As principais modificações feitas no Senado não foram acatadas pelos deputados. Projeto vai para a sanção presidencial
O texto substitutivo ao Projeto de Lei (PL) nº 5230/2023, de autoria do deputado Mendonça Filho (União-MG), foi aprovado na noite desta terça-feira (9) na Câmara dos Deputados. A votação foi realizada por orientação de bancada, formando 126 votos contrários ao texto e 302 favoráveis. O texto segue agora para sanção presidencial.
O PL recebeu alterações no Senado, como a inclusão do espanhol como disciplina obrigatória, a definição de 70% da grade curricular para disciplinas obrigatórias e 30% para o itinerário formativo e também previa 2.400 horas de formação comum para todas as modalidades de ensino.
A versão mais recente do relatório do deputado Mendonça Filho (União-PE) foi apresentada na manhã desta terça. O parecer trouxe mudanças em relação ao que foi aprovado no Senado em junho. Entre as principais modificações feitas pelo deputado estão a derrubada do espanhol como disciplina obrigatória e menos critérios para o ensino à distância.
Um dos principais temas de discordância em relação ao projeto dizia respeito a carga horária da formação geral básica, que diz respeito às disciplinas obrigatórias a todos. O governo não queria uma redução excessiva dessa carga horária, que era desejada por uma ala do Congresso. No Senado a relatora foi a Professora Dorinha Seabra (União-TO), que mesmo sendo do mesmo partido de Mendonça, não chegou em acordo com ele sobre pontos do projeto.
A senadora havia inicialmente definido 2,2 mil horas para a formação geral básica, mas depois, a pedido do governo, recuou e retomou as 2,4 mil horas estabelecidas pela Câmara. “Houve, de fato, um amplo debate, uma discussão sobre o número de horas da chamada formação geral básica. Chegamos a um entendimento com o Ministério da Educação. O ensino médio regular terá 2400 horas de formação geral básica. E, para aqueles estudantes que optarem pelo itinerário técnico-profissional, serão ofertadas 2100 horas, o que viabiliza a educação técnica para os jovens, principalmente, aqueles que estão nos grandes centros urbanos”, disse Mendonça Filho.
Confira como ficou o projeto que regulamenta o Novo Ensino Médio:
- Formação geral básica. O desejo do governo, de 2,4 mil horas, para a formação geral básica prevaleceu. Nesta modalidade, o currículo de disciplinas clássicas será entre 1,8 mil e 2,1 horas, dependendo do tamanho da carga horária do ensino profissionalizante.
- Na formação geral básica estão: as disciplinas tradicionais, Português e Matemática (as únicas obrigatórias), Geografia, História, Química, Física, Biologia, etc. É a parte do currículo que todos da escola precisam fazer igual.
- Nos itinerários formativos: em tese, são para aprofundar o conhecimento nas áreas de interesse dos alunos.
- Currículo: a formação geral básica segue a matriz da Base Nacional Comum Curricular, mas cada estado decide quantas horas quer dar de cada disciplina. Já os itinerários não possuem uma matriz de referência — cada rede oferece da forma que achar melhor.
- Espanhol. Governo defendia a disciplina como obrigatória, mas será de oferta optativa.
- A Câmara retirou, do trecho que fala sobre o ensino à distância o ponto que citava “casos de excepcionalidade emergencial temporária reconhecida pelas autoridades competentes”, deixando a regulamentação mais genérica, abrindo a possibilidade de ensino a distância ser aplicado “excepcionalmente”, mas sem especificar e deixando a definição a cargo do “regulamento elaborado com a participação dos sistemas estaduais e distrital de ensino”.
- O relatório aprovado pelos deputados retira a restrição para a regra de profissionais com notório saber. O Senado havia definido que isso só se daria em “caráter excepcional e mediante justificativa do sistema de ensino, conforme regulamentação do Conselho Nacional de Educação e respectivo Conselho Estadual de Educação”, mas o trecho foi retirado.
- Estabelece uma transição para o Enem, que só terá as novas regras aplicadas a partir de 2027.
Reações contrárias
Logo após a votação, ainda durante a sessão, manifestaram posição contrária ao texto do relator: PSOL, PCdoB e PDT. “O relatório foi melhorado enormemente no Senado. Nossa expectativa era que houvesse humildade do relator, o que daria uma tranquilidade pedagógica à educação brasileira. Nós queremos 2,4 mil horas, queremos institutos federais gozando de sua autonomia legal, queremos que os itinerários formativos tenham travas para não banalizar os itinerários, queremos que a educação seja respeitada”, manifestou a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) criticou a condução da sessão e pediu questão de ordem para apontar falhas regimentais. “Orientação de bancada não é liberalidade do presidente da Casa para conceder aos partidos. O partido tem o direito de fazer orientação. E esta não era uma votação qualquer. Era uma votação dos pontos que foram modificados pelo Senado Federal e foram revogados pelo relator. Se dá a falsa sensação para a população brasileira de que existe consenso nesses pontos, quando não existe consenso algum”, apontou.
O presidente da Câmara, Arthur Lira, rejeitou a questão de ordem, pois, segundo ele, essa reclamação caberia apenas em votações nominais. “A matéria foi vencida, já foi aprovada, finalizada. Vai à sanção”, declarou. Ele orientou que as discordâncias devem ser apresentadas como recurso à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Nas redes sociais, Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, apontou que, com o resultado, organizações da sociedade civil devem seguir cobrando a revogação do Novo Ensino Médio. Ele defendia a aprovação com as modificações feitas pelos senadores.
“Os parlamentares e partidos que defendem a educação foram atropelados, mas não tiveram força para se impor diante do golpe. A educação foi tratada como matéria de segunda importância; e o Senado da República foi desrespeitado”, avaliou o professor.
(Foto: Suamy Beydoun/Agif/Estadão Conteúdo)