A senhora de 83 anos esbanja talento transformando o que é descartável em obra de arte.
O talento de transformar em obra de arte o que todos veem como lixo. Esse é o mote do livro, recém-lançado, ‘Severina dos Bichos — A arte feita em alerta’, que traz o processo de criação e as esculturas da artista popular Severina Gonçalves, moradora há mais de 40 anos de Planaltina, no Distrito Federal. O livro tem autoria compartilhada com Ana Mago, filha da artesã, e Angélica Torres Lima, jornalista, escritora e poeta.
A obra conta a história da artesã, nascida em 1939 no interior do Rio Grande do Norte e que, desde os cinco anos de idade, produz esculturas de bichos e plantas a partir de produtos como fios de cobre, arame de televisão, flocos de pé de algodão, embalagens de frutas e de pão, fios de persiana, palha, garrafa – um pouco de tudo que, para muita gente, é lixo.
Além de apresentar a artista, o livro traz ilustrações do arquiteto Jordny Bor, neto de Severina, fotografias de Kazuo Okubo, além de textos que mostram como Severina representa a força da mulher idosa, da periferia de Brasília, que pode ter vez e voz. A publicação reflete uma temática bastante discutida atualmente: investir na sustentabilidade do planeta e valorizar sua fauna e flora por meio da reciclagem.
“Severina Gonçalves edificou uma obra que ora se define como objeto artesanal, ora como obra de arte, mas que possui significado mais amplo e significativo, inescapável de análise”, diz um trecho do livro. “Severina, que não frequentou escolas de artes, ao longo dos seus mais de setenta anos de ofício, criou milhares de peças que despertam curiosidade e admiração onde quer que sejam vistas. O valor inerente à estética e ao conceito que a sua obra adquire é indissociável nesse contexto, considerando-se em especial o seu aspecto autodidata e o transcendental. O material de sua arte, todo advindo de fios, cabos, embalagens e fibras descartados como lixo, torna-se irreconhecível depois de reciclado e transformado em figuras de animais e plantas”, continua a apresentação.
Todo o material para as esculturas de animais ricas em cores e detalhes é recolhido na rua, nos lixões, na esquina, e algumas pessoas até doam e ao invés de jogar fora. Dona Severina destrói e reconstrói em forma de obra de arte. “Gostar de animais já é muito bom. Agora gostar e fazer esses mesmos bichos criarem vida, vai além do simples querer bem. Severina recicla, reutiliza, recria e conecta o seu mundo com a realidade. Parece mágica, mas é só talento e dedicação misturados com criatividade. Daí só pode sair algo bom de verdade, todas as peças feitas com materiais reaproveitados”, relata Ana Mago em seu depoimento no livro. (Fotos: Divulgação/Kazuo Okubo)