O deputado federal Keniston Braga (MDB-PA), em entrevista ao Opinião em Pauta disse que está acompanhando com muita cuidado as ações de combate a atividade da mineração ilegal em áreas do Sudeste do Pará, citando a preocupação que as ações repressivas repercutiram na última semana, na região Sudeste do Pará, quando jazidas de minerais e garimpos foram desmobilizados por ações da Polícia Federal no combate à atividade clandestina.
“A região, originariamente, tem como matriz econômica principal, a mineração. Lamentavelmente, o último governo federal incentivou muito a ilegalidade. Se as operações estão ocorrendo, com certeza nós temos aspectos de indícios de ilegalidade. Se tivesse tudo legal, certamente a região não iria receber esses tipos de operações repressivas”, disse Keniston, que aparece à direita, na foto, entrevistado pelo jornalista João Salame.
Ao ser indagado sobre o que precisa ser feito para corrigir rumos e dar o mínimo de estabilidade e segurança ao pequeno e médio minerador, Keniston Braga disse que só há um caminho: necessidade mais clara de uma legislação da mineração, que é uma matriz econômica fundamental para o desenvolvimento do Estado e do país.
“A gente precisa tratar a legislação com mais seriedade, modernizá-la”, explica. “É preciso entender que praticamos mineração no Brasil desde quando éramos colônia de Portugal, e a legislação é praticamente a mesma. Por incrível pareça, tratamos esse comércio como os povos originários o tratavam nas negociações com os europeus, trocando nossas riquezas por espelhos. Ou seja, algo muito pequeno perto do que a gente pode oferecer”.
Como a legislação, ao longo do tempo, não se modernizou, Braga diz que hoje ela passa por um processo de depreciação.
“Há o minério, há a necessidade extrema de sua exploração, mas não há autorização. E esta falta de autorização está promovendo a exploração clandestina, que traz prejuízo pra todo mundo. Traz para o pequeno minerador, para o município, Estado e traz prejuízo para a União. Portanto, a gente precisa entrar em um processo de restruturação em vários aspectos”, garante.
Estudioso da questão minerária no país, principalmente por viver numa região amplamente dominada pela atividade mineradora, Keniston Braga aborda a questão da ineficiência da Agência Nacional de Mineração (ANM), por absoluta falta de estrutura funcional.
“A ANM é responsável por todo o processo minerário do país. Ela quem tem a responsabilidade pela fiscalização dos garimpos clandestinos; quem tem a responsabilidade de fiscalização das barragens em nosso país, e quem tem a reponsabilidade da liberação das licenças de operação. E o que acontece? A AMN não tem a menor estrutura para fazer tudo isso. Tem lá um software com mais de 20 anos de atividade, totalmente defasado; temos lá um quadro de cinco funcionários para fiscalizar e distribuir a Cfem (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) por todo o país. De vez em quando isso trava, levando prejuízo para o município, atrasando pagamento”, revela.
O deputado federal faz uma revelação impressionante:
“Lá na Agência Nacional de Mineração tem R$ 14 bilhões represados para serem analisados , e isso é humanamente impossível por causa da ausência de profissionais”.
Keniston conta que os casos de barragens, como exemplo, somente depois das tragédias de Mariano e Brumadinho, o governo federal atentou para a necessidade de promover concurso público visando fazer novas contratações para engenheiros de barragens. E esse concurso púbico foi realizado depois de muita pressão do Ministério Público, sem, no entanto, cumprir seu objetivo das contratações necessárias e urgentes.
Segundo Braga, a ANM tem uma defasagem em seu quadro pessoal de quase 60% de servidores, exigindo a realização de concurso público para recompor o seu quadro, equiparação salarial dos servidores e reestruturação tecnológica.
Outra questão fundamental para a tentativa de modernizar a legislação da atividade refere-se a aprovação do novo Código Minerário.
Membro da Comissão de Mineração da Câmara Federal, Keniston Braga diz que nenhum tipo de legalização da atividade minerária terá êxito se a legislação não for modernizada.
“Não há no pais autorização para segunda lavra, em algumas denominações chamada de “lavra garimpeira”, que nada mais é do que o direito de concessão para o médio e pequeno minerador. Existe um projeto de lei tramitando no Senado, de autoria do senador Zequinha Marinho (PL-PA), que propõe autorização para a segunda lavra. Caso aprovado, isso vai dar condições para que a gente possa dar acesso à exploração minerária de maneira legal e segura para o pequeno e médio minerador”, diz.
“Qualquer tipo de exploração em terras indígenas deve ser discutido com os povos originários”
Keniston Braga, que reside no município minerador de Parauapebas, a 700 km de Belém, aborda a questão dos episódios ocorridos na terra indígena dos Yanomamis, exemplificando que fatos idênticos da atividade garimpeira ali detectada, são registrados diariamente em outras áreas da Amazônia.
“Hoje, em virtude dos últimos acontecimentos que repercutiram internacionalmente, garimpos em terras Yanomamis, estes mesmos fatos ocorrem todos os dias nos quatro cantos da Amazônia. Achar que a retirada dos garimpeiros das terras dos Yanomamis – como já foi feito -, finaliza esse processo de ocupação ilegal, não finaliza. Esse processo é potencializado todos os dias, e a potencialização dele vem através da ausência de uma legislação segura. Qualquer tipo de exploração em terras indígenas deve ser discutido com os povos originários e os resultados financeiros e ecológicos devem ser revestidos a favor deles”.
Keniston cobra seriedade nas atitudes.
“A gente precisa, de verdade, mapear toda essa área brasileira que pode ser de fato explorada. Vou citar um exemplo de uma discussão que, tenho certeza, muito em breve vai se acirrar. A gente fala de novas matrizes energéticas do país, a busca de uma energia limpa, e a energia fotovoltaica vai se destacando. Pois bem, os elementos que compõe a fabricação das placas usadas para energia solar têm mais de 40% de sua composição em minerais, minerais que estão no subsolo da Amazônia. Dito isto, a gente precisa encontrar uma maneira segura, do ponto de vista ecológico, para fazer essa exploração, porque esses minerais vão contribuir justamente na busca da preservação ambiental, a partir da utilização dessa energia limpa representada pela energia fotovoltaica”, sentencia.
Na visão do parlamentar do MDB, conciliar a preservação do meio ambiente com a necessidade de exploração monitorada das riquezas do subsolo brasileiro é uma necessidade de afirmação, em busca do seu verdadeiro desenvolvimento econômico e humano.
“Imagine se fizermos um plano, a partir da legislação, de recomposição das áreas nas quais a supressão seja imediatamente seguida de sua recomposição, o impacto será pequeno. Mas como as pessoas têm medo ou preconceito de abordar esse tema (não é de hoje, volto a repetir, desde a época do Brasil colônia, viemos sofrendo), achando que é possível extinguir a pequena mineração, só fazendo operações da Polícia Federal, ICMbio, Ibama – isso é uma coisa paliativa, temporária. O Estado brasileiro não tem condições de manter, nas dimensões continentais de nossa geografia, uma fiscalização frequente. É melhor que a gente estruture a ANM, dê a ela condições de exercer seu papel fundamental na fiscalização e na regularização dessa exploração, e estabeleça uma força tarefa para se buscar o aperfeiçoamento da legislação, tornando-a mais clara”, reforça.
“Como a situação não está legalizada, há uma pressa muito grande de extrair o minério, então essa supressão é feita sem nenhum tipo de planejamento”
Em relação às grandes empresas mineradoras que requisitam as licenças de lavras, sem explorá-las posteriormente, usando as licenças como reserva de mercado, não permitindo que essas áreas fiquem aptas à exploração pelos médios e pequenos mineradores – o deputado federal respondeu a uma pergunta do portal sobre o monopólio da mineradora Vale.
“Essa monopolização do subsolo brasileiro pelas grandes empresas acontece exatamente por esses fatores que expliquei anteriormente: a falta de clareza da legislação que temos hoje. Quando se fala da segunda lavra que não é permitida, vou dar um exemplo, falando da Vale, citada em sua pergunta. A Vale vai lá, faz a requisição dos direitos de exploração de uma determinada área no subsolo de determinado município, para explorar minério de ferro, por exemplo. Numa camada mais profunda, está lá o minério de ferro. Mas numa camada mais superficial, existe o manganês, que não tem autorização pra ela (Vale) nem para ninguém, porque a área já foi requerida para minério de ferro. E o manganês, numa jazida menor, a Vale não tem interesse nessa exploração, que não é autorizada. A partir daí, essa exploração ocorre de maneira clandestina, trazendo problemas ambientais gigantescos. Como a situação não está legalizada, há uma pressa muito grande de extrair o minério, então essa supressão é feita sem nenhum tipo de planejamento”, destaca o parlamentar
Keniston enfatiza que não existe um projeto minerário no país aprovado, 100% legalizado em menos de dez anos.
“É muito, esse tempo percorrido para aprovação de uma lei, diante de um dinamismo que o mercado nos apresenta, para o próprio estilo de vida da humanidade. Portanto, precisamos entender, com clareza, que essa modernização da legislação vai nos trazer a solução para a maioria desses problemas, inclusive, da monopolização pelas grandes empresas do subsolo brasileiro. E nós não queremos nos distanciar da importância que as grandes empresas têm, mas precisamos, também entender que em determinados lugares, em algumas áreas para determinados minerários, o pequeno e médio mineradores são fundamentais para que essas explorações aconteçam gerando divisas importantes”, finaliza.