes formas em cada faixa etária. “Apesar de a violência acometer principalmente meninos negros, quando fazemos a distribuição por faixa etária vemos que o gênero começa a ser fator de risco a partir de nove anos, algo que se manifesta na transição para a adolescência. Em compensação, a raça é algo determinante desde sempre. A criança negra corre mais risco de ser vítima de homicídio desde que nasce em comparação com criança branca”, disse.
Em especial entre os que têm mais de 15 anos, as mortes violentas ocorrem num contexto de violência armada urbana: a maioria deles foi morta fora de casa, em via pública (62,3%), e por desconhecidos da vítima (81,5%). Apesar de a maioria das mortes violentas estar concentrada entre adolescentes, os dados revelam um crescimento dos assassinatos de crianças, especialmente na faixa etária de 0 a 4 anos, cujo crescimento foi de 20,4% entre 2021 e 2023 , e de 5 a 9 anos, com alta de 49%. Nessas idades, ao contrário dos adolescentes, a maioria das mortes ocorre em casa, e o autor é conhecido.
Outro destaque do relatório é o alto índice de mortes pela polícia. Cerca de 16% das mortes violentas de crianças e adolescentes foram por ação das forças estatais de segurança. Em 2023, 1 a cada 5 crianças e adolescentes morreram pela polícia. “Existe uma interação extremamente violenta entre as forças de segurança e os adolescentes, e os governos precisam endereçar políticas que tratem não só da formação das forças policiais, mas sobre mediação de conflito e diálogos sobre este tema”, ressaltou Samira.
Enquanto a taxa de homicídios caiu ao longo dos últimos três anos, a de estupro contra crianças e adolescentes têm crescido constantemente. Em 2021, foram registrados 46.863 casos de violência sexual. Em 2023, o índice saltou para 63.430. Crianças e adolescentes do sexo feminino são a ampla maioria (87,3%) das vítimas no Brasil. Em ambos os sexos, a maior parte das vítimas (48,3%) têm entre 10 e 14 anos.
A violência sexual cresceu, em especial, entre meninas e meninos com até 9 anos. Entre 2022 e 2023, houve um acréscimo de 26,6% nos registros de estupro contra criança de até 4 anos, e de 20,9% entre aquelas com 5 a 9 anos. Ana Carolina Fonseca, oficial de Proteção à Criança do Unicef no Brasil, afirma que os números são inaceitáveis, e é preciso um esforço conjunto para que isso seja compreendido. É necessário ainda, segundo ela, o controle do uso da força pela polícia, com a adoção, por exemplo, das câmeras corporais, que já se mostrou eficaz na redução da violência.
(Foto: Canva Fotos)