Cá entre nós – Henrique Acker
1.Fraude & tentativa de golpe
A Venezuela tornou-se o centro das atenções internacionais desde 28 de julho. A mídia empresarial de todo o Mundo passou a transmitir direto de Caracas, onde divulgava, com convicção, uma vitória da oposição de direita, baseando-se em pesquisas eleitorais.
Detentora das maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela é – como o Brasil e o México – estratégica para a América Latina. Quanto mais independentes forem os governos desses três países, mais incomodarão aos interesses estadunidenses.
Como em toda “nuestra América”, a burguesia venezuelana dominou política e economicamente o país por séculos, como sócia minoritária do capital multinacional. A ascensão de Hugo Chavez, no final dos anos 90, quebrou a cadeia de vassalagem da elite criolla.
2.Base social e eleitoral do bolivarianismo
Desde que o bolivarianismo chegou ao governo, em 1998 com Hugo Chavez, nunca obteve menos de 50% de votos nas eleições presidenciais, disputadas em turno único. É simples entender: dos 31 milhões de venezuelanos cerca de 15 milhões precisam e se apóiam nas missiones.
Antes, nos governos da AD/Copei e da SD – partidos que se revezavam no poder – toda essa gente pobre era completamente desprezada. Os índices sociais da grande massa do povo venezuelano eram infinitamente piores que os atuais, mesmo com o cerco econômico promovido pelos EUA e a União Européia.
Isso não quer dizer que a Venezuela seja um paraíso e o governo bolivariano um altar de santos e anjos. Há muitas acusações de desmandos, mau uso de verba pública, privilégios a grupos ligados ao poder. Assuntos que cabem ao povo venezuelano debater e resolver.
3.Fraude sem provas
O argumento de “fraude eleitoral descarada”, difundido pela mídia empresarial mundo afora, não se sustenta. Além do boletim da urna eletrônica, o voto de cada eleitor é impresso em mais de 50% das máquinas e vai para uma urna física, como forma de comprovante da eleição. Cópias dos boletins das urnas são impressas e entregues aos fiscais dos partidos nas próprias seções eleitorais.
Por isso, as provas que Corina Machado diz ter (73% das atas eleitorais), são as mesmas que Henrique Capriles prometeu apresentar em 2013 – e nunca o fez – quando foi derrotado. Por que os representantes da oposição no CNE não contestaram o resultado eleitoral no dia em que foi anunciado?
Até agora, apesar das denúncias, o que há é um site que só pode ser acessado com o cartão de identificação do eleitor, que pode confirmar se seu voto consta ou não do boletim de urna de sua seção eleitoral. O que se pretende é levantar suspeitas e desmoralizar o Conselho Nacional Eleitoral, cujo sistema foi atacado por hackers.
4.Conteúdo da página da oposição
O governo convocou nova coletiva de imprensa na noite de 2 de agosto para apresentar uma análise sobre as supostas atas divulgadas na página que a oposição de direita disponibilizou na internet. Jorge Rodriguez, Presidente da Assembléia Nacional da Venezuela apresentou detalhes do material.
De acordo com Rodriguez, nas 9.468 atas (30% do total) que a oposição de direita disponibilizou, seu candidato (Edumundo Gonzalez) vence exatamente com o mesmo percentual de votos em todas: 63% a 30% nos 23 estados e nos 335 municípios venezuelanos. O que parece impossível.
Milhares delas estão sem a assinatura do operador da máquina eleitoral, o que é obrigatório. As atas também devem conter as assinaturas dos fiscais das mesas, mas em milhares dessas atas apresentadas pela oposição não há essas assinaturas. Em algumas atas diferentes os membros da mesa, o operador da máquina e os fiscais têm as mesmas assinaturas.
5.EUA reconhecem vitória da oposição com base em “evidência esmagadora”
Financiador da oposição de direita e interessado direto no resultado da eleição, o governo dos EUA decidiu reconhecer Edmundo Gonzalez (*) como legítimo governante da Venezuela. Embora não tenha apresentado nada que o comprove, Antony Blinken, chefe da diplomacia dos EUA, afirmou que há “evidência esmagadora” de que o candidato da oposição foi vencedor.
Pressionado pelos governos do México, Brasil e Colômbia, Nicolás Maduro tratou de encaminhar um pedido de investigação do processo e se prontificou a entregar as cópias dos boletins de urnas (atas) que estão em posse do PSUV, seu partido.
O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) convocou todos os candidatos a comparecerem para serem ouvidos sobre o processo na tarde de 2 de agosto. O único que não compareceu foi justamente Edmundo Gonzalez. O Fiscal Geral da República também recolheu uma série de vídeos e denúncias de ataques a centros de votação, que ocorreram no dia da eleição.
6.Brasil, México e Colômbia pedem transparência
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela finalmente apresentou novo boletim da apuração. De acordo com o comunicado, com 96,87% das urnas apuradas, Maduro recebeu 6,4 milhões de votos (51,97%) contra 5,3 milhões de votos (43,18%) de Edmundo González.
O presidente do CNE, Elvis Amoroso, reforçou a denúncia de um ataque hacker contra o sistema eleitoral venezuelano feita no dia das eleições, o que teria atrasado a transmissão dos dados e a contabilização final dos resultados.
Em comunicado conjunto, os governos do México, Brasil e Colômbia pedem às autoridades eleitorais da Venezuela “para que avancem de forma expedita e divulguem publicamente os dados desagregados por mesa de votação”.
“As controvérsias sobre o processo eleitoral devem ser dirimidas pela via institucional. O princípio fundamental da soberania popular deve ser respeitado mediante a verificação imparcial dos resultados”, destaca o comunicado.
Coluna de Henrique Acker (3 de agosto de 2024)