As mulheres representam a maior parte da população do Brasil, mas continuam a lidar com diversas formas de desigualdade e violência em várias esferas. Um relatório intitulado Revisão de Políticas Públicas para Equidade de Gênero e Direitos das Mulheres, publicado na última terça-feira (18) pelo Tribunal de Contas da União (TCU), revela que, apesar de progressos significativos nos últimos anos, as políticas voltadas para as mulheres enfrentaram retrocessos no país e demandam cuidado e revisão.
O documento compila uma variedade de ações, projetos, políticas governamentais, pesquisas e auditorias que foram implementados no Brasil nos últimos três décadas, com o objetivo de assegurar os direitos das mulheres.
De acordo com o TCU, embora existam leis e mecanismos legais que asseguram os direitos das mulheres e o país tenha progredido desde a promulgação da Constituição de 1988, houve, nos anos recentes, um retrocesso na implementação de políticas públicas voltadas para as mulheres. Isso foi especialmente evidente durante a pandemia de covid-19, que afetou de maneira mais intensa as mulheres, em particular as de etnia negra.
Vanessa Lopes de Lima, que atua como secretária de Controle Externo de Desenvolvimento Sustentável no TCU, comenta que os avanços têm retrocedido desde 2015, ano em que a Secretaria de Políticas para Mulheres deixou de ser um ministério e foi incorporada ao novo Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos. “Essa mudança causou uma diminuição na importância institucional, cortes no orçamento e estagnação de programas”, aponta.
Desde aquele momento, as iniciativas voltadas para as mulheres foram geralmente administradas por secretarias que também abrangiam outros propósitos, como o Ministério dos Direitos Humanos. Somente em 2023 foi estabelecido o Ministério das Mulheres, encarregado de tratar exclusivamente das políticas relacionadas às mulheres e das diretrizes para assegurar seus direitos.
A ausência de uma pasta dedicada, de acordo com Lima, prejudicou a implementação de políticas públicas.
“Isso prejudica a proteção dos direitos femininos, uma vez que diminui a habilidade do governo em desenvolver políticas eficazes e integradas que visem a igualdade de gênero e a defesa dos direitos das mulheres.”
Em 2022, conforme indicado no relatório, houve a menor distribuição de fundos federais para combater a violência de gênero, além de uma significativa diminuição na execução do orçamento e uma restrição nas iniciativas colocadas em prática.
De 2019 a 2022, foram disponibilizados R$ 68,22 milhões para combater a violência de gênero, entretanto, apenas R$ 35,34 milhões (51,8%) foram efetivamente utilizados. No ano de 2022, o montante autorizado foi de R$ 950 mil, porém, não houve nenhuma operação de liquidação desses recursos.
A carência de políticas públicas afeta a proteção dos direitos. No que diz respeito à violência, durante os primeiros seis meses de 2022, 699 mulheres foram assassinadas em casos de feminicídio, o que equivale a uma média de quatro mortes diárias. Esse total é 10,8% superior ao número de mortes contabilizadas no mesmo período de 2019.
O tribunal defende que, para assegurar os direitos das mulheres e promover a igualdade, é fundamental integrar a visão de gênero em diferentes áreas do governo. Isso permitirá a criação de políticas públicas abrangentes que atinjam praticamente todos os âmbitos de ação governamental.
“A eficácia dessas políticas está vinculada à criação de uma estrutura de governança que possibilite a coordenação e a colaboração entre diferentes setores, assim como a troca de dados e informações”, afirma o relatório.
O tribunal vê como fundamental implementar mecanismos formais para a coleta de dados que possibilitem ao setor público reconhecer os diversos subgrupos dentro da categoria de mulheres, levando em conta a interseccionalidade. Além disso, é necessário que exista uma estrutura adequada de governança, envolvendo diferentes órgãos e instituições do governo federal e em todas as esferas, para tratar de maneira eficaz as complexidades relacionadas às questões de gênero.
De acordo com o TCU, a instituição do Ministério das Mulheres indica uma maior relevância para as questões femininas dentro da estrutura do governo federal. (Foto: Reprodução)