Neonazistas avançam na Alemanha

Extrema-direita vence no estado da Turíngia e deve crescer na eleição geral de 2025

 

Henrique Acker (correspondente internacional)  – Pela primeira vez desde o final da II Guerra, um partido de extrema-direita, herdeiro da doutrina nazi-fascista, venceu uma eleição na Alemanha. No estado da Turíngia, o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) obteve 32,8% dos votos válidos na eleição de 2 de setembro, superando o partido tradicional da direita (CDU), com 23,6%, e de centro (SPD), com 6,1%. Apesar de não vencer no estado da Saxônia, o AfD chegou em segundo, com 30,6%, atrás apenas da CDU (31,9%).

Mesmo sem maioria para governar na Turíngia e ainda que venha a ser excluído de uma coligação de governo na Saxônia, o AfD tem bancadas de deputados suficientes para barrar qualquer projeto de maior fôlego nos parlamentos desses dois estados, incluindo alterações nas constituições estaduais e a indicação de juízes.

Turíngia e Saxônia concentram 7% do eleitorado do país e pertencem à antiga República Democrática da Alemanha (RDA), governada pelo então Partido Comunista até a queda do Muro de Berlim e a reunificação do país.

Em 22 de setembro haverá eleição em Brandemburgo, um estado ao redor de Berlim. Ali também o AfD tem boa chance de vitória. De acordo com a mais recente pesquisa do instituto INSA, o partido aparece na frente, como 24% da preferência do eleitorado. O SPD teria 20% e o CDU 19%.

 

 

 

Insatisfação com governo Scholz

Criado em 2013, o AfD nasceu defendendo a luta contra a imigração e a União Europeia. Foi aí que lideranças, grupos e ativistas neonazis, até então isolados e ultra minoritários na sociedade alemã, perceberam que haveria espaços para levar suas propostas e sua ideologia para a vida política.

Em 2017, o AfD obteve 12,6% na eleição nacional e desde então mantém sua presença no parlamento alemão (Bundestag). O crescimento das ideias de extrema-direita coincidem com a grande onda de imigração para a Alemanha, em 2015, em sua maioria de refugiados da Síria e do Afeganistão, recebidos pelo governo da então chanceler Angela Merkel.

Durante a pandemia, o AfD foi contra as medidas de isolamento e o uso de máscara e boa parte de seus parlamentares negou a vacina, o que polarizou a sociedade alemã. Em 2022, com a invasão russa da Ucrânia, o país foi atingido pelo desabastecimento de gás, até então fornecido pela Rússia.

A guerra no Leste da Europa desencadeou o aumento dos preços dos produtos derivados da crise energética, gerando  inflação. A crise econômica fez crescer a insatisfação popular com o governo do primeiro-ministro Olaf Scholz (SPD), que lidera uma coalizão frágil de partidos com grandes divergências internas.

 

Ex-stasi e neonazis no mesmo partido

Segundo um levantamento da Correctiv, dezenas de ex-membros da polícia secreta da antiga RDA, a Stasi, atuam nas fileiras do AfD. Além disso, há um número desconhecido de ex-funcionários não oficiais (IM) e outros informantes da Stasi no partido. O mesmo acontece com o ex-soldados do regimento de guardas Felix Dzierzynski, braço da segurança do antigo regime.

A assimilação de gente ligada ao governo da RDA é atribuída por alguns estudiosos ao fato de muitos nutrirem rancor pelo Ocidente e serem simpáticos ao governo russo. Coincidência ou não, essa é a política do AfD, que se opõe ao apoio do atual governo alemão à Ucrânia.

Björn Höcke, líder da AfD na Turíngia que foi eleito deputado, é considerado um “extremista” pelos serviços de informação alemães. Ele já foi multado duas vezes este ano por usar um antigo slogan nazi: “Alles für Deutschland” (tudo pela Alemanha), o que é proibido por lei. Alegou não saber que se tratava de um slogan da organização paramilitar Sturmabteilung (SA), do regime nazista.

 

Neonazis querem deportar imigrantes

De acordo com relatório de 2022 do Órgão Federal de Proteção Constitucional (Bun­des­amt für Ver­fas­sungs­schutz), o AfD admitiu cerca de 10.000 pessoas classificadas como extremistas, o que corresponde a mais de um terço dos seus filiados.

A agência de jornalismo investigativo Correctiv revelou, em janeiro deste ano, a realização de um encontro de extremistas de direita em 25 de  novembro de 2023, num casarão em Potsdam (capital do estado de Brandemburgo). Na ocasião, foi discutido um plano de deportação de residentes na Alemanha com raízes migrantes, inclusive tendo cidadania alemã, batizado de “Remigração”.

Entre os presentes, estiveram membros do AfD, conhecidos neonazis e alguns filiados do CDU, além de integrantes da associação conservadora chamada WerteUnion. Após a revelação do encontro, foram realizadas diversas manifestações de rua de repúdio nas principais cidades alemãs.

 

Manifestantes saem às ruas de Frankfurt para protestar contra a AfD, de extrema direita (Foto: REUTERS/Kai Pfaffenbach)

 

Futuro incerto na Europa

Após a divulgação dos resultados da eleição na Tiríngia e Saxônia, ocorreram manifestações de protesto, promovidas pela esquerda, sobretudo nas cidades de Dresden e leipzig.

Daqui a um ano, em 28 de setembro de 2025, a Alemanha terá eleições para a renovação do Bundestag. Assim como em toda a Europa e em outros continentes, a extrema-direita avança. Somados os votos dos deputados dos três blocos de partidos de extrema-direita, eles já formam a segunda maior força no Parlamento Europeu.

A julgar pelo abandono das políticas que defendam os direitos dos mais pobres e os benefícios concedidos pelo Estado, por parte dos partidos tradicionais, e pela ausência de um novo projeto sociedade dos partidos de esquerda, a possibilidade da extrema-direita chegar ao governo em diversos países da Europa deve ser encarada como uma possibilidade real. (Foto: Reprodução)

Por Henrique Acker (correspondente internacional)

 

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Fontes:

Expresso

Fundação Perseu Abramo

Observador

BBC Brasil 

Expresso

Electomanía

Correctiv

Correctiv

Opinião em Pauta

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