Brasil – O país das narrativas

(*) Rodrigo Vargas  –    Era uma vez um país onde a política deixou de ser um projeto coletivo e passou a ser uma guerra de torcidas organizadas, isso mesmo que você caro leitor pensou, aquelas que causam calafrios só de lembrar. Um lugar onde, ao invés de pontes, constroem-se trincheiras. Um país chamado Brasil, dividido ao meio – não por ideias, mas por ressentimentos. Aqui no Planalto Central, na capital de TODOS os brasileiros, o debate virou ruído, e a verdade, um produto com validade curta, moldada conforme o interesse de quem grita mais alto, ou usa melhor o microfone da tribuna ou suas redes sociais.

De um lado, os que estão no poder apontam o dedo para o passado recente. Falam de golpe, de ataques à democracia, de um inimigo que ainda respira – mesmo que fora do Planalto – e cuja sombra ainda parece dar as cartas do jogo. Do outro, os nostálgicos do governo anterior gritam que o país parou, que prometeram muito e entregaram pouco, que agora há silêncio onde antes havia movimento.

Ambos se atacam com uma fúria digna de campos de batalha, como se estivéssemos em guerra civil de narrativas (lembro daquele ditado: quem não chora não mama). Mas, entre uma postagem raivosa e uma manchete tendenciosa, há algo que desapareceu do centro da cena: O POVO. Aquele povo que acorda cedo, encara ônibus lotado, espera meses por um exame no SUS, paga imposto até no pão e que, não raro, sente que está sendo governado por quem nem se lembra de sua existência, mas temos uma luz no final do túnel: ano que vem temos eleições.

Um exemplo recente desse cenário que me refiro está nos descontos indevidos nos contracheques de milhares de aposentados do INSS. Gente que trabalhou a vida inteira, que já vive com orçamento contado, foi surpreendida com cobranças não autorizadas, muitas vezes ligadas a associações das quais nunca ouviram falar. E o que fizeram os lados dessa guerra política? Um culpou o outro. Disseram que o problema veio do governo anterior. O outro retrucou, acusando o atual de omissão. E entre um dedo apontado e outro, ninguém devolveu um centavo sequer aos aposentados lesados.

Até agora, nenhuma medida concreta, efetiva ou urgente foi tomada para corrigir a falha e indenizar quem foi prejudicado. A dor dos idosos virou mais um item na prateleira de narrativas da próxima eleição. Usam o sofrimento como munição, mas esquecem da dignidade de quem sofre.

O país virou um ringue, e os eleitores, torcedores cegos. Esqueceram que política se faz com proposta, com diálogo, com escuta. Agora, o que vale é o espetáculo. Cada ação, cada palavra, cada omissão é pensada não para resolver o presente, mas para ganhar “engajamento e likes”, e claro que para alimentar o enredo de 2026. É como se estivéssemos vivendo o trailer do próximo filme eleitoral, em looping, com o povo na plateia – mas sem direito a escolher o final.

Não há mais espaço para autocrítica, nem para o reconhecimento de que, sim, os dois lados erraram, e muito. Um pensou em se perpetuar no poder a qualquer custo, o outro parece paralisado por medo de desagradar aliados ou contrariar conveniências. Enquanto isso, crianças continuam sem escola decente, comunidades sem saneamento, trabalhadores sem perspectiva, e o país – esse país real, que sangra em silêncio – segue à margem do roteiro.

Talvez ainda haja tempo. Tempo de recuperar o bom senso, de reconectar a política com a vida real. De lembrar que o Brasil não é uma timeline de rede social nem um tabuleiro de xadrez ideológico. É um país imenso, diverso e urgente. E ele merece mais do que slogans, ataques e promessas recicladas.

O futuro não pode ser sequestrado pelas narrativas de quem só pensa em vencer a próxima eleição. Porque, enquanto brigam pelo poder, quem perde é o Brasil.

E você eleitor, precisa lembrar de tudo isso nas próximas eleições. Cabe a cada um de nós analisarmos todo esse teatro de narrativas e ver o que pode ser feito para melhorar as cenas dos próximos capítulos.  (Foto: Reprodução)

 

(*) Jornalista, Assessor de Comunicação, Palestrante e especialista em comunicação interpessoal. Autor do e-book “Comunicação para o Dia a Dia – Como se conectar melhor com os outros – e consigo mesmo”.

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