Áudios, mensagens e diálogos evidenciam rivalidade interna e estratégia de desinformação: “Povo não tem tempo e nem vai entender isso”, disse Wassef ao orientar Bolsonaro a tratar caso como “fake News”
O ex-presidente Jair Bolsonaro combinou uma linha de defesa “generalizada” e sem muitos detalhes sobre o inquérito do esquema de roubo de joias com seu ex-advogado, Frederick Wassef. A informação foi divulgada nesta terça-feira (9) pela jornalista Daniela Lima, da Globonews. Em mensagem de áudio enviada no dia 7 de março, quatro dias depois de o caso ser revelado na imprensa, o ex-mandatário e seu defensor trocaram mensagens sobre o caso.
Nela Wassef orienta Bolsonaro a adotar uma linha de defesa “genérica”, tratando o escândalo como fake news, “sem adentrar em detalhes, em questões de leis e nem nada, porque o povo não tem tempo para ler e nem vai entender isso”.
Os áudios também revelam uma intensa disputa entre Wassef e o ex-secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, pela atenção e confiança de Bolsonaro. Wassef, em particular, insistia na simplicidade da mensagem para o público, visando conferir a Bolsonaro uma imagem de honestidade e desqualificar as acusações como perseguição política.
“Mensagem de massa, para o povo, para o público. Mensagem de subconsciente, que qual que é? ‘Presidente Bolsonaro é honesto! Agiu na lei! Declarou! Isso é armação e fake news. Nunca teve um caso de corrupção em quatro anos de governo!”, diz Wassef em um áudio de 8 de março de 2023, defendendo o conteúdo de uma nota que ele havia produzido.
“Esta mensagem simples, curta e grossa é que tem que ir para o público. Sem adentrar em detalhes, em questões de leis e nem nada porque o povo não tem tempo para ler e nem vai entender isso. A mensagem que é um tiro de canhão que nós falamos tudo que interessava, sem falar nada que compromete a defesa e estratégia de defesa, está aí. Todos estão elogiando! Todos!”, prosseguiu.
“Se a gente der muito detalhe se amarra, se prende àquilo. Então, tem que ser exatamente nesse molde, bem por cima, deixando claro a seguinte mensagem ao povo: Não há ilegalidade! Não fizemos nada errado! O presidente agiu dentro da lei! E estão distorcendo! Ponto! Só pra ter uma outra palavra pra tirar o que eles vão fazer de maldade contra você”, prosseguiu.
Bolsonaro pediu ajustes no texto e Wassef encaminhou a ele o texto com a manifestação que seria divulgada à imprensa. “Veja agora e aprove”, escreveu. Na sequência, o ex-presidente ligou para o advogado, mas o conteúdo da conversa não foi revelado. A nota que acabou sendo divulgada na ocasião diz que Bolsonaro “agiu dentro da lei” e “declarou oficialmente os bens de caráter personalíssimo”.
O comunicado ainda diz que ele é alvo de uma “verdadeira perseguição política” e que não existe “qualquer irregularidade em suas condutas”. Posteriormente, a nota foi compartilhada com Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e Fábio Wajngarten, atual assessor e advogado do ex-presidente, que reclamou da nota após uma fala pública do militar que gerou um “zoológico” na imprensa.
“A nota é necessária tal como está. Protege a imagem do presidente e não compromete ou engessa futuras falas, estratégias e depoimentos. Tem de ser em meu nome. O próprio presidente me disse isto. Não é para ser nota oficial dele. Por favor mantenha a minha nota como estava”, defendeu Wassef. Irritado com a postura de Cid, Wassef reclamou: “Ninguém pode falar porra nenhuma”.
Wassef, que foi excluído da banca formal de defesa de Bolsonaro, nega ter cometido qualquer ilegalidade. Para a PF, as trocas de mensagens mostram que eles “ocultaram, de forma deliberada, que Jair Bolsonaro tinha levado as joias ao exterior para alienação”. As mensagens foram tornadas públicas nesta segunda (8) após decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que retirou sigilo sobre o inquérito das joias. A investigação da Polícia Federal identificou que o próprio advogado se envolveu no esquema de desvio de joias.
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