Apesar de os dados serem expressivos, especialistas apontam que o cenário possa ainda ser ainda mais preocupante, por causa da subnotificação. São Paulo concentra a maior quantidade de casos computados no ano passado, seguido de Minas Gerais e Rio de Janeiro
O Brasil registrou, em média, 196 casos de violência contra crianças e adolescentes por dia em 2023. Além disso, 80% dessas agressões ocorreram dentro das casas das vítimas. O alerta é da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e foi divulgado nesta quinta-feira (24). São Paulo lidera em todas as faixas etárias, com 17.278 registros de violência física, o que corresponde a uma média de quase 50 casos por dia no estado mais populoso do país. Minas Gerais aparece em segundo lugar, contabilizando 8.598 casos em 2023. Em seguida está o Rio de Janeiro, que registrou 7.634 casos.
Na região Sul, o Paraná teve 7.266 casos e o Rio Grande do Sul somou 2.331 registros. No Paraná, chama a atenção a elevada proporção de casos em menores de 10 anos, representando 88% das notificações. Em Santa Catarina, 71% dos episódios de violência física também envolvem crianças com menos de 10 anos. A pesquisa, divulgada nesta quinta-feira (24), foi feita com base nos dados do Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde.
O Estatuto da Criança e do Adolescente obriga os médicos a notificarem o Conselho Tutelar quanto há suspeitas ou confirmações de violência contra essa parcela da população. Os dados mostram que os adolescentes entre 15 e 19 anos foram os mais afetados, totalizando 35.851 notificações ao longo de 2023. “Os adolescentes se expõem, têm personalidade e autodeterminação, podem ousar socialmente e se colocar em situações de risco. Os adolescentes têm um pensamento mágico, acham que nada vai acontecer com eles”, diz o presidente da SBP, Clóvis Francisco Constantino. “A violência dos menores é mais silenciosa e intradoméstica”.
Cerca de 80% das agressões contra crianças de até 14 anos acontecem dentro de suas próprias casas, segundo os dados do Sinan. Em 2023, foram registradas mais de 3 mil notificações envolvendo bebês com menos de 1 ano. Na faixa de 5 a 9 anos, foram 8.370 ocorrências. A SBP aponta que a maioria dos casos está concentrada no Sudeste. Isso é atribuído pela Sociedade de Pediatria à densidade populacional mais elevada e à existência de sistemas mais eficientes de diagnóstico e denúncia nessa região. Em todos os estados, no entanto, os adolescentes entre 15 e 19 anos são os que acumulam mais notificações. Os dados reunidos pela SBP serão usados para atualizar protocolos que auxiliam os profissionais da saúde nessas situações.
“O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) deixa bem claro que, na suspeita de agressão, a notificação é compulsória. É um dever legal do médico que está na linha de frente”, explica Constantino. “Ao atualizarmos os protocolos, queremos deixar aos pediatras o recado de que esse fenômeno segue acontecendo.”
“Fraturas inexplicáveis ou específicas de traumas intencionais, relatos contraditórios ou lesões incompatíveis com o trauma descritos, ou com o desenvolvimento psicomotor da criança, são indicativos claros de que precisa de maior avaliação, diagnóstico, tratamento e proteção imediata”, completa Luci Pfeiffer, presidente do Departamento Científico de Prevenção e Enfrentamento das Causas Externas na Infância e Adolescência da SBP.
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