80 anos da vitória sobre o nazi-fascismo
Por Henrique Acker – Confesso que não tive ânimo para assistir ao desfile dos 80 anos da vitória sobre o nazi-fascismo, organizado por Putin, em Moscou. Em outras épocas, mesmo sob a era do estalinismo, o desfile ainda guardava um sentido cívico e educativo.
Os atuais desfiles parecem caricatos, promovidos por um regime que nada tem a ver com os que lutaram e os 26 milhões de soviéticos que morreram na II Grande Guerra.
Hoje, em plena invasão da Ucrânia, é impossível não enxergar a contradição escancarada entre as comemorações e o regime de Putin e seus apaniguados. Não que haja santos do lado do regime ucraniano ou entre os que o apoiam.
Apesar disso, não se pode condenar a presença de 29 chefes de Estado no desfile de Moscou. Até porque, não houve qualquer convite para outra grande comemoração dos 80 anos do fim da II Guerra, nem nos EUA nem na Europa.
Infelizmente, a interpretação da história pela cúpula soviética ajudou a esvaziar o conteúdo de classe e o significado da grande vitória do Exército Vermelho sobre o nazi-fascismo.

A chamada “grande guerra patriótica” reduziu o fenômeno à resistência heroica do povo soviético à invasão alemã. Nada mais atual nos nossos dias do que lembrar o que representou o regime nazi e suas consequências para a humanidade.
Não há uma voz para reafirmar que o nazi-fascismo foi e é a expressão radicalizada do sistema de exploração em que ainda vivemos. Os campos de concentração, além de espaços de extermínio, eram também reservas de mão-de-obra escrava para as grandes empresas alemãs, que sustentaram a máquina de guerra do III Reich.
A União Europeia, que deveria promover grande comemoração nesta data, quando mínimo para defender a democracia e lembrar o massacre de seus cidadãos, limitou-se a cerimônias protocolares. Parece que vivemos no melhor dos mundos e que lembrar os 80 anos da derrota do nazi-fascismo não faz a menor diferença.
Talvez não faça mesmo para as elites europeias de hoje, tanto quanto não fez para seus antepassados de colarinho branco o martírio dos povos europeus sob o domínio dos nazis na II Guerra.

As elites europeias de então escolheram dois caminhos: a adesão e a covardia. Os que não aderiram ou colaboraram com os nazis, tomaram o rumo das Américas, abandonando seus países à própria sorte.
No entanto, ao contrário do que se pensa, houve grande resistência em todo o velho continente. Não demorou para que o setor mais consciente da população criasse grupos de guerrilha, combatendo os exércitos alemães pela retaguarda. Maquis, partizans, partigiani – a maioria gente de esquerda – trataram de organizar a resistência popular.
Quando os exércitos aliados entraram em Paris, a capital francesa já estava livre. O mesmo ocorreu em diversas outras cidades europeias. E isso não foi obra do divino espírito santo e nem por um recuo programado dos nazis.
Cabe lembrar que a implantação do Plano Marshall – com vultosos recursos dos EUA para recuperação da Europa no pós-guerra – foi marcada por intensa negociação e disputa das elites europeias com as guerrilhas ainda armadas na França, Itália e em outros países.

A resistência depôs as armas, mas os trabalhadores conquistaram muito mais do que o voto universal (incluindo o voto feminino). É daquele período o início da afirmação de toda a legislação trabalhista, previdenciária, da educação e da saúde pública, que consolidaram o chamado “Estado de Bem-Estar Social” na Europa Ocidental.
De lá para cá, muita coisa mudou. Inclusive a tolerância dos estadistas europeus com a reorganização da extrema-direita em todo o continente. Muitas das conquistas do pós-guerra foram derrubadas.
Portanto, mais do que criticar Putin e os chefes de estado que compareceram a Moscou, cabia à União Europeia demonstrar às novas gerações o perigo que representou e representa até hoje o nazi-fascismo. Mais um erro imperdoável do grupo conservador que dirige a UE.
Na imagem destacada, soldado ergue a bandeira soviética no alto do Reichstag, em Berlim. (Fotos: Reprodução)
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Nota: O Brasil enviou 25.000 soldados a Itália, para combater as tropas do Eixo, por força de uma mobilização popular em todo o país. Nossos pracinhas permaneceram em combates de julho de 1944 a fevereiro de 1945. Desses, 467 soldados brasileiros morreram em combates, de um total de 1.867 brasileiros tenham perdido suas vidas em combates em terra, no mar e no ar.
Por Henrique Acker (correspondente internacional)